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Sutiãs foram queimados no passado e a mulher criada para ser dona de casa começou a alçar desejos pouco ligados às tarefas domésticas. Ela foi trabalhar fora do lar, estudou, conquistou posições, se tornou líder, se casou e quis cuidar da família. Tudo ao mesmo tempo. Oito de março é o dia para admirar a versatilidade e outros atributos delas. O R7 mostra a seguir algumas belas histórias femininas, de mulheres que decidiram conquistar seu espaço e cavar seu nome na sociedade
Do R7
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Casada, mãe de dois filhos, trabalha fora. Nádia, assim como milhares de brasileiras, está familiarizada com a dupla jornada. No caso dela, as tarefas da família dividem espaço com uma missão complicada: administrar a maior cidade da América Latina. Nádia Campeão, 54 anos, é a vice-prefeita de São Paulo.
Nascida em Rio Claro (SP), Nádia foi se tornar engenheira agrônoma pela Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz), em Piracicaba. Foi lá que ela transformou a militância em atuação política. Só não imaginava que fosse ter uma posição tão importante no cenário paulistano. O sonho, na adolescência, era entrar na Marinha. O problema é que a corporação não aceitava mulheres.
Por Amanda Mont'Alvão Veloso, do R7Cesar Ogata
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Nas horas livres, Nádia prefere fazer passeios com a família, como ir a parques e ver um filme, além de ler bastante. Comprar roupas não é uma atividade que a anime: se pudesse, trocaria na hora por uma sessão de cinema.
— Não tenho muita paciência para comprar roupas: chego na loja, olho, experimento e já compro. Sou bem econômica nesse tipo de programação.
Para Nádia, o que as mulheres têm de especial é o fato de que elas sabem que precisam aproveitar as oportunidades, uma vez que há poucas chances. Essa percepção acaba definindo o olhar que a vice-prefeita tem das paulistanas.
— A paulistana é uma mulher muito séria e centrada na possibilidade de ter autonomia e independência. Ela acorda cedo, dorme tarde, trabalha, estuda e abre mão de muitas coisas (AMV)Júlio Bittencourt
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Perguntar a idade não é ofensa para a advogada Berenice Maria Giannella. Segundo ela, são "50 anos muito vividos e comemorados". A trajetória de Berenice tem uma dose "cavalar" de adrenalina: há quase nove anos, ela lida com rebeliões, fuga de adolescentes, destruição de patrimônio e outros distúrbios na Fundação Casa, da qual é presidente. Para dar leveza ao dia a dia pesado, a presidente aposta nos 42 km das maratonas, percorridas há 17 anos, cinema e literatura. Ela, que viu vários dos filmes premiados com o Oscar neste ano, lamenta que Trapaça não tenha levado a estatueta.
O cotidiano duro não impede que Berenice invista na vaidade, o que inclui cuidados com as roupas. Saias são bem presentes em seu guarda-roupa, mas a advogada pende mais para um estilo esportivo do que executivo.
No trabalho, ela diz acreditas que a intuição feminina a ajude na hora de tomar decisões, especialmente em razão da urgência com que os problemas devem ser enfrentados. Para Berenice, o desafio na Fundação Casa é lidar com o aumento do envolvimento dos jovens com as drogas e, consequentemente, com o tráfico e os crimes.
— Eu gostaria muito de um dia poder fazer um trabalho que foque mais na prevenção da criminalidade do que só cuidar dos adolescentes infratores. Tem momentos aqui em que nos sentimos enxugando gelo (AMV)Arquivo Pessoal
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Aos 40 anos, Maria Gabriela Prado Manssur tem ao menos três cartões de visita: é mãe de três filhos; maratonista assídua e promotora de Justiça de São Paulo à frente de casos como o sequestro, tortura e assassinato do casal de namorados Liana Friedenbach, 16 anos, e Felipe Caffé, 19 anos, por Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha.
Na opinião de Maria Gabriela, características femininas como determinação, sensibilidade, atenção e emoção contribuem para desempenhar melhor o trabalho. Não à toa, Maria Gabriela tem forte militância pelo fim da violência contra as mulheres. Paralelamente, ela não deixa de investir na vida saudável, na leitura e em atividades tipicamente femininas que quebram a rotina de casos pesados e violentos.
