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R7 Entrevista

‘Nunca imaginei que poderia ganhar tanto’, diz Iryna Ilyashenko, a mulher por trás do sucesso brasileiro na ginástica

Treinadora do Brasil falou com o R7 sobre sua trajetória no esporte, projetos futuros e como inventa movimentos para as ginastas do país

Entrevista|Carol Malheiro*

Iryna Ilyashenko é treinadora da seleção brasileira de ginástica artística desde 1999 Luiza Moraes/COB — 01.08.2024

Iryna Ilyashenko deixou a Ucrânia em 1999 para se tornar técnica da seleção brasileira feminina de ginástica artística. Desde então, a equipe conquistou 23 medalhas em competições internacionais, incluindo as seis medalhas do esporte em Jogos Olímpicos e quatro ouros em Mundiais.

“Quando eu me mudei para cá [Brasil], nunca imaginei que poderia ganhar tanto”, revela a treinadora, em entrevista exclusiva ao R7.

O Brasil, que não conseguia se classificar para os campeonatos de elite internacional, chegou ao topo do mundo. O melhor desempenho da história do time foi em Paris-2024, quando conquistou quatro medalhas, entre elas, o inédito bronze na disputa por equipes e o ouro de Rebeca Andrade no solo.

“Nunca pensei em fazer o que faço por conta de uma medalha olímpica. Eu amo a ginástica, eu quero fazer meu trabalho bem feito. Eu gosto das meninas, eu gosto do movimento, cada movimento que elas fazem com capricho, com beleza, porque para mim a ginástica é uma arte”, diz Iryna.


Devido à Guerra da Ucrânia, ela já não pensa mais em voltar a morar no país onde nasceu. Até porque, há alguns anos, Iryna não tem nem mais parentes na Europa.

Há 26 anos por aqui, a treinadora não vê mais barreiras culturais entre suas duas casas. “Todas as meninas têm o mesmo sangue, choram quando não conseguem, sentem pressão na hora das competições. É tudo igual, mas tem que ter um jeito tanto aqui quanto lá para conquistar as coisas”, fala a técnica.


Ao lado do técnico Chico Porath Neto, Iryna comandou a campanha mais vitoriosa da ginástica em Jogos Olímpicos Miriam Jeske/COB — 28.07.2024

Em 2025, Iryna Ilyashenko está de casa nova. Deixou Curitiba e mudou-se para a metrópole São Paulo. Ela e a também treinadora Carol Molinari acompanham a ginasta Júlia Soares, que agora é atleta do Esporte Clube Pinheiros.

“Recebemos uma proposta muito importante do Pinheiros. Agora, a Júlia tem condição de fazer preparação física na academia, com preparadora especial, com fisioterapeuta, tudo dentro do clube”, comemora.


Julia chamou a atenção nas Olimpíadas na prova da trave, quando ela fez uma entrada espetacular no aparelho, executando o movimento que levou o nome dela. A ideia do elemento foi de Iryna.

“Assisto a vídeos antigos, ginástica antiga, analiso elementos e invento outros. Aí surge a ideia e tentamos novos movimentos. Tentei mais difícil, mas por enquanto ainda não deu. Mas vou ver se ela consegue”, conta.

Confira a entrevista na íntegra:

R7 - A Júlia surpreendeu nas últimas Olimpíadas na prova da trave, com aquela entrada especial. O que a gente pode esperar da Júlia daqui para frente?

Iryna- A Júlia é uma ginasta talentosa, tem um nível técnico alto. Ela teve um rendimento baixo porque precisava se recuperar, precisava voltar ao ritmo. Agora ela está voltando. O nosso plano é melhorar um pouco na dificuldade da trave, principalmente, no solo e na paralela para ela poder disputar o individual geral e dar um suporte para a equipe em todos os aparelhos.

Iryna Ilyashenko e Júlia Soares comemoram medalha de bronze nas Olimpíadas de Paris em 2024 Reprodução/Instagram/@juju_bsoares

R7 - A entrada da Júlia é o movimento batizado com o nome dela, o “Soares”. A ideia de criar um movimento normalmente é do atleta ou da treinadora?

Iryna - Claro que sempre por trás de todos os movimentos da atleta tem um treinador, responsável por fazer um programa de aprendizagem, inventar elementos. Então, claro que não foi ideia da Júlia. Mas isso é um regulamento, quem fez primeiro o movimento foi a Júlia, então, tem o nome dela.

