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Apesar de ainda estarem definidos os candidatos oficiais à Presidência dos EUA dos partidos Democrata e Republicano, é possível antecipar os rumos da política internacional do país analisando apenas o pensamento de cada partido.
Os professores de relações internacionais Pedro Costa, das Faculdades Rio Branco, e Cristina Pecequilo, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), falaram ao R7 sobre os principais temas que envolverão a diplomacia norte-americana e como eles devem ser tratados se o novo presidente dos EUA continuar a ser democrata ou se passar a ser repúblicano -
Combate ao terrorismo
Costa: Os republicanos tendem a fazer mais intervenções, tendem a remontar uma nova guerra ao terror, que iria além do discurso. Estamos falando de colocar tropas norte-americanas, de fato, em solo estrangeiro. Eles poderiam começar pela Síria, onde já há um quadro crítico há muito tempo, depois Iraque, o que não seria simples, porque o [presidente da Rússia, Vladimir] Putin se opõe, mas ele também não é um obstáculo tão intransponível. Com os democratas, têm menos chance de isso acontecer, mas eu não descarto se a Hillary vencer, porque ela já deu várias declarações de que a política do governo Obama tinha que ser mais incisiva. O que descartaria mesmo é o Sanders. Ele não vai fazer guerra, vai mais para o diálogo, mais parecido com o ObamaReprodução/dailymail.co.uk
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Cristina: O que os republicanos pedem, e que a Hillary também tem reproduzido um pouco, é uma intervenção mais decisiva, até mesmo uma intervenção terrestre dos EUA para barrar o avanço do EI (Estado Islâmico). Mas esse será um assunto muito delicado, porque a opinião pública norte-americana é contra novas guerras terrestres. Então, eles vão ter que criticar o Obama, mas sem apresentar uma agenda tão diferente do que está sendo feito agora. Se não é possível que ela seja rejeitada pelo público
Reprodução/ Daily Mail
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Intervencionismo
Costa: De maneira geral, o melhor é que seja eleito um democrata, porque eles tendem a ser menos intervencionistas, ou seja, provocam menos guerras, intervenções militares e menos instabilidade mundial. Se você pega o Obama como exemplo, ele foi muito mais negociador do que o Bush. O pior dos cenários para esta eleição seria o Trump, o melhor seria o Sander. A Hillary e o Rubio não seriam muito diferentes.
Cristina: A tendência é sempre essa, os republicanos têm um discurso mais agressivo e unilateral para resolver os impasses. Já os democratas devem apostar mais em uma coalizão internacional e multilateralThinkstock
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Rússia
Costa: Quem mais falou da Rússia durante as prévias foi o Trump, ele chegou até a dizer que o presidente russo não respeita o Obama. Que é preciso um presidente mais forte para falar mais alto e mais duro com o Putin. Ele não se comportaria como o Obama, ele iria enfrentar a Rússia, principalmente em relação às sanções impostas após a anexação da Crimeia. Os republicanos de modo geral pensam assim, isolar a Rússia com mais sanções e mais embargo aos produtos russos. Os republicanos também devem fortalecer energeticamente a Europa, para que ela fique menos dependente do gás russo. Ai você consegue isolar ainda mais a Rússia. A Hillary também vai ser mais ríspida e o Sanders teria uma postura mais parecida com a do ObamaGetty Images
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Cristina: Os candidatos democratas devem fazer uma campanha mais baseada nas ações do Obama, na qual você não pressiona muito, até mesmo porque a Rússia ainda é uma aliada do Ocidente em questões como a luta contra o terrorismo. Já os republicanos devem partir, mais uma vez, para uma ação mais unilateral, pedindo o aumento das sanções, talvez uma postura mais rígida contra a Rússia no Conselho de Segurança
Dmitry Serebryakov/AFP
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América Latina
Costa: Em termos de comércio exterior, os republicanos costumam pressionar menos, em relação à América Latina. Já os democratas, muitas vezes, acabam fazendo com que haja uma pressão para que se feche acordos bilaterais, que nem são bons para a América Latina. Os democratas também costumam ser mais precavidos com a entrada de produtos agrícolas no país, por exemplo, que é o que a América Latina tem a oferecer. Já com os republicanos há maior possibilidade desses produtos entrarem.
