Presidente egípcio prometeu lutar contra terrorismo e o extremismo na região
REUTERS/Amr Abdallah Dalsh/21.02.2019Quase uma década após ter sido palco dos protestos que culminaram na Primavera Árabe, o Egito tenta, em 2019, reassumir seu papel de protagonismo no Oriente Médio e no Norte da África, segundo avaliam especialistas ouvidos pelo R7.
“A Primavera Árabe deixou claro para o mundo como o Egito é importante e influente na dinâmica regional. O país passou uma década se esforçando em restabelecer sua situação política e econômica e agora quer se recolocar como um ator importante na área”, comenta Emily Hawthorne, analista de Oriente Médio e Norte da África da Stratfor — plataforma americana de inteligência geopolítica.
Não à toa, o presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi assumiu a presidência da UA (União Africana, organização internacional que promove a integração entre os países do continente africano) no último dia 10 de fevereiro. Sua promessa: lutar contra o terrorismo e o extremismo na região.
O compromisso já tem sido honrado até as últimas consequências. Só na última semana, as forças de segurança egípcias mataram 16 supostos militantes em dois ataques distintos na cidade de Alarixe, na província de Sinai do Norte, e o governo executou nove homens de um grupo de 28 pessoas condenadas à morte pelo assassinato de um promotor público.
Cruzada contra o terror
Abdel Fattah al-Sisi assumiu a presidência da UA
REUTERS/Tiksa Negeri/21.02.2019A cruzada do militar al-Sisi contra jihadistas se estende desde que ele chegou ao poder, em 2014, e tem — além das causas obviamente políticas — motivações econômicas.
“Como resultado da instabilidade causada pela Primavera Árabe, houve a inserção de terroristas na península do Sinai — cadeia montanhosa do Egito que une África e Ásia — e, consequentemente, um impacto no turismo no país. O setor sempre foi fundamental para a entrada de moeda estrangeira no Egito e a economia local acabou prejudicada”, comenta Samuel Feldberg, especialista em Relações Internacionais e Oriente Médio pela USP (Universidade de São Paulo).
As medidas incisivas do presidente para conter as ameaças, entretanto, são alvo de críticas da comunidade internacional. A diretora da Anistia Internacional para o Norte da África, Najia Bounaim, declarou, por exemplo, que al-Sisi demonstra um “escandaloso desprezo” pelos direitos humanos. “Sob o seu mandato, o Egito sofreu um declive catastrófico dos direitos e liberdades”, disse.
Feldberg pondera, por outro lado, que o Egito nunca foi um país estável e raramente respeitoso em relação aos direitos humanos. “Foi um país sempre sujeito a tensões, com crises econômicas recorrentes. É a nação mais populosa do mundo árabe e sempre demonstrou problemas em alimentar seus habitantes. Historicamente, o governo teve que subsidiar elementos básicos como gasolina e trigo, além de controlar o preço do pão”, explica.
Governo militar
Embora pareça lógico considerar que o Egito vive hoje um regime militar como reflexo da Primavera Árabe, os especialistas entrevistados pelo R7 discordam. Hawthorne avalia, aliás, que a onda de protestos foi um “raro” momento de otimismo político em uma nação marcada por governos autoritários.
Em 2011, as manifestações resultaram na deposição do presidente militar Hosni Mubarak e na eleição democrática do ativista islâmico Mohamed Morsi para o comando do país. O período que se seguiu foi turbulento e acabou, em 2013, com um golpe encabeçado por al-Sisi — então ministro da Defesa. “O que aconteceu, desta forma, foi a retomada de uma característica dos governos anteriores à Primavera Árabe”, diz Feldberg.
Na opinião da analista da Stratfor, a reeleição de al-Sisi sem grandes dificuldades em 2018 — ele foi escolhido com mais de 98% dos votos — é resultado também de sua violenta repressão aos opositores. “Ele tem agora mais quatro anos para solidificar seu legado. Se, na época da Primavera Árabe, o governo queria reduzir a incerteza causada pela súbita revelação do poder popular, hoje as autoridades sentem que podem, ao menos, moldar e guiar esse poder”, aponta Emily Hawthorne.
O especialista da USP reforça que o governo de al-Sisi é “bastante razoável” no contexto de dificuldades do Egito e de uma região extremamente conturbada como o Oriente Médio. “Em relação à Síria ou ao Iraque, é um país em um momento relativamente estável. Mas a situação é de permanente mudança e transformação — o que é verdade hoje, pode ser que amanhã já se modifique”, conclui.