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Uso de tecnologia e integração no transporte é tendência para 2022

Mudanças estruturais estão em curso para que usuário tenha informações em tempo real e diminua o tempo de deslocamento

Cidades|Joyce Ribeiro, do R7

Cidades costumam priorizar desocamentos por carro em vez do transporte público
Cidades costumam priorizar desocamentos por carro em vez do transporte público Cidades costumam priorizar desocamentos por carro em vez do transporte público

O fim das bilheterias para compra de passagens em estações do Metrô e da CPTM, atualmente em curso em São Paulo, é um dos sintomas de uma transformação que ocorre nos grandes centros urbanos. O que se discute é a intermodalidade ou a integração inteligente entre os sistemas de transporte, com destaque para os modos ativos, como caminhada e bicicletas, em detrimento dos carros. A tecnologia promete ser uma aliada nessas transformações, permitindo até novas formas de pagamento.

"São mudanças estruturais que demandam tempo, mas que vão trazer mais segurança e confiabilidade. Mas elas têm que ser feitas com cautela para verificar como isso está impactando a sociedade, porque mexe no dia-a-dia dos usuários. O caminho é esse: passa por dados abertos, tecnologia e passagens e bilhetes integrados até para desbloquear bicicletas", afirma Luisa Peixoto, gerente de Políticas Públicas da Quicko.

A Quicko é uma plataforma gratuita de integração de mobilidade e compartilha informações em tempo real aos usuários do transporte público, assim como o Waze. A ferramenta ajuda o passageiro a decidir o melhor caminho, integrando ônibus, trem e metrô com bicicletas, caminhadas e veículos de aplicativo.

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Em relação ao fim das bilheterias no Metrô e na CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) até o fim do ano, anunciado pelo governo de São Paulo, a ideia é a migração para o digital. A compra da passagem deverá ser realizada por WhatsApp, aplicativo TOP, máquinas ATM e em mais de 2 mil pontos comerciais distribuídos pela capital e região metropolitana de São Paulo.

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De acordo com o então secretário de Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy, a medida garante economia de R$ 100 milhões ao ano aos cofres públicos. No entanto, a iniciativa gerou protestos, principalmente por causa das demissões de funcionários.

Para Luisa Peixoto, essa é a tendência: integração dos serviços em uma plataforma, com recarga, bilhete eletrônico e desbloqueio de catraca e também de bicicletas.

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"São 74% dos brasileiros conectados à internet e mais de 90% por smartphones. As bilheterias geram um alto custo ao governo. Temos que avançar na qualificação do transporte e isso passa pelo digital. Mas falta facilidade de acesso. Parte da população não tem cartão e nem dinheiro, o que limita a pessoa de usar o que seria a preferência dela. É preciso criar infraestrutura que promova integração social", enfatiza.

Em grandes cidades, é comum ver bicicletários ou estações de bicicletas compartilhadas em estações de metrô ou terminais de ônibus. No entanto, eles ainda são em número insuficiente. Combinar diferentes modais pode ser a solução para as pessoas otimizarem os deslocamentos. 

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Luisa defende que haja diversas empresas fazendo a comercialização das passagens, em diferentes plataformas, o que geraria concorrência para atender as diversas demandas. Mas reconhece que em algumas cidades faltam até recursos técnicos para implementação de inovações. 

Longos deslocamentos

Acesso a informações de rotas, previsibilidade e uso de modais diferentes ajudam a reduzir o tempo de deslocamento nas cidades, o que impacta na qualidade de vida das pessoas ao permitir que elas decidam o que fazer com o tempo livre, como lazer. 

Alexandre Feitosa é motorista, mora em Cidade Tiradentes, na zona leste de São Paulo, e trabalha no Itaim, zona sul da capital. Ele optou por ficar com o turno noturno para não perder ainda mais tempo no deslocamento diário.

"Saio 22h de casa para ir para a avenida Nove de Julho. Entro no trabalho meia-noite. Chego lá por volta de 23h50. Demoro, em média, 1h45 no trajeto. A lotação que pego demora demais para passar no ponto, depois demora para chegar no metrô Itaquera. Depois é mais rápido, trem e metrô são os melhores transportes públicos", diz.

Pessoas se penduram nas portas para conseguir embarcar nos coletivos
Pessoas se penduram nas portas para conseguir embarcar nos coletivos Pessoas se penduram nas portas para conseguir embarcar nos coletivos

No trajeto, ele usa micro-ônibus, a linha 3-Vermelha do Metrô, desce no Anhangabaú, no centro, e embarca novamente em um ônibus. Se fizesse o mesmo percurso de carro, à noite, seria bem mais rápido, porém mais caro, o que torna inviável. Se fosse de dia, também não compensaria, segundo ele, por causa do trânsito e da longa distância a ser percorrida.

"De metrô, trem e ônibus gasta menos, só que pega lotado. De dia é insuportável pegar condução onde moro. Já passa nos pontos tudo lotado. Com a pandemia, pior ainda. Deveria ter mais ônibus, lotação, principalmente nas periferias", defende Alexandre Feitosa. 

Segundo pesquisa da Rede Nossa São Paulo, de setembro, quase 65% dos entrevistados gastam até 2 horas nos deslocamentos pela capital diariamente. As regiões norte e sul concentram os maiores tempos: em média 1h30. A parcela cresce entre a classes D e E (76%). Foram ouvidas 800 pessoas.

