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Alunos da rede pública rasgam livros para comemorar fim das aulas

Cadernos e apostilas didáticas foram jogados nas ruas perto das escolas

São Paulo|Juca Guimarães, do R7

A rua ficou cheia de papel
A rua ficou cheia de papel A rua ficou cheia de papel

Atos de rebeldia e vandalismos marcaram o final do ano letivo em diversas escolas da rede estadual de ensino em São Paulo. Para comemorar os últimos dias de aula, os estudantes destruíram apostilas, livros e cadernos. 

No Cangaíba, na zona leste, a rua da escola estadual República do Uruguai ficou cheia de folhas rasgadas de apostilas didáticas. As imagens foram feitas no dia 5 de dezembro. Na primeira semana do mês, também foram relatados casos de destruição de material escolar na porta de escolas na Cohab 2, em Itaquera, e no Capão Redondo, na zona sul da capital.

Em Cotia e em Osasco, cidades da região metropolitana, os alunos do ensino médio também destruiram o material didático e deixaram a rua cheia de papel rasgado. Até livros didáticos, que poderiam ser usados por outros alunos no ano que vem, foram destruídos. 

A reportagem do R7 apurou casos de destruição de material didático nas seguintes escolas: E. E. Celestino Pires (Cotia), E.E. Professor Salim Farah Maluf (Itaquera) e E.E. Fernando Buonaduce (Osasco). No ano passado, alunos de uma escola pública de Franca, no interior do estado, foram flagrados rasgando livros. 

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Um dos alunos da escola República do Uruguai, no Cangaíba, contou que os estudantes começaram a rasgar as apostilas ainda na sala de aula. "Foi um pessoal do sétimo e do sexto ano; eles começaram a rasgar na sala, saíram para o pátio e depois foram pra rua, onde jogaram tudo no chão", disse o aluno que pediu para não ser identificado. Ele também que nenhum funcionário da escola estava perto na hora. "Acho que ninguém viu", comentou.

Uma das professoras da escola ficou indignada com a cena "Fiquei muito triste. É a tradução de como eles estão vendo a educação. Eles não ficam constrangidos nem em sujar a via pública. Infelizmente, a estrutura do ensino não estimula o aluno a valorizar o material didático", disse. 

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Na zona sul, o escritor Ferréz, autor do livro Capão Pecado, presenciou uma cena parecida com alunos destruindo material escolar. "Eu estava dirigindo na estrada de Itapecerica e vi os estudantes alegres no meio da pista, rasgando e jogando para o alto livros e cadernos. Parei o carro e fiquei tentando entender. Deu um baque. É uma cena que vai contra tudo o que plantamos e justo aqui no nosso quintal. Eu andava cinco quilômetros para comprar um livro de R$ 1. O livro sempre foi um privilégio para mim e para meus colegas. Até caderno, no nosso tempo [de escola pública] era para mostrar pra família com orgulho e guardar. Estojo de lápis, eu só fui ter um na quarta série, imagina então livros, era raro", contou Ferréz, que é um dos escritores mais premiados do Brasil e dá palestras em vários países do mundo.

Em nota, a Secretaria Estadual de Educação disse que lamenta a destruição de livros e apostilas didáticas. "Os estudantes são constantemente orientados a conservarem o material que é repassado no início do ano letivo, já que os livros podem ser reaproveitados por outros alunos. Todas as escolas desenvolvem projetos de conscientização e conservação do material escolar, que são pensados especialmente para os estudantes", diz a nota.

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A secretaria também informou que os alunos envolvidos e indentificados serão advertidos.

Segundo o psicólogo Eduardo Rodrigues, a atitude dos alunos é totalmente errada e injustificável, no entanto, ele pondera que a adolescência é uma fase muito difícil da vida e normal manifestações de rebeldia e agressividade. "A adolescência é uma fase de transição muito intensa. Você sai da infância que é um mundo de criatividade e imaginação e entra em um mundo cheio de sensações e sentimentos novos. É um turbilhão de hormônios também. Atitudes impensadas e inconsequentes são reflexo disso. A rebeldia é umas das características que o adolescente tem. Eles passam dos limites. É uma agressividade latente e intensa", comentou.

Livro poderia ser usado em 2018
Livro poderia ser usado em 2018 Livro poderia ser usado em 2018

Rodrigues não acredita que a advertência seja a melhor abordagem para o problema. "A escola precisa ouvir os alunos. Construir um diálogo para que eles pensem nas escolhas que fazem e em suas atitudes. Uma advertência ou suspensão são paliativos, não resolve o problema. O jovens dessa geração têm mil qualidade e mil defeitos, eles pagam pelos defeitos que têm, mas a escola não se aprofunda nisso. Eles precisam de apoio e conversa para refletir e chegar na conclusão que a escola é uma coletividade e eles fazem parte dela", disse.

Na região do Grajaú, no bairro do Iporanga, na zona sul, Rodrigues coordena o projeto Possibilidades; onde são realizados encontros abertos para discutir com jovens problemas do cotidiano e reflexões sobre a vida.

Além dos depoimentos e conversas, o projeto também promove shows de música e sarau de poesia. "É um jeito de fazer o jovem encarar, refletir, compartilhar e resolver os próprios problemas e aflições", disse Eduardo. O projeto existe há cinco anos.

Minas Gerais

O professor Giovani Verazzani, 33 anos, é professor do ensino médio em um escola pública em Juiz de Fora (MG), e considera que a atitude dos alunos que rasgam livros no último dia de aula reflete um modelo equivocado de ensino.

"O estado brasileiro oferece um tipo de escola que exclui e que segrega. Uma escola que usa o conhecimento para oprimir, principalmente aqueles que não têm o privilégio de três refeições por dia e alguém que oriente nas tarefas escolares em casa. A escola não sabe como cobrar um saber e um conhecimento desses jovens. Eles fazem isso não por desprezar o conhecimento. Eles fazem isso porque a educação da escola não dá subsídio necessário para que eles entendam o significado da escola. Vira mais uma prisão do que um espaço de conhecimento. A escola infantiliza e bestializa o aluno", disse o professor que dá aulas há 11 anos.

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