Projeto integra jovens refugiados através do esporte, na Bélgica
Laura Zornoza/ EFE - 13.9.2019Em um campo de futebol nos arredores de Bruxelas, um grupo de adolescentes joga bola sob o olhar atento do treinador. Alguns dos jogadores estão na Bélgica há poucas semanas e não falam francês nem holandês, mas todos entendem a "linguagem universal" do esporte.
Os jovens não são alheios à expectativa que o treino desperta: atrás de um dos gols estão o secretário-geral da Uefa e a ministra de Imigração da Bélgica, entre outras autoridades, que celebram ao lado do clube o acolhimento do refugiado número 2.000.
A marca foi alcançada quatro anos depois do lançamento, em 2015, de um projeto para integrar menores de idade não acompanhados na sociedade belga tendo o futebol como fio condutor.
O projeto
A iniciativa nasceu em plena crise de refugiados e em meio a críticas pela falta de ação da Europa diante das mortes de imigrantes no mar Mediterrâneo.
Quatro anos e 2.000 menores depois, o diretor do clube e propulsor do projeto, Laurent Thiele, conta que sua principal meta é facilitar os primeiros momentos dos adolescentes na Bélgica.
"Minha mulher queria acolher uma família inteira da Síria em casa. Eu disse a ela que não era possível, mas que faríamos algo ainda mais importante", explicou Thiele, que além de comandar o Kraainem FC é diretor de trabalhos legislativos do Comitê Europeu das Regiões.
Três vezes por semana, uma caminhonete passa por três centros de amparo de menores refugiados da região para levarem às instalações esportivas grupos de sete a dez adolescentes com idades de 12 a 18 anos. A maioria deles é procedente da Síria, do Afeganistão, da Somália e da Eritreia.
Jovens também tem aulas de inglês, holandês ou francês
Laura Zornoza/ EFE - 13.9.2019Antes de entrar em campo, no entanto, é necessário ir à aula. Em uma sala construída especialmente para o projeto, os adolescentes estudam francês, holandês ou inglês com professores voluntários. Através dos idiomas, aprendem sobre a vida cotidiana belga, os costumes e a história do país ao qual acabam de chegar.
O projeto permanece de portas abertas também durante as férias escolares, quando organizações que colaboram com o clube proporcionam aulas de informática, habilidades específicas de formação profissional e educação cívica.
"Depois, os grupos se misturam com nossos times de futebol e treinam juntos. É uma maneira de integrá-los às nossas equipes durante uma hora e meia. E, depois disso, compartilham o lanche na cafeteria", descreveu Thiele.
Quatro anos depois, um menino senegalês de 16 anos, que está há alguns meses na Bélgica, se tornou o refugiado número 2.000 a participar, em algum momento, da iniciativa. Desse total, uma pequena parte segue filiada ao clube e passou a integrar e disputar competições realizadas nos finais de semana.
Patrocínios
Para financiar o custo anual de aproximadamente 100 mil euros, o clube, onde jogam regularmente 350 garotos de 45 nacionalidades em diferentes categorias, recebe suporte de instituições como a Comissão Europeia - através do programa Erasmus Plus -, a Fundação da Uefa para a Infância e várias entidades privadas da Bélgica.
O secretário-geral da Uefa, Theodore Theodoridis, garante que todos estão muito felizes com o impacto do projeto e que cada vez mais outros clubes têm replicado o modelo, especialmente no âmbito acadêmico: primeiro ir à aula e, depois, ao futebol.
"Nós focamos no impacto social. Se algum deles se tornar o novo Eden Hazard ou Kevin de Bruyne, melhor ainda", brincou, em entrevista à Agência Efe.
Durante o lanche após o treino, dois adolescentes falam animadamente em inglês. Eles se chamam Alli e Maan, e chegaram à Bélgica há três e quatro semanas, respectivamente, procedentes da Somália. Ambos são fãs de Romelu Lukaku e Dries Mertens, estrelas do ataque da seleção belga.
E, embora almejem uma carreira profissional, dizem que, por enquanto, o que mais gostam na Bélgica é o fato de que têm tudo à sua disposição, como uma casa e educação, enquanto na Somália viviam em uma guerra contínua durante décadas.
Thiele promete que o projeto seguirá funcionando: "Não podemos parar. A cada dia chegam a Bruxelas dez novos jovens refugiados, o que fazemos com eles? Deixamos lá nos centros de amparo?", questiona.
Na opinião de Thiele, o futebol canaliza a integração dos recém-chegados na sociedade belga, cuja seleção conta com vários jogadores que têm pelo menos um dos pais nascidos fora do país.