Gráfico mostra quanto tempo as pessoas demoram no deslocamento (%)
Gráfico mostra quanto tempo as pessoas demoram no deslocamento (%) Gráfico mostra quanto tempo as pessoas demoram no deslocamento (%)

O levantamento constatou, no entanto, que houve queda no tempo médio diário de deslocamento. Em 2021, foram 13 minutos a menos do que o registrado em 2020 (1h37). Ainda assim, a média é de 1h24.

"Com sistemas em tempo real, a pessoa pode se deslocar até o ponto de ônibus na hora exata e passar mais tempo com a família. Como a integração é mais cara entre ônibus e metrô/trem do que ônibus/ônibus, as pessoas escolhem o mais barato. Elas caminham uns 7 minutos até o ponto, de bicicleta seria mais rápido. Com integração, reduz-se o congestionamento, o tempo dentro dos ônibus, é um efeito cascata", ressalta a especialista Luisa Peixoto.

A ideia é defendida também por Ciro Biderman, professor do Centro de Estudos de Política e Economia do Setor Público da FGV e ex-chefe de gabinete da SPTrans (São Paulo Transporte). 

"Falta integração física, operacional e tarifária. Ninguém pensou ou se preocupou com isso. Estamos muitos passos atrás. Tem integração do ônibus, metrô e trem, mas não com a EMTU ou aplicativos de transporte. Seria uma solução para a periferia, para que saíssem de locais remotos e acessassem o hub de transporte. Daria para programar o percurso inteiro e há potencial até para a prefeitura economizar", explica.

Grandes centros precisam ampliar a malha cicloviária e corredores de ônibus
Grandes centros precisam ampliar a malha cicloviária e corredores de ônibus Grandes centros precisam ampliar a malha cicloviária e corredores de ônibus

Pandemia

A pandemia de Covid-19 fez com que muitas pessoas e empresas aderissem ao "home office", com isso caiu a demanda por transporte público. No entanto, com a retomada das atividades, os passageiros voltaram a usar ônibus, metrô e trens, muitos ainda com receio.

Além dos protocolos sanitários, a frequência dos ônibus e trens deveria ser maior para evitar aglomeração de passageiros nas composições e plataformas.

Kaio da Costa Bertonzin é operador de forno em uma empresa do Jaguaré, zona oeste de São Paulo. A jornada dele começa às 7h, mas ainda às 4h30 ele precisa sair de casa em Ribeirão Pires, no ABC Paulista.

"Ando uns 10 minutos até a estação, pego o trem até a Luz, faço baldeação na Linha 4-Amarela do Metrô e desço em Pinheiros, pego outro trem até a estação Jaguaré e são mais uns 10, 15 minutos de caminhada até a empresa. De bicicleta, não vale a pena porque é muita integração e não tem lugar para deixar", conta.

Para chegar ao trabalho, o trajeto dura 1h40, já para voltar para casa, são 2h15. Ele faz uma rota diferente para poder sentar em parte do percurso. Outra opção seria usar o ônibus intermunicipal, que é mais caro e passa por mais cidades, aumentando o tempo de deslocamento para 3 horas.

"Já morei mais perto. Hoje moro longe, mas não pago aluguel. Acho que o intervalo entre os trens deveria ser igual ao do metrô. A linha de Metrô do ABC não saiu do papel e facilitaria muito. Já aconteceu do trem parar com a chuva por causa de alagamento e eu ficar das 17h30 às 21h porque não tem o que fazer", lembra.

Passageiros aguardam na plataforma da Estação da Luz e trens já passam lotados
Passageiros aguardam na plataforma da Estação da Luz e trens já passam lotados Passageiros aguardam na plataforma da Estação da Luz e trens já passam lotados

A pandemia trouxe também uma nova realidade: a expansão dos serviços por delivery. Mas as cidades, em geral, não estão preparadas com pontos de carga e descarga, áreas de descanso para entregadores e até mesmo pontos de entrega e retirada de mercadorias.

"Precisamos preparar as cidades para que o carro não seja o principal modal, com o uso do meio-fio não para vagas de estacionamento, mas para embarque e desembarque de passageiros de carros de aplicativo, para motos e bicicletas. Isso é relevante num contexto sem o carro como protagonista", detalha Luisa Peixoto.

Mas para isso é preciso mudar a lógica de investimentos do poder público. Segundo estudo publicado pela Liga Insights Mobilidade, em nove anos o Brasil terá 225 milhões de habitantes e 90% da população estará concentrada em áreas urbanas. Estima-se que até 2030, o mercado global de mobilidade deva crescer até 75% e atingir valor de US$ 26,6 trilhões.

Para Ciro Biderman, as cidades tendem a priorizar o transporte individual. "Nada muda porque continuamos com a mesma governança. Os contratos de concessão não melhoraram em nada. Não se investe em corredores de ônibus porque gasta-se mais com os subsídios às empresas".

Já Luisa Peixoto é mais otimista. "Já podemos comemorar um pouco porque temos diretrizes. Mas grande parte do orçamento ainda vai para ampliar vias, obras e viadutos. Em São Paulo, teve aumento de corredores de ônibus e da malha cicloviária, mas não é só infraestrutura. Tem que tirar esse estigma de que transporte público não é de qualidade porque quem está no carro não está tendo uma experiência melhor: fica parado no trânsito e gasta muito", conclui.

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