Eny Rodrigues faz tratamento há oito anos com medicamentos indisponíveis no SUS e está curada do câncer
Reprodução/facebook.comQuando a aposentada Eny Rodrigues, 58 anos, foi diagnosticada pela segunda vez com câncer de mama, em 2007, ela ouviu do médico que poderia rodar o mundo, mas não encontraria nada que poderia combater a doença. O câncer já havia se espalhado para o fígado e pelos ossos da paulista e o único tratamento disponível naquele momento era a quimioterapia, que lhe daria apenas alguns meses de vida.
Com a sentença de morte nas mãos, Eny decidiu se agarrar a única esperança que apareceu em seu caminho: participar de um estudo com novas drogas que estava começando no Hospital Pérola Byington, em São Paulo, onde ela já se tratava. O tratamento surtiu tanto efeito em seu organismo que, hoje, oito anos depois, ela revela ao R7 com tamanha alegria que está curada do câncer.
A recuperação impressionante de Eny ocorreu com a ajuda de uma terapia que usa medicamentos específicos para o câncer de mama do tipo Her2 positivo, que atinge cerca de 20% das pacientes e que esteja em fase metastática (espalhada para outros órgãos do corpo), segundo explica o oncologista clínico e diretor científico do Instituto Oncoguia, Rafael Kaliks.
— O trastuzumabe, o pertuzumabe, o lapatinibe e T-DM1 podem ser acrescidas à quimioterapia e atuam como um “tratamento-alvo” para esse tipo de câncer. Se você acrescentar apenas uma dessas terapias, isso já dá um salto de sobrevida muito importante, passando de 22 meses [se fosse usada apenas quimioterapia] para 40 meses. Se você conseguir dar duas terapias, a sobrevida passa a 56 meses, em média.
Hoje, o trastuzumabe é oferecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde) apenas para pacientes que estão na fase inicial da doença. Já as mulheres que, como Eny, descobrem a doença em fase metastática, têm direito apenas à quimioterapia.
— Eu tive sorte de estar no lugar no lugar certo e conseguir esse tratamento, mas é triste saber que, mesmo tendo passado tantos anos, nem todas as mulheres têm acesso a ele. Você poder viver mais não tem preço.
O Ministério da Saúde declarou, em nota, que a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) “avaliou que a relação entre os benefícios e os riscos do seu uso é desfavorável e, por esse motivo, sua incorporação não foi recomendada” para a fase metastática da doença.
Medicamento indisponível no SUS daria até 8 anos de vida a pacientes com câncer
Por outro lado, o estudo do qual a paulista Eny participou mostrou resultados diferentes. A pesquisa internacional começou em 2007, no Brasil, no Centro de Pesquisas do Hospital Pérola Byington, sob o comando do chefe do setor de oncologia, Roberto Hegg.
— Esse estudo foi feito com mais de 800 pacientes de câncer de mama Her2 positivo e que apresentaram metástase. Metade do grupo recebeu trastuzumabe e pertuzumabe e a outra metade um placebo. Entre as que receberam as medicações, houve um ganho de sobrevida médio de 56 meses a mais do que apenas com a quimioterapia. É claro que teve pacientes que só tiveram sobrevida de um ou dois anos, mas não teve outra droga até agora que mostrou melhor benefício.
Eny foi diagnosticada com câncer de mama pela primeira vez em 2000, quando ainda estava amamentando a filha mais nova. Ela retirou o seio esquerdo e, após cinco anos de tratamento, teve alta. Em 2006, as dores nos ossos começaram e tornaram-se cada vez mais fortes. Foi quando, ela recebeu a notícia de que estava com metástase.
— Eu não andava mais, estava em uma cadeira de rodas, e tomava morfina para aliviar as dores. Depois que o estudo começou, em poucas semanas, eu já voltei a andar. Fiz quimioterapia por três anos e até hoje tomo as duas drogas [trastuzumabe e pertuzumabe], que não me dão efeito colateral nenhum.
Tratamento de alto custo
Hegg estima que um ciclo de trastuzumabe e pertuzumabe, que é aplicado a cada 21 dias nas pacientes, deva custar entre R$ 7.000 e R$ 8.000, cada medicamento.
O alto valor do tratamento, associado ao fato de que a mulher pode precisar dessas medicações para o resto da vida, contribui para que ele não seja incorporado ao SUS. Porém, admitir que os gastos são um empecilho para a incorporação dessas drogas seria um primeiro passo para negociar e reduzir esses valores, segundo Kaliks.
— O SUS, provavelmente, paga 1/3 do que os convênios pagam para comprar medicamentos. O governo tem 150 milhões de “pessoas asseguradas” e, por isso, conseguiria baixar o preço de maneira muito significativa.
O Ministério da Saúde informou ainda em nota que os hospitais credenciados e habilitados em oncologia pelo SUS “têm autonomia para adquirir as medicações que julgar necessárias para cada caso e serão ressarcidas pelo Ministério da Saúde conforme o código do procedimento registrado no subsistema”.
Mas o médico afirma que isso não acontece na realidade e que, se um hospital decidir fornecer algum medicamento da terapia anti-Her2, ele terá que conseguir uma verba própria para isso.
— É o que acontece no Estado de São Paulo, por exemplo, onde os hospitais conseguem oferecer essa terapia com trastuzumabe para as pacientes a partir de um trato feito com o governo do Estado, que decidiu que iria arcar com esse custo, então, eles conseguem oferecer isso. O que não acontece na maioria dos outros Estados.
*A jornalista viajou a convite Novartis para o Fórum de Pacientes com Câncer de Mama, realizado em Gramado (RS)
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