Cristina: A relação com os EUA dificilmente muda. O novo presidente, seja ele republicano ou democrata, a tendência é continuar dando preferência aos temas básicos: combate ao tráfico de drogas, imigração ilegal e estabelecer tratados de comércio com nações menores. Para os EUA, a América Latina é prioridade baixa -
Cuba
Costa: Esse ponto vai depender muito do candidato e não tanto de uma ideologia de partido. Os dois democratas principais [Hillary e Sanders] são a favor do fim do embargo. Já entre os republicanos, o Rubio é contra a aproximação e o Trump é a favor da abertura para negócios, por exemplo.
Cristina: No caso do Jeb Bush, ele poderia se colocar contrário a aproximação com Cuba durante a campanha, mas, após eleito, ele não iria fazer com que a reaproximação retrocedesse. Acho que ele continuaria o projeto. Com relação aos outros mais radicais à direita, fica uma incógnita, porque eles podem tentar reverter a política que o Obama fez. -
Venezuela
Costa: Os republicanos devem endurecer mais, isolar mais o [presidente Nicolás] Maduro. A situação já é bastante gritante porque o preço do petróleo não para de despencar e a Venezuela é dependente do petróleo. Os republicanos poderiam cobrar até mesmo o Brasil, para que ele seja mais atuante aqui na América do Sul, tenha uma voz mais ativa na questão das violações democráticas. Os republicanos são mais ferozes, inclusive, com a possibilidade de dar dinheiro a oposição venezuelana. Basta lembrar que em 2002 já teve uma tentativa de golpe, durante o governo do Hugo Chávez, assumidamente feito pelas oligarquias e meios de comunicação venezuelanos e com a ajuda dos EUA, no governo Bush. Esse tipo de coisa, um democrata não faz, um republicano pode fazer. Já os democratas tendem a ser menos amenos -
Brasil
Costa: As relações entre Brasil e EUA já são muito sólidas, são relações de Estado para Estado. É difícil ter uma alteração drástica. Agora se for o Trump, na verdade, vai ficar mais difícil as relações com qualquer país do mundo.
Cristina: Existe uma ilusão de que determinadas ações brasileiras podem fazer com que os EUA prestem mais atenção ao Brasil, mas a região em si é de baixa prioridade. Eles estão voltados para a Ásia, China, Rússia, Coreia do Norte. Já, economicamente, é interessante para eles manter as relações com o Brasil, para que eles possam exportar mais para cá -
Imigração
Costa: Nas últimas eleições o papel dos imigrantes já foi muito grande. Eles tendem a votar, tradicionalmente, nos democratas. Entre os republicanos, os candidatos destoam um do outro. Tem o Trump, que quer deportar 11 milhões de pessoas, imigrantes ilegais que vivem nos EUA. Já o Rubio, ele prega uma melhor vigilância na fronteira. Mas, por ser filho de cubano-americanos e falar espanhol, ele pode ser mais simpático aos imigrantes, por terem mais proximidade com ele. Ao mesmo tempo, o Jeb Bush foi governador da Flórida, que é um Estado que tem muito imigrante, e a mulher dele é mexicana, ele também fala espanhol. Isso também pode ajudar ele a conseguir os votos que são dos democratas. O Bernie é a favor de completar a reforma migratória, assim como a Hillary também -
Cristina: Uma das grandes cartadas do Obama foi promover a reforma na imigração e garantir que muitos votos que estavam migrando para republicanos parassem de migrar. Esse voto dos hispânicos, dificilmente os democratas perdem. O Obama está deixando o terreno pronto. Já os republicanos estão tentando lutar para atrair esses votos. Esse eleitorado pode ser muito decisivo. Dependendo de quem ganhar, a reforma continua, se for democrata. Se for republicano, vai depender muito do candidato, porque pode haver um retrocesso
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