— Eu gosto de peruagem, roupa de oncinha, usar batom. Adoro moda (AMV)Arquivo Pessoal Maria Gabriela Manssur
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A desembargadora Kenarik Boujikian Felippe, nascida na Síria e naturalizada brasileira, está na magistratura desde 1989 e vivenciou o desequilíbrio expressivo entre o ingresso de mulheres e de homens na área. Em São Paulo, as mulheres só foram aceitas como juízas em 1981 — a proporção era de três mulheres para 66 homens. O descompasso nas oportunidades, porém, não impediu que Kenarik crescesse na carreira, acumulando experiência em casos emblemáticos como o julgamento do médico Roger Abdelmassih, condenado a 278 anos de prisão por dezenas de estupros.
Fora dos tribunais, Kenarik, de 54 anos, gosta de ler, de cinema, teatro e de viajar. Os hobbies são conciliados com a militância pelas mulheres encarceradas, por meio da AJD (Associação dos Juízes para a Democracia) e com a família — Kenarik é casada e tem três filhos. Como fazer parte de tantas rotinas?
— Só mesmo fazendo milagre. (AMV)
Conselho Nacional de Justiça
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A tenente do Corpo de Bombeiros de São Paulo Ana Lucia Razuk, 33 anos, passa o dia correndo contra o relógio, em situações dramáticas como incêndios, resgates de vítimas presas em ferragens e outras ocorrências de vida ou morte. São poucas as mulheres na profissão, mas isso a estimula ainda mais.
— Quando fui prestar o concurso, ainda para policial militar, havia pouquíssimas vagas para mulheres, o que aumentava muito a concorrência. Foi aí que fiz questão de realizar a prova.
O desafio se transformou em reconhecimento, inclusive pessoal. Ana Lucia já ouviu de pessoas relatos emocionantes sobre um resgate, como a vez em que tirou um gato que estava em uma árvore e soube que o bichinho era o que mantinha a dona viva. Quando não está ocupada com as atividades de super-heroína, Ana Lucia se desdobra em tia-coruja — todos os passeios são feitos com a sobrinha — e em líder do coral infantil da igreja. Para dar tempo de tudo, ela acorda cedo e dorme tarde. Mas confirma que o esforço compensa.
— A gente não tem ideia de o quanto pode mudar a vida das pessoas (AMV)Alberto Takaoka
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A paulistana Helena Bonciani Nader tem 66 anos de muitas conquistas, mas diz acreditar que pode alcançar ainda mais. A bióloga é presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progressos da Ciência) desde 2011, e acumula, orgulhosamente, centenas de mestres e doutores que passaram por sua orientação. Ela reconhece que, para a geração dela, a mulher ainda era criada para ser mãe e dona de casa. Mas os pais de Helena nunca colocaram barreiras para o que ela queria fazer e isso foi fundamental para que a bióloga chegasse ao cargo atual. Essa noção de igualdade de gêneros se estendeu por toda a trajetória profissional.
— Não pensava na comparação entre eu e um homem. Simplesmente ia investindo na minha carreira.
Viúva e mãe, Helena concilia a dupla jornada e sempre contou com o apoio do marido. Para ela, tudo se resolveu ao ter escolhido a companhia certa para o desafio (AMV)Divulgação/SBPC
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A juíza Marixa Fabiane Lopes Rodrigues, de 43 anos, nasceu em Teófilo Otoni, região do Vale do Mucuri, e ficou conhecida nacionalmente como a responsável por sentenciar (entre 2012 e 2013) o goleiro Bruno Fernandes e outros cinco envolvidos na morte de Eliza Samudio. Mãe de três filhos com idades entre dois e sete anos, a magistrada afirma que o grande desafio como mulher é "não perder a autoridade como juíza e nem a ternura como mãe". Marixa afirmou ao R7 que o autocontrole foi fundamental durante os três anos que durou o processo, considerado um dos mais emblemáticos do País.
— Foram muitos advogados tentando tumultuar e, como mãe tive que conciliar o controle do tempo, entre a vida pessoal e o trabalhoRenata Caldeira/TJMG
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Mineira de Belo Horizonte, a coronel da Polícia Militar, Cláudia Romualdo, de 46 anos, é a primeira mulher a assumir o Comando do Policiamento da Capital. Nas mãos dela, está a segurança dos cerca de 2,5 milhões de moradores de Belo Horizonte. Já são 28 anos de trajetória na corporação, onde ela garante nunca ter sofrido com diferenças de tratamento entre homens e mulheres. Atenta aos preconceitos sofridos pela classe em outras profissões, no entanto, a policial deseja igualdade de salários para todas.
