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Cemig dá aval a contrato irregular de RH para seleção de presidente 

Energética de MG atropelou regimento para honrar contrato sem licitação com empresa de recursos humanos, negociado pelo Novo

Minas Gerais|Lucas Pavanelli, do R7

Cemig contratou empresa de recrutamento para selecionar presidente após nomeação
Cemig contratou empresa de recrutamento para selecionar presidente após nomeação Cemig contratou empresa de recrutamento para selecionar presidente após nomeação

A Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) contratou uma empresa de Recursos Humanos, de forma irregular e sem licitação, para realizar um processo de seleção que resultou na nomeação do seu atual presidente. O serviço foi negociado pelo partido Novo em novembro de 2019 mas, para justificar o pagamento, a Cemig precisou fazer uma manobra jurídica. 

A empresa do setor elétrico de Minas pagou R$ 170 mil pelo trabalho de recrutamento que escolheu o nome de Reynaldo Passanezi Filho. No entanto, elejá estava no cargo há 39 dias, quando o contrato para o início do serviço pela empresa de RH foi assinado. 

A reportagem teve acesso aos documentos que comprovam a manobra jurídica da Cemig para justificar a contratação da Exec, especializada em recursos humanos, que foi feita na modalidade de "inexigibilidade de licitação".

Pelas regras da Cemig, companhia de economia mista, a prerrogativa da indicação do presidente é do governador de Minas Gerais, mas o partido de Romeu Zema (Novo) preferiu optar por um processo de seleção de um executivo, por meio da empresa do tipo "headhunter", a Exec Recursos Humanos Ltda. Com o serviço já prestado, a Cemig dispensou a licitação e fez um contrato para justificar o pagamento dos serviços. 

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A reportagem relatou o caso para o professor de direito administrativo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Florivaldo Dutra de Araújo, que afirmou que a situação sugere uma série de ilegalidades. 

— Em primeiro lugar, não há que se confundir o partido com o governador. É uma coisa descabida, no ordenamento jurídico brasileiro, que um partido político atue em lugar do Estado. Isso já é algo estranho. Além disso, não se contrata empresa para fazer algo que já foi feito. 

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Negociação

O primeiro contato com a Exec Recursos Humanos Ltda., foi feito por um dirigente do partido Novo, que atuou em nome da Cemig, mesmo não tendo vínculo formal com a empresa. Em 28 de novembro de 2019, a Exec enviou uma proposta para o partido no valor de R$ 170 mil para realizar a seleção de um executivo com perfil para assumir a companhia mineira.

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Menos de dois meses depois, em 13 de janeiro de 2020, o nome do economista Reynaldo Passanezi Filho foi aprovado pelo Conselho de Administração da Cemig. Ele já havia ocupado o cargo de presidente da Cteep (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista).

Um documento obtido pela reportagem, mostra que o contato com a Exec foi feito por uma liderança do partido Novo em Minas. Em nota, a legenda confirmou que os serviços prestados por ele e pelo próprio partido foram "voluntários". 

Em nota, o partido Novo disse que a contratação foi feita pela Cemig, mas justificou a escolha da Exec com base na proximidade entre a empresa e a legenda. 

"Como a Exec é uma empresa de reconhecida competência no mercado que atua, já conhecia os valores e princípios defendidos pelo governo de MG e praticou preço inferior a seus concorrentes, foi definido a contratação da mesma como uma forma de profissionalizar e dar transparência a escolha do cargo mais importante da maior estatal mineira", justifica o partido.

No entanto, como o processo de contratação feito pela Cemig foi por meio de "inexigibilidade de licitação", não houve pesquisa de preços e nem mesmo foram consideradas outras empresas concorrentes para a realização do serviço. 

Contratação

A ideia de contratar uma empresa para escolher o presidente da Cemig veio do partido Novo depois que o então presidente da empresa, o executivo Cledorvino Belini, avisou que deixaria o cargo. Ele ficou menos de um ano no posto.

O dirigente do Novo pediu à Exec que elaborasse uma proposta de contratação e recebeu uma resposta no dia 28 de novembro de 2019. 

No documento de 10 páginas, classificado como “confidencial”, a empresa garante elaborar um plano estratégico de mapeamento de mercado e de potenciais candidatos (“Hunting”), diz contar com banco de dados públicos, websites, blogs e comunidades virtuais de negócios, indicações de candidatos a partir do networking de seus consultores e indicações feitas pelos próprios clientes para a seleção do profissional.

