Mesmo com metas apresentadas para a COP-21, aquecimento global pode ultrapassar limite considerado seguro
Reprodução/ThinckstockCom a proximidade da COP-21 (Conferência da ONU para a Mudança do Clima), que acontecerá em Paris entre este domingo (29) e 11 de dezembro, muito se discute sobre o papel de cada país na luta contra o aquecimento global.
Por muitos anos, a ideia de reduzir as emissões de gases do efeito estufa foi relacionada a um prejuízo para o crescimento de um país e, por isso, havia grande resistência de países ricos e emergentes de cortar suas emissões. Essa discussão, no entanto, perdeu completamente o sentido, afirma Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.
— Os países emergentes não precisam seguir o mesmo caminho dos países ricos, de se desenvolver como na Revolução Industrial, à custa de emissões e da queima de combustíveis fósseis. Dez, 15 anos atrás, as pessoas ainda discutiam esse “direito de poluir”, como se ele fosse o único meio de se desenvolver, mas, hoje, se sabe que existem outras alternativas para crescer de forma sustentável.
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Nesse sentido, até mesmo os dois maiores poluidores mundiais, Estados Unidos e China, anunciaram que irão cortar suas emissões até 2025 e 2030, respectivamente, enfatiza Ricardo Zibas, sócio-diretor responsável pela prática de sustentabilidade da KPMG no Brasil e América Latina.
— Há previsão de que as atividades intensivas na emissão de carbono (como, por exemplo, as que geram energia a partir da queima de derivados de petróleo) se tornarão mais caras e as organizações terão de lidar com regulamentações mais rigorosas, preços de carbono menos acessíveis e metas de corte de emissões de gases mais rígidas. Na contramão disso, vantagens surgirão, como, obviamente, a de se tornar uma empresa de emissões reduzidas de poluentes; e oportunidades também estarão em vista, criadas pelo crescimento da economia sustentável embasada em energias renováveis.
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Acordo climático definido em Paris passará a valer a partir de 1° de janeiro de 2021
Arte R7Todas as metas apresentadas para a COP-21 são voluntárias, nenhum país é obrigado por um órgão ou entidade mundial a reduzir suas emissões e também não há uma porcentagem mínima para isso. Essa liberdade na elaboração das propostas faz com que aumente a crença de que todos irão concretizá-las. No entanto, lembra Rittl, essa também é uma brecha para que cada país apresente uma meta menor do que o esperado.
— Nenhum país colocou na mesa o que poderíamos chamar de “fatia adequada da conta do clima”, ou seja, o suficiente para pagar a sua parcela de responsabilidade pelo clima do planeta. Brasil, União Europeia e alguns outros países deram um passo maior do que muitos outros, mas as metas, até agora, são bem inferiores ao que é necessário para conter o aquecimento global.
Cientistas consideram que é necessário fazer com que o aquecimento global se limite a 2°C (em relação à era pré-industrial 1850-1900), até o fim do século, para que as mudanças climáticas fiquem em um nível considerado relativamente seguro. No entanto, a convenção da ONU publicou um relatório que avalia o impacto agregado dos compromissos apresentados pelos países até 1º de outubro e esse relatório aponta que o mundo caminha para um aquecimento global de 3°C até o 2100.
— Para se ter uma ideia, hoje, nós temos um aquecimento global de cerca de 1°C, o que pode parecer pouco mas não é. Se aumenta 1°C na temperatura do corpo humano, ele fica com febre. Com o mundo é a mesma coisa, a temperatura média global gira em torno de 14°C a 15°C. Com o aquecimento de apenas 1°C, nós já temos um impacto muito grande no meio ambiente, impactos econômicos e de perdas de vidas. Imagine com 3°C? Não existe nenhum pedaço do planeta que esteja isento dos efeitos do aquecimento global. E as consequências podem ser muito severas.
O acordo climático definido em Paris passará a valer a partir de 1° de janeiro de 2021. Durante a COP-21 também deverá ser definida uma série de processos para regulamentar e viabilizar a implementação desse acordo.
— Vai se discutir como serão monitoradas as emissões, que informações esses países precisam fornecer para a comunidade internacional e a Comissão de Clima e como se dará a validação daquela informação. A penalidade para o não cumprimento também terá de ser discutida. Haverá punição? Qual será? Como esses países pagarão? Isso ainda não está muito claro.
Brasil
O governo brasileiro apresentou uma intenção de reduzir suas emissões de gases do efeito estufa entre 37% e 43% até 2030 (com base nas emissões de 2005). Apesar de ser uma das melhores propostas apresentadas para a COP-21, ela não representará nenhum sacrifício para o País, afirma Rittl.
— Não há um grande desafio na meta do Brasil, existe sim a necessidade de coordenação de ministérios e vontade política para definir como a gente vai trabalhar para harmonizar o agronegócio, a indústria e os transportes à proteção do clima. Isso é plenamente possível de ser feito e o Brasil, na verdade, pode fazer muito mais.
O setor do agronegócio é o maior responsável pelas emissões de CO2 do País, direta e indiretamente. Em termos brutos, o desmatamento corresponde a 35% das emissões e a agricultura e pecuária por, em torno de, 26%. No entanto, os dois setores estão diretamente ligados, explica Rittl.
— Grande parte das terras desmatadas é convertida para a agricultura. Se a gente soma as emissões de desmatamento com as que vem direto da agropecuária, o setor do agronegócio passa a ter uma responsabilidade acima de 60% das emissões brasileiras.
Em termos práticos, a conta do Brasil se divide assim:
62% agronegócio (pecuária 49%, agricultura 13%, somando emissões diretas e o desmatamento relacionado a cada setor)
13,4% indústria de base (emissões diretas e por consumo de energia)
15% transportes
É nesses setores que o governo deve focar políticas fiscais, tributárias, de ciência, tecnologia e inovação, acredita Rittl.
— Cada vez mais é claro que há muitas oportunidades de reduzir as emissões sem prejudicar a economia e, se nós não reduzirmos, o preço a pagar vai ser muito alto.
O especialista diz que estudos recentes demonstram que os benefícios econômicos seriam ainda maiores se o País deixasse de emitir gases em escala maior do que foi prometido.
— Ao investir e desenvolver o setor de fontes renováveis de energia, o Brasil poderia criar milhares de empregos em um setor que ainda não está estruturado. Assim como investir em restauração florestal também é interessante. Além disso, a agricultura e pecuária de baixo carbono são mais eficientes. Isso faz bem para o produtor e faz bem para a economia do País. Indo mais além, reduzir emissões também traria benefícios econômicos até mesmo em relação aos custos da saúde, com a diminuição dos gastos com tratamentos de doenças relacionadas à poluição.
Zibas completa dizendo que o mercado também está respondendo a essa nova realidade.
— O fato de todos os países signatários da Convenção: Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) terem assinado um tratado para reduzir suas emissões de gases causadores de efeito estufa favorece essa convicção positiva. E há novos posicionamentos do mercado quanto ao tema, por exemplo, houve uma drástica redução nos custos das tecnologias capazes de diminuir tais emissões ao meio ambiente, isso em razão do aumento de projetos de energia renováveis disponíveis e pela maior facilidade em financiar a aquisição desses recursos.
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