—O que eu tenho conhecimento é que isso ainda não é realidade nas outras profissões [salários iguais]. Penso que uma conquista que seria muito importante é essa paridade de remuneração para a mulher que realiza a mesma função que um homem
Agência Minas
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A vice-prefeita de Salvador, Célia Sacramento (PV), nasceu em São Paulo, mas passou grande parte da vida em Salvador. Bacharel em Ciências Contábeis e Direito, ela diz que ainda é comum as mulheres sofrerem com o preconceito no mercado de trabalho, como ganhar um valor de salário inferior ao dos homens. Na área política, o número de mulheres também é considerado pequeno, equivale a pouco mais de 12%.
Apesar das grandes conquistas, a vice-prefeita diz que é necessário um olhar da sociedade com mais Justiça para a condições das mulheres em todas as áreas. Na sociedade atual, as mulheres ainda sofrem com as agressões físicas, que em muitos casos, acontecem dentro da própria casa. Célia Sacramento afirma que é "necessário desconstruir o machismo exacerbado da sociedade" e é preciso fazer uma reeducação nas famílias e dentro das escolas.
— Vamos à luta, precisamos estar atentas não só para nós, mas também para todas as mulheres da sociedade, precisamos de solidariedade e união, para mudar essa históriaReprodução/Facebook
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A desembargadora Luislinda Valois se mostrou lutadora ainda criança. Filha de motorneiro e uma lavadeira, aos nove anos, foi vítima de discriminação por parte do próprio professor, que desprezou a simplicidade de seu material escolar. Ele afirmou que se ela não podia comprar o material adequado, não devia estar estudando e sim cozinhando feijoada para brancos. Naquele momento, ela decidiu que estudaria e voltaria para prender o professor racista.
Luislinda se tornou a primeira negra a exercer o cargo de magistrado e a primeira a sentenciar tendo como base a Lei do Racismo no Brasil. Apesar de tudo isso, a desembargadora ainda sente o preconceito por ser mulher e negra.
— Nos Tribunais, os cargos de comando são ocupados por homens brancos e de famílias tradicionais. Eu sou negra, pobre, periférica, nordestina, e divorciada, foi muito difícil pra mim.
Luislinda Valois diz que para a mulher conquistar um espaço com visibilidade na sociedade precisa ousar e lutar pelos seus direitos e deixa seu recado.
— Procure crescer em todas as áreas, evolua, cuide dos seus filhos com todo vigorReprodução/Facebook
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Ninguém melhor para falar da rotina de uma mulher em cargos públicos do que Ivelise Longhi. Ela ingressou no serviço público por meio de concurso, ocupou cargos importantes como a presidência da Codeplan, foi administradora de Brasília, assumiu várias secretarias de Estado, foi vice-governadora e hoje é presidente do Metrô-DF.
Ivelise se considera vaidosa como toda mulher e está sempre atenta a aparência. Frequenta academia três vezes por semana, vai ao salão e acredita que ser bonita é ter boa saúde. Aos 58 anos, três filhos e netos, ela acha que a mulher sempre quer abraçar o mundo com as mãos.
— Eu momento algum eu tive que mudar meu jeito de ser para ser aceita nos cargos que ocupei. A liderança não está vinculada ao gênero. Tem que ter conhecimento e firmeza nas decisões. Mas já senti preconceito por ser mulher e fiz de conta que não estava vendo. Para estas situações minha resposta é o trabalhoDivulgação
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A tenente-coronel Cynthiane Santos, de 40 anos, desmente todos os estereótipos imaginados para uma mulher que comanda quase 400 homens, no Batalhão de Choque da PM do Distrito Federal. Com a responsabilidade do quartel, conciliar vida profissional e pessoal não é tarefa simples, mas a policial se desdobra para resolver. Com um filho adolescente de 17 anos em casa, ela conta que já parou uma reunião com várias pessoas ao redor para ensinar o garoto cozinhar porque ela não tinha como estar em casa
Reprodução/Rede Record