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Atendimentos a mulheres vítimas de violência crescem 75% em SP

Informação, conscientização e integração entre polícia e rede de acolhimento podem estar por trás da busca por serviços

São Paulo|Por Fabíola Perez, do R7

Maior circulação com fim de restrições também se relaciona ao aumento de denúncias
Maior circulação com fim de restrições também se relaciona ao aumento de denúncias Maior circulação com fim de restrições também se relaciona ao aumento de denúncias

Os atendimentos a mulheres vítimas de violência doméstica em 2021 cresceram 75% em relação a 2020 na cidade de São Paulo. No último ano, 42.212 mulheres foram atendidas nos 17 serviços da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania que compõem a rede de proteção a esse público.

A advogada Marina Ruzzi, especializada em gênero e fundadora do primeiro escritório de advocacia feminista do país, considera o aumento significativo e acredita que tenha ocorrido em razão do maior volume de informações durante a pandemia e à integração dos serviços entre a polícia e a rede de acolhimento.

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“Estamos falando de mulheres que foram procurar serviços de assistência jurídica, social e psicológica para além de uma eventual busca por medida protetiva, registros de boletim de ocorrência. Isso é muito positivo”, afirma. “Na pandemia, houve muita informação sobre a natureza e a qualidade dos serviços, elas descobriram que esses equipamentos existiam. Quando a gente pensa em violência contra a mulher, pensa em delegacia da mulher. Como advogada, sinto que houve uma integração maior entre a polícia e os atendimentos de mulheres vítimas de violência feitos na rede de acolhimento.”

De acordo com dados da secretaria, em maio do ano passado, um dos meses com mais mortes em decorrência da pandemia no país, o número de atendimentos de mulheres vítimas de violência doméstica na capital chegou a 3.871, um crescimento de 39% em relação ao mês anterior. Em junho, o número se manteve acima de 3.000. O pico, registrado em agosto pela pasta, teve um total de 4.343 atendimentos.

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Estamos falando de mulheres que foram procurar serviços de assistência jurídica%2C social e psicológica para além de uma eventual busca por medida protetiva%2C registros de boletim de ocorrência. Isso é muito positivo

(Marina Ruzzi, advogada especializada em gênero)

O aumento na procura pelos serviços está relacionado a dois motivos, de acordo com órgãos. O primeiro deles é o fim das restrições de circulação, que resultaria na maior busca pelos serviços em comparação ao ano anterior, e o segundo se refere à conscientização das mulheres sobre a necessidade de pedir ajuda em situações de violência doméstica e relacionamentos abusivos.

"A informação é o caminho para que muitas mulheres que estão vivendo em situação de violência consigam sair desse martírio. Saber que existem locais de acolhimento e que nesses ambientes a mulher pode ser ouvida sem julgamentos é para muitas o necessário para a quebra do ciclo de violência", afirma Ana Cristina Souza, coordenadora de políticas para mulheres da da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.

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Tainã Góis, conselheira de política para mulheres do Conselho de Política para Mulheres do município de São Paulo, afirma que, além da significativa redução no número de denúncias realizadas em 2020, em razão das medidas de isolamento social, é preciso considerar o impacto da crise econômica sobre os casos de violência doméstica. “O desemprego masculino e feminino é também uma das causas por trás do aumento nos atendimentos”, diz ela.

Um estudo realizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em 2019 mostrou que trabalhar fora e ter independência financeira não é garantia de proteção às mulheres contra a violência doméstica. Segundo os dados, o índice de violência contra mulheres que integram a população economicamente ativa (52,2%) é praticamente o dobro do registrado pelas que não compõem o mercado de trabalho (24,9%). “A presença feminina no mercado de trabalho – por contrariar o papel devido à mulher dentro de valores patriarcais – faz aumentar as tensões entre o casal, o que resulta em casos de agressões e no fim da união", destacou o Ipea.

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Mulheres que vivem em regiões periféricas apontam dificuldades em acessar os serviços%2C seja pelo transporte%2C seja por acreditarem que o atendimento é pouco acolhedor

(Tainã Góis, conselheira de política para mulheres de São Paulo)

Em relação ao perfil da vítima de violência doméstica, a Secretaria Municipal de Direitos Humanos divulgou, em agosto de 2021, um estudo sobre mulheres que sofreram agressões durante a pandemia e buscaram atendimento nos equipamentos públicos. A pesquisa identificou que, em geral, essas mulheres são brancas, da faixa etária entre 30 a 49 anos, solteiras, heterossexuais, com formação escolar igual ou superior ao ensino médio e rendimento de um a dois salários mínimos.

