Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Publicidade

Após 13 anos em guerra, eleições no Afeganistão colocam nova democracia à prova 

Terrorismo, fraude e falta de tradição estão entre as questões que podem minar votação

Internacional|Do R7

Abudullah Abdullah, candidato afegão à presidência, acena para uma multidão durante comício em 2 de abril, último dia de campanha política antes das eleições
Abudullah Abdullah, candidato afegão à presidência, acena para uma multidão durante comício em 2 de abril, último dia de campanha política antes das eleições Abudullah Abdullah, candidato afegão à presidência, acena para uma multidão durante comício em 2 de abril, último dia de campanha política antes das eleições

Milhares de afegãos enfrentaram filas de horas e ameaças de militantes para se cadastrar nas eleições deste sábado (5), no Afeganistão. Desde que o atual presidente, Hamid Karzai, foi impedido de concorrer, o voto marca a primeira transferência de poder democrática na história do país. No entanto, as eleições também são uma lembrança sombria de um país que enfrenta décadas de conflito e que, até hoje, ainda não conseguiu realizar as promessas de esperança, desenvolvimento e mudanças, tão repetidas em eleições passadas.

Segundo o site de notícias The Huffington Post, o Afeganistão se prepara para eleger novos líderes nacionais e provinciais, assim como um novo presidente. Oito candidatos competem pelo cargo mais alto. Dentre estes, os três favoritos são Ashraf Ghani, ex-funcionário do Banco Mundial, e Abdullah Abdullah e Zalmay Rassoul, ex-ministros das Relações Exteriores do país.

Jornalista é morta durante cobertura das eleições no Afeganistão

Uma série de questões, porém, levantam dúvidas sobre a credibilidade do resultado das urnas, como campanhas extremistas contra as eleições e, sobretudo, uma longa história no país de fraude de votos.

Publicidade

A seguir, seis coisas que podemos esperar das eleições neste sábado.

1. Guerra do Taleban nas eleições

Publicidade

Em 21 de março, homens armados invadiram o luxuoso hotel Serena, em Cabul, e mataram nove pessoas. Dias depois, militantes atacaram funcionários de uma organização cristã na capital. Em 2 de abril, um homem-bomba explodiu no Ministério do Interior afegão, matando seis policiais.

Estes são apenas alguns dos incontáveis incidentes de uma campanha militante brutal que semeia o caos antes das eleições de sábado. O Taleban prometeu fazer todo o possível para perturbar o processo democrático, e suas ações são de uma violência brutal.

Publicidade

Os radicais avisaram que funcionários e locais de votação serão alvos potenciais em 5 de abril. Até agora, atacaram instituições que estão trabalhando para as eleições, assim como estrangeiros em todo o país.

Os recentes atentados desencorajaram trabalhadores internacionais a acompanhar os votos, e levantaram dúvidas acerca da capacidade das forças afegãs de garantir a segurança dos eleitores nos dias de votação. Uma semana antes das eleições, autoridades eleitorais declararam que 3.145 das 6 mil zonas eleitorais não são seguras.

2. Uma longa história de fraude eleitoral

As últimas eleições presidenciais no Afeganistão, em 2009, foram manchadas por compras de voto e fraude. Mais de um milhão de cédulas de voto foram desqualificadas na contagem, a maioria em favor de Karzai, o então presidente.

Autoridades prometeram que o processo eleitoral deste ano não apresentará as mesmas falhas, pois serão adotadas várias medidas para aumentar os votos válidos e melhorar a contagem. No entanto, segundo Martine Van Bijlert, co-diretora da Afghanistan Analyst Network, essas diferenças não favorecem eleições mais limpas: “A participação política é alta, as instituições são parciais e partidárias, e as campanhas aliciaram funcionários eleitorais. A insegurança facilita uma grande interferência em boa parte do país, e a excessiva distribuição de cédulas de voto (21 milhões foram distribuídas para cerca de 13 milhões de votantes válidos) encorajam fraudes”.

Mesmo os afegãos não demonstram muita confiança na possibilidade de eleições verdadeiramente honestas. Segundo a Gallup Poll, empresa de pesquisa de opinião, 70% dos afegãos não confiam no sistema eleitoral do país.

3. 200% de participação?

Os afegãos apareceram em massa nos últimos dias para fazer novos títulos de eleitor. De acordo com a Comissão Eleitoral do país, pelo menos 3,8 milhões de novos eleitores se cadastraram desde o ano passado, e acredita-se que agora já teriam ultrapassado os 4 milhões. E ainda que essa enorme participação tenha gerado muito otimismo, é também uma fonte de preocupação. Afinal, determinar quantas pessoas votaram é crucial para avaliar a veracidade da eleições no Afeganistão.

