O governo federal vai depender da boa vontade do Congresso para aprovar boa parte das medidas anunciadas nesta segunda-feira (14) para cobrir o rombo no Orçamento. Ao todo, R$ 52,7 bilhões previstos no ajuste precisam do aval dos parlamentares. Congressistas, porém, dão sinal de que o governo terá dificuldades (veja abaixo).
A quantia representa 82% dos R$ 64 bilhões previsto no pacote.
A medida mais polêmica é a volta da CPMF, com a qual a equipe econômica pretende garantir R$ 32 bilhões. O projeto de criar uma alíquota de 0,2% sobre movimentações financeiras depende da aprovação de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), que, por alterar a Constituição, precisa de um apoio maior do que propostas comuns que tramitam no Parlamento. É necessário o aval de 49 dos 81 senadores e de 308 dos 513 deputados.
Outra proposta que depende de uma PEC é a extinção do “abono de permanência”, que garantiria mais R$ 1,2 bilhão ao ajuste.
A gratificação que está na mira do governo é dada a servidores públicos que têm idade suficiente para se aposentar, mas que preferem continuar na ativa. O fim do benefício deve contar com forte lobby contrário em Brasília. A medida atingiria cerca de 100 mil pessoas.
Medidas Provisórias
Outra medida que também terá caminho difícil é referente ao Imposto sobre Ganho de Capital. Pela proposta anunciada, uma medida provisória deve estabelecer alíquotas de 15% a 30% sobre ganhos com venda de terrenos e imóveis, por exemplo, dependendo do valor do lucro.
O governo pretende arrecadar R$ 1,8 bilhão com a nova taxa.
Acontece que as medidas provisórias têm duração limitada a 60 dias, prorrogáveis por igual período. Para se tornarem permanente, precisam ser aprovadas pela maioria simples da Câmara e do Senado.
Outra medida que deve ser estabelecida por medida provisória e dependerá da ratificação do Congresso é a redução da desoneração previdenciária sobre o chamado Sistema S (Sesc, Sesi, Senai). A medida garantiria R$ 6 bilhões a mais no Orçamento, segundo o governo.
Parte da chamada “redução dos gastos tributáveis” — ou seja, do fim de desonerações hoje em vigor — também deve ser feita por medida provisória, que corre o risco de ser derrubada no Congresso. São mais R$ 3,9 bilhões que dependem dos parlamentares.
Projetos de lei
Outras duas medidas — o adiamento do reajuste de funcionários públicos, que geraria uma economia de R$ 7 bilhões, e o fim dos supersalários, que garantiria mais R$ 800 milhõe nas contas — serão apresentadas em forma de projetos de lei.
Para entrar em vigor, precisarão também da aprovação da maioria simples do Congresso.
Resistência
Logo após o anúncio da equipe econômica, porém, congressistas deram sinais de que o governo federal terá dificuldades para conseguir a aprovação do pacote.
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara e opositor da presidente Dilma Rousseff, afirmou que o governo faz ajuste "na conta dos outros", já que, segundo suas contas, 75% dos cortes dependem de outros entes, que não o governo federal. Cunha também disse acreditar que a aprovação da CPMF pelo Congresso é "improvável".
— Acho temeroso condicionar o sucesso de um ajuste fiscal a uma receita que sabemos ser de difícil equacionamento.
Já o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que todas as medidas apresentadas pelo Executivo serão melhoradas na tramitação do Legislativo.
Crítico do aumento de impostos, contudo, o peemedebista se esquivou de responder se a nova CPMF será aprovada pelo Congresso.
"O que vai acontecer na tramitação da CPMF não cabe ao presidente do Congresso Nacional dizer. O Congresso Nacional tende a melhorar todas as medidas que por aqui tramitam", disse ele que, mais cedo, recebeu uma ligação da presidente Dilma Rousseff na qual detalhou as medidas a serem anunciadas nesta tarde.
Presidente do PSDB, Aécio Neves (MG) atacou, em nota, a criação de impostos.
— Não é aceitável o aumento do imposto de renda sobre ganho de capital, não para melhorar o sistema tributário, mas apenas para crescer a receita, e a volta da CPMF, o famoso imposto sobre transações financeiras que a sociedade já tinha se mostrado contra na sua última tentativa de renovação, em 2007.
Líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO) manifestou-se, também por meio de nota, no mesmo sentido.
— Vamos fazer uma ampla frente ao lado da população contra aumento de carga tributária. O Congresso não vai referendar esse ataque.
Mesmo dentro da base aliada, as medidas anunciadas não são unanimidade.
O senador petista Lindbergh Farias (RJ) afirmou que a reação do PT e em movimentos sociais será "muito maior" do que na primeira etapa do ajuste fiscal.
— Vai criar um problema na nossa base social, naqueles que estão lutando contra o golpe que está em curso.
Para Lindbergh, o governo volta a errar ao usar a mesma fórmula que, segundo ele, não deu certo no ajuste feito neste ano. Ele criticou o fato de que o novo pacote corta investimentos e até R$ 3,8 bilhões em despesas com a saúde.
O senador disse que a decisão do governo de adiar em seis meses o reajuste do funcionalismo público é uma "declaração de guerra" aos servidores.