R7 - E como surgiu a ideia de criar o “Soares”?

Iryna - Eu invento muitos exercícios diferentes na preparação física. Eu assisto a vídeos antigos, ginástica antiga, analiso elementos e invento outros. Aí surge a ideia, tentamos novos movimentos. Tentei mais difícil, mas por enquanto ainda não deu. Mas vou ver se ela consegue.

R7 - Faz diferença na hora das notas esses movimentos novos?

Iryna - Claro, eu acho que cada elemento original dá outra impressão da ginasta. A arbitragem presta atenção porque tem muitas séries parecidas. Quando a ginasta vem com um novo elemento, dá uma impressão diferente e os árbitros olham com outros olhos.

Iryna Ilyashenko cria os movimentos originais a partir do estudo de vídeos atuais e antigos de ginástica Miriam Jeske/COB — 28.07.2024

R7 - A preparação para Los Angeles em 2028 já começou. Como está sendo a rotina de treinamentos?

Iryna - Por conta da mudança de clube e de cidade, acho que primeiro a Júlia tem que se adaptar ao novo centro de treinamento. Conhecer a estrutura, as meninas, os médicos. Ela precisa de um tempo para se adaptar e pensar que a casa dela agora é São Paulo. Mais para frente, começamos uma rotina mais intensa. Vamos passar um tempo no Centro de Treinamento no Rio de Janeiro.

R7 - A Rebeca Andrade afirmou que não vai disputar o solo em 2028. Como você, enquanto treinadora, lida com o desgaste físico dos atletas para as competições?

Iryna - Infelizmente, quando as ginastas já têm idade, isso gera muito impacto na carreira, tanto físico quanto mental. A Rebeca passou por três ciclos olímpicos. É muito, porque cada Olimpíada parece um pico que você sobe, dá todo o seu melhor, e depois da competição, você tem uma queda muito baixa. Rebeca já subiu três vezes.

Para mim, esse já é um recorde. Acho que ela tem que se poupar, tem três cirurgias no joelho. Ainda assim, a presença da Rebeca em alguns aparelhos dá muito suporte para a equipe. Talvez em Los Angeles não seja para medalha olímpica, mas para ajudar a equipe.

Rebeca Andrade celebra medalha de ouro no solo nas Olimpíadas de Paris em 2024 Reprodução/Instagram/@cbginastica

R7 - E em relação ao desgaste mental do atleta?

Iryna - O desgaste mental é um peso na ginástica. Mas tem psicólogo na equipe da seleção brasileira, o que diminuiu um pouco o horário no ginásio, o que é bom para o descanso. Para mim, é importante diminuir um pouco a intensidade de alguns dias para a ginasta se recuperar.

R7 - Quando você chegou aqui, a ginástica não era um esporte tão popular no Brasil quanto é hoje. Você sente que aumentou o interesse das pessoas em praticar a ginástica?

Iryna - Aumentou muito. Quando eu cheguei, a ginástica brasileira não era visível, porque tinha uma equipezinha em um campeonato ou outro. Tinha algumas ginastas aparentes, como a Soraya Carvalho. Depois teve a Daniele Hipólito, mas era uma das únicas ainda. Depois cresceu com o surgimento da Daiane dos Santos. E agora com essa leva de Rebeca, Flávia, Jade, e vem a Júlia, aí deu uma melhorada.

R7 - Se você pudesse treinar qualquer esporte sem ser a ginástica, qual seria?

Iryna - Eu adoro a ginástica rítmica. Gosto dos saltos ornamentais também. A minha irmã fazia saltos ornamentais, eu achava muito parecido com a ginástica. Nado sincronizado, tudo mais próximo da ginástica artística, acrobático, eu gosto.

R7 - Quais são suas expectativas para o futuro da ginástica no Brasil?

Iryna - Tem muitas crianças que ficam na lista de espera para entrar no ginásio. Se você tem mil crianças, 30 serão escolhidas para o esporte de alto nível. De 30, duas vão ser Rebecas, Flávias. Mais cinco Júlias, mais três Jades, já está ótimo. E tomara que seja assim.

* Estagiária do R7, sob supervisão de Carla Canteras.

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