“Muitas mulheres que vivem em regiões periféricas apontam dificuldades em acessar os serviços, seja pela questão do transporte, seja por acreditarem que o atendimento é pouco acolhedor”, ressalta Tainã.

Para a promotora de Justiça de Enfrentamento à Violência Doméstica de São Paulo e presidenta da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica de São Paulo, Fabiana Dal’Mas, é preciso lembrar dos mecanismos da Lei Maria da Penha que possibilitam as denúncias. “É uma legislação muito importante para as mulheres brasileiras. Ela deu visibilidade ao problema da violência doméstica”, diz. “A pandemia, com uma convivência doméstica intensa entre familiares, potencializou a prática de agressões. Esse fenômeno aconteceu não apenas no Brasil, mas ao redor do mundo, por isso a procura aos serviços aumentou.”

Orçamento para 2022

Segundo a Lei Orçamentária Anual de 2022, a verba destinada a serviços e equipamentos que atendem mulheres vítimas de violência é de mais de R$ 23 milhões, um aumento de 21,95% em comparação ao valor do ano anterior, de R$ 18 milhões. A lei estabelece metas e prioridades para os gastos públicos, tendo como base o valor total arrecadado pelos impostos. Ela é proposta todos os anos pela prefeitura e precisa ser aprovada na Câmara dos Vereadores.

Não vemos esse aumento de 22% no orçamento e%2C ao mesmo tempo%2C assistimos a uma redução%2C uma tentativa de estrangulamento dos serviços

(Tainã Góis, conselheira de política para mulheres de São Paulo)

A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania afirma que fazem parte dos serviços os canais de denúncia pelo Disque 156, que em 2021 realizou 1.661 atendimentos, e a concessão do auxílio-aluguel. Os equipamentos são compostos de quatro Centros de Referência, cinco Centros de Cidadania da Mulher, que funcionam das 10h às 16h, Casa da Mulher Brasileira, que atende mulheres 24 horas por dia, durante a semana e aos sábados e domingos, Casas de Abrigo e de Acolhimento Provisório, que possuem 20 vagas cada uma, e três postos avançados de apoio à mulher.

Centro de Referência Eliana de Grammont foi submetido a um projeto de terceirização
Centro de Referência Eliana de Grammont foi submetido a um projeto de terceirização Centro de Referência Eliana de Grammont foi submetido a um projeto de terceirização

Apesar de a prefeitura prever um aumento de 21,95% no orçamento para 2022, um estudo realizado pela bancada feminista do PSOL identificou uma redução na verba prevista no PPA (Plano Plurianual) entre os anos 2022 e 2025 – projeto encaminhado à Câmara Municipal pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) com o planejamento para programas, ações e metas. Segundo o PPA, o orçamento da cidade contra a violência doméstica seria de R$ 32 milhões em 2021, R$ 25,9 milhões em 2022, R$ 17,7 milhões em 2023 e R$ 17,8 milhões em 2024.

Questionada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Direitos Humanos afirmou que o plano se trata de um cálculo técnico, que serve como um norte, e ainda precisa ser aprovado pela Câmara. Segundo a pasta, as secretaria podem fazer reajustes e reavaliar os valores necessários. O órgão disse também que a Lei Orçamentária Anual é que estipula o valor que o município tem para trabalhar. O plano seria, segundo a secretaria, uma “referência que cada pasta avalia para ver se é possível reduzir ou necessário reajustar”.

A conselheira Tainã lembra que, no ano passado, o Conselho de Política para Mulheres, junto de outras entidades, entrou com uma representação no Tribunal de Contas do Município para paralisar o processo de terceirização do Centro de Referência à Mulher Casa Eliane de Grammont, localizado na zona sul da cidade.

“Não vemos esse aumento de 22% no orçamento e, ao mesmo tempo, assistimos a uma redução, uma tentativa de estrangulamento dos serviços”, diz Tainã. A advogada Marina Ruzzi afirma que ainda há “falta de transparência” em relação às despesas e ao número de mulheres atendidas em cada serviço oferecido pela prefeitura.

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