Não mereço ser preso!
Essa semana um telespectador se revoltou comigo. E se irritou, simplesmente, por não concordar com a notícia que eu dei. Fui acusado de ser irresponsável e, ainda, ameaçado: "Você será cobrado!"
Conversa de Repórter|LUCAS CARVALHO, do R7 e Lucas Carvalho
A conversa, hoje, vai ser franca. Quase um desabafo. Não tem a ver com os bastidores da reportagem, mas, ainda assim, é sobre o que acontece por trás das câmeras. As redes sociais se tornaram um território hostil para jornalistas. Os colegas que cobrem política são a bola da vez. Estão no olho do furacão. Independentemente do lado que esteja, quem ataca, geralmente, não debate. Simplesmente, bate.
Raramente, faço pautas que não sejam de assuntos policiais. O Balanço Geral Manhã é um programa com essa pegada. São histórias, igualmente, sensíveis que, dependendo da situação, também nos colocam em conflito, risco ou perigo. Eu já fui confrontado e ameaçado na rua. Geralmente, é no calor do momento, quando alguém se sente incomodado com a presença da imprensa.
Nas redes sociais, quase nunca recebo mensagens ameaçadoras. Mas, essa semana um telespectador se revoltou comigo. E se irritou, simplesmente, por não concordar com a notícia que eu dei. Entende? Ele não discordou de uma opinião. Ele me confrontou porque não gostou de me ver noticiando um assunto que não é do seu agrado.
A mensagem veio por direct numa rede social. Não perdi tempo respondendo, mas passei os últimos dias pensando no teor de cada palavra direcionada a mim e nas acusações que sofri. Vou explicar o contexto.
O assunto era o início da vacinação de crianças contra a Covid-19. Aqui, não pretendo entrar no mérito da questão. A minha reflexão é outra. Gravei uma reportagem, para o Fala Brasil, sobre o começo da aplicação em dez capitais brasileiras. Exibimos, com autorização dos pais, o depoimento de crianças que receberam as doses. Se elas e os responsáveis estavam ali, no posto de saúde, é porque concordavam com a vacinação.
Logo em seguida, entrei, ao vivo, com a atualização do início da campanha numa unidade básica de saúde, em São Paulo. Novamente, apenas apresentei dados. Inclusive, mostrando que a movimentação ainda estava bem tímida.
Pouco tempo depois, recebo a seguinte mensagem.
Sem brincadeira. Eu devo ter lido esse texto umas dez vezes. Coincidentemente, foi no mesmo dia em que a imprensa noticiou que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal havia rejeitado uma ação que pedia a prisão do apresentador William Bonner. A solicitação foi feita por um advogado que alegou que o jornalista fazia parte de uma “organização criminosa” em prol da vacinação contra a Covid-19. Gente!
No meu caso, ainda ninguém pediu pra me prender, mas fui acusado de ser irresponsável por "fazer o jogo dos políticos corruptos". Também fui acusado de "mandar e induzir crianças a dar depoimentos". E ameaçado: "Você será cobrado!"
Não é de hoje que as coisas andam meio fora do lugar, mas jornalista ser atacado por cumprir o seu papel, que é o de informar, me parece loucura. Alguém discordar de uma opinião – por mais controverso que o pensamento possa ser – ainda caminha dentro do contexto da liberdade de expressão. Mas, não é o caso. Jornalistas estão sendo encurralados, sobretudo nas redes sociais, por gente que discorda da notícia. Gente que "ouviu dizer no zap", no Facebook ou no Instagram que isso é certo e aquilo é errado.
Sinceramente, não sei onde isso tudo vai chegar. Mas, certamente, essas constantes investidas contra jornalistas, de pessoas que pintam, cotidianamente, a imprensa como um inimigo a ser combatido, só tornarão o ambiente mais tóxico e o debate público empobrecido. Nessa guerra desnecessária, não haverá vencedor.
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