Matthieu Aikins explica pela Rede de Análise Afegã (Afghanistan Analyst Network, em tradução livre) que, enquanto o país não tem um censo recente ou um registro dos votantes preciso, o número de eleitores válido é estimado entre 10 e 12 milhões. Porém, as autoridades emitiram 21 milhões de cédulas de voto válidas. Isso significa que, todas estas cédulas forem utilizadas, o país terá uma participação espantosa de 200% nas eleições.

4. Para onde foram os monitores?

Cerca de 6 mil observadores afegãos e 1.500 monitores internacionais foram escalados para acompanhar as eleições no Afeganistão. No entanto, depois de ataques aos funcionários de organizações ligadas às eleições e as aparentemente acidentais mortes de estrangeiros, diversas organizações internacionais se sentiram forçadas a fechar seus escritórios e vários observadores internacionais deixaram o país.

Como explicou ao New York Times Ahmad Nader Nadery, o presidente da Fundação pelas Eleições Livres e Justas do Afeganistão, a falta de um expressivo contingente de observadores internacionais pode desacreditar as eleições. Além disso, dúvidas acerca da validade dos resultados colocam em risco a ajuda estrangeira ao país no futuro, pois vários doadores consideram um voto livre o requisito mínimo necessário para o apoio internacional.

5. Uma eleição crucial para mulheres

As eleições de 2014 no Afeganistão são, em vários sentidos, um momento importante para as mulheres no país. Três mulheres estão concorrendo ao posto de vice-presidente, e pelo menos 300 competem por cargos provinciais – uma quantidade nunca antes vista no país. Todas as três na disputa pela vice-presidência prometeram proteger os direitos das mulheres.

Entretanto, ativistas apontam que o país ainda tem um longo caminho a percorrer. As candidatas foram desproporcionalmente alvo de militantes nos meses antes das eleições. Habiba Sarabi, governadora de Bamiyan e candidata à vice-presidência pela chapa de Zalmai Rassoul, contou ao The Nation do Paquistão que já recebeu incontáveis ameaças de morte.

E, ainda que o direito ao voto tenha sido concedido às mulheres afegãs pela primeira vez depois da queda do Taleban, na prática muitas foram impedidas de votar em distritos conservadores. Ativistas pelos direitos das mulheres apontam que poucas mulheres comparecerão às eleições nas zonas rurais do sul do país, onde há uma forte segregação de gênero. Além disso, militantes ameaçaram atacar mulheres que participarem das votações.

Mesmo que as forças de segurança do país tenham recrutado diversas funcionárias para garantir a integridade das votantes em zonas eleitorais de regiões com forte segregação, autoridades calculam que cerca de 12 mil novas contratações seriam necessárias para manter a segurança das mulheres em 5 de abril.

6. Um passado sangrento

Assim como apontado pelo New York Times, entre os oito candidatos à presidência e seus companheiros de chapa, há muitos militares.

Vejamos, por exemplo, o General Abdul Rashid Dostum, companheiro de um dos favoritos à presidência, Ashraf Ghani. Dostum foi uma peça-chave durante a Guerra Civil no Afeganistão e voltou da Turquia ao país em 2009, para apoiar a administração de Karzai. O militar e seus homens foram acusados de ter matado em 2001 2 mil militantes suspeitos de pertencer ao Taleban e à Al-Qaeda, quando o comandante alugou seus serviços para as forças americanas no Afeganistão. Dostum pediu desculpas publicamente antes das eleições para “todos os que sofreram dos dois lados das guerras”, e pediu ao outros candidatos que fizessem o mesmo.

E há também o candidato presidencial Abdul Rasul Sayyaf, um acadêmico islâmico e militar que já foi considerado patrono de Osama bin Laden, Khalid Sheikh Mohammed e Ramzi Yousef.

Os militares controlam vastas quantias de dinheiro, podem garantir blocos de voto decisivos e frequentemente têm segurança privada à sua disposição, o que faz com que eles sejam companheiros de chapa atrativos. E, como argumenta Ron Moreau no Daily Beast, “o seu retorno à importância é um sinal perturbador de como as coisas mudaram pouco nos últimos 12 anos, desde que os Estados Unidos invadiram o Afeganistão, expulsaram o Taleban e tentaram (sem sucesso) implantar um sistema político democrático e multi-partidário em uma sociedade tribal e tradicional".

Escondidos do Taleban: os 'tesouros' de lambe-lambes afegãos

Últimas

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.