Imunizante é feito a partir de folhas de tabaco selvagem
Divulgação/MedicagoO processo de avaliação para uso emergencial de uma vacina anti-Covid na OMS (Organização Mundial da Saúde) tende a não prosperar. O motivo: o desenvolvedor é um laboratório canadense ligado à indústria do tabaco. Inclusive o próprio imunizante é feito a partir de folhas de tabaco selvagem.
A vacina no centro da polêmica é da Medicago, empresa canadense que firmou parceria com o gigante farmacêutico britânico GSK (GlaxoSmithKline) no desenvolvimento do produto. Ela já foi aprovada pelo Canadá, em fevereiro deste ano, para uso em adultos de 18 a 64 anos.
Em entrevista nesta semana, a assistente do diretor-geral da OMS para acesso a medicamentos, vacinas e produtos farmacêuticos, a brasileira Mariângela Simão, afirmou que a entidade havia interrompido o processo de pré-qualificação do imunizante e que "muito provavelmente" ele não será aprovado.
"Devido às suas conexões — é parcialmente de propriedade da Philip Morris —, o processo está suspenso. [...] A OMS e a ONU [Organização das Nações Unidas] têm uma política muito rígida em relação ao envolvimento com a indústria de tabaco e armas; por isso é muito provável que [o imunizante] não seja aceito na lista de uso emergencial."
A Philip Morris é a maior fabricante de cigarros do mundo e detém 21% de participação na Medicago. O restante pertence à farmacêutica japonesa Mitsubishi Tanabe.
Em comunicado, o diretor-executivo e presidente da Medicago, Takashi Nagao, afirmou que a companhia ainda não tinha recebido nenhum retorno oficial da OMS, mas se antecipou ao dizer que a suspensão não tem como base a vacina em si.
"É nosso entendimento que essa decisão está ligada ao acionista minoritário da Medicago e não ao perfil de segurança e eficácia demonstrado de nossa vacina contra Covid-19."
Vacina foi aprovada no mês passado por órgão regulador do Canadá
Divulgação/MedicagoA tecnologia da vacina da Medicago é baseada em uma plataforma que usa o tabaco selvagem (N. benthamiana) como biorreator para produzir versões não infecciosas do coronavírus Sars-CoV-2, causador da Covid-19.
Segundo a empresa, a N. benthamiana "é a hospedeira experimental mais utilizada em virologia de plantas, devido, principalmente, ao grande número de vírus que podem infectá-la com sucesso", afirma a companhia.
O sistema imunológico enfraquecido da N. benthamiana, resultado de mudanças genéticas naturais ao longo de milênios, permite que o material genético do vírus pode ser hospedado com sucesso pela planta e não rejeitado.
Essas partículas semelhantes a vírus "imitam a estrutura nativa" dos patógenos, o que ajuda de forma eficaz o reconhecimento do nosso sistema imunológico.
Mas elas não levam nenhum material genético central, "o que não as torna infecciosas ou capazes de se replicar", acrescenta a desenvolvedora.
A farmacêutica britânica GSK foi a responsável pelo desenvolvimento do adjuvante — substância utilizada para potencializar a capacidade do antígeno.
A fase 3 de testes da vacina foi conduzida com 30,9 mil voluntários em dez países, inclusive o Brasil, onde cerca de 3.500 voluntários foram selecionados.
A Medicago também apresentou o pedido de registro dos órgãos reguladores dos Estados Unidos (FDA) e do Reino Unido (MHRA).