Ainda de acordo com o documento, a Exec se comprometeria a entregar, em um prazo de três a quatro semanas, uma relação de três a cinco candidatos finalistas e um resumo do perfil de cada um deles. O valor cobrado foi de R$ 170 mil, que deveria ser pago em três parcelas iguais, a primeira na assinatura do contrato.

No entanto, o mesmo documento somente chegou às mãos do diretor-adjunto de Gestão de Pessoas da Cemig, Hudson Almeida, em 21 de janeiro de 2020, oito dias depois de o presidente ter sido escolhido pelo Conselho de Administração da Cemig, após seleção feita pela Exec.

Inexigibilidade de licitação

Com o serviço já prestado pela Exec, a Cemig fez uma manobra jurídica para poder justificar o pagamento dos serviços, que já haviam sido prestados pela empresa de recursos humanos. 

Para que a proposta passasse pelos mecanismos de governança da empresa, foi preciso que a Diretoria Executiva, já chefiada pelo presidente Reynaldo Passanezi Filho, aprovasse a contratação da empresa de recrutamento por meio de inexigibilidade de licitação.

Esse procedimento é autorizado pela legislação quando uma empresa ou o Estado precisa realizar a contratação de um serviço extremamente especializado, que precise ser executado por alguém que tenha "notória especialização", o que não é o caso, na avaliação do professor de Direito Administrativo da UFMG, Florivaldo Dutra de Araújo.

Segundo ele, a inexigibilidade de licitação é um procedimento previsto em lei, mas que é usado, muitas vezes, para encobrir atos "eticamente duvidosos".

— De tudo o que existe na licitação é o mais propício e mais usado para atos que são eticamente duvidosos. A lei fala que, depois de alinhar uma série de restrições àquela situação, tem que se deixar evidente que a pessoa ou empresa contratada é indubitavelmente a melhor para realizar aquilo.

O especialista ressalta que há inúmeras empresas de recrutamento no mercado e que, mesmo no caso de uma companhia de grande porte como a Cemig, a modalidade da inexigibilidade de licitação não se aplicaria. 

— Não precisa ser muito versado em direito para ver que há várias empresas de recrutamento que fazem isso para grandes corporações. 

No dia 20 de janeiro, uma semana após sua nomeação, o presidente chefiou uma reunião que analisou a PD (Proposta de Deliberação) 13/2020. A PD autorizava a contratação da Exec por inexigibilidade de licitação e foi aprovada pelos presentes. Passanezi Filho assinou o documento que autorizou a empresa comandada por ele a pagar pelo processo de seleção que culminou na sua contratação.

Assinatura do presidente da Cemig autorizando contratação de empresa que o escolheu
Assinatura do presidente da Cemig autorizando contratação de empresa que o escolheu Assinatura do presidente da Cemig autorizando contratação de empresa que o escolheu

No dia seguinte, com a aprovação da proposta, o gerente de Provimento e Desenvolvimento de Pessoas, Rômulo Provetti, autorizou que a empresa desse início a um processo administrativo para a contratação da Exec (veja o documento aqui). Um parecer jurídico deu ares de legalidade ao processo e justificou a necessidade de contratação por meio direto, sem exigência de um processo de licitação. 

Em 21 de fevereiro, Cemig autorizou o contrato com a Exec
Em 21 de fevereiro, Cemig autorizou o contrato com a Exec Em 21 de fevereiro, Cemig autorizou o contrato com a Exec

A contratação da Exec pela Cemig foi oficializada no mesmo dia da assinatura deste documento, em 21 de fevereiro de 2020. O contrato assinado pelas partes, no entanto, cita que o serviço começou a ser prestado em 28 de novembro de 2019, data em que o dirigente do partido Novo havia recebido a proposta da empresa.

Recrutamento 

O vínculo da Exec com o partido Novo não se resume ao processo de contratação do presidente da Cemig, Reynaldo Passanezi Filho. A empresa também atuou no recrutamento de secretários de Estado que assumiram cargos na gestão de Romeu Zema. 

No entanto, de acordo com o Governo de Minas, não houve qualquer contratação pela administração pública do Estado. A Exec também não consta entre os fornecedores do Executivo estadual, de acordo com os registros no Portal da Transparência.

"A seleção do secretariado foi realizada com apoio do Partido Novo", informou em nota, a assessoria de imprensa do governo estadual.

A Exec também atuou junto ao partido Novo no processo de seleção de candidatos da legenda para disputarem as eleições municipais de 2020 em algumas cidades, sobretudo no interior de São Paulo.

Outro lado

A reportagem entrou em contato com a Cemig e aguarda um posicionamento da companhia. 

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