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Sua família não reconhece seu valor? Saiba por que “santo de casa” não faz milagre

Veja por que é tão difícil que amigos e parentes valorizem seu trabalho e prefiram pagar outros profissionais

Todos os Blogs|Patricia LagesOpens in new window

Por que é mais fácil obter reconhecimento de pessoas estranhas?

Hermógenes nasceu em uma família pobre da periferia do Rio de Janeiro, filho de um vendedor ambulante e de uma empregada doméstica. A mãe fez questão de chamá-lo assim depois que ouviu o patrão dizer que era nome de filósofo, descendente de Hércules – embora ela não soubesse o que é filosofia e confundisse o ser mitológico com Sansão, o personagem bíblico enganado por Dalila. Ela dizia a todos que jamais deixaria qualquer mulher fazer isso com seu pequeno “Mógi”.

A família acordava cedo e seguia a mesma rotina santo dia: deixar Mógi na casa da única avó e enfrentar mais de uma hora de condução do Méier a Copacabana. O pai passava o dia na praia vendendo bijuterias artesanais, enquanto a mãe trabalhava no edifício mais icônico do Rio, bem ao lado de um dos hotéis mais famosos do mundo.

Apesar de tudo, o menino teve uma infância feliz, brincando na rua sem medo de bala perdida. Empinava pipa na laje da avó, andava nas bicicletas emprestadas dos vizinhos e, como estava sempre com fome, dava um jeito de lanchar na casa de algum amigo.

Depois da morte da avó, a mãe pediu demissão por não ter com quem deixá-lo, mas o patrão não aceitou ficar sem seus serviços. Ele deu um jeito de matricular o menino na escola municipal mais próxima e permitia que ele ficasse com a mãe, desde que não atrapalhasse o trabalho.


Mas Mógi preferia ficar com o pai na praia, ajudando a vender suas bijuterias. O sonho de comprar uma bicicleta levou o menino fazer pulseiras de miçangas que, com o passar do tempo, foram ficando mais elaboradas e se tornaram os itens mais vendidos. Como a vida não era fácil, a família precisava do dinheiro e a bicicleta ficou apenas nos sonhos.

A agilidade manual do menino impressionou o patrão da mãe que, sendo um dentista renomado, lhe deu um kit de instrumentais odontológicos para facilitar a confecção das pulseiras. Mógi se mostrou ainda mais habilidoso, sua desenvoltura com as mãos era realmente incrível. Mais tarde, o patrão passou a levá-lo para a clínica e fez dele seu assistente. Com muito trabalho e estudo, Mógi seguiu os passos de seu mentor, cursou odontologia e tornou-se um excelente cirurgião.


Certo dia, relembrando a vida difícil no Méier, o Dr. Hermógenes teve a ideia de abrir parte da agenda de sua clínica, em Copacabana, para atender pacientes que jamais poderiam pagar por seus serviços. Os primeiros convidados foram seus colegas de bairro, que receberam um folheto com a foto do doutor e a chamada: “Tratamento de qualidade para todos a custo zero. Agende seu horário!” Mas para sua surpresa, nenhum agendamento foi feito. Nenhum amigo, nenhum parente. Ninguém.

Ele até descobriu que sua tia Esmeralda pagou para arrancar um dente com o farmacêutico do bairro em vez de fazer o tratamento de canal que ele ofereceu gratuitamente. Ela alegou que “aquilo não tinha jeito”, que a dor era imensa e que a clínica do sobrinho era “fora de mão”. Mas a questão era outra...


A verdade é que todos o viam como ele havia sido um dia e não como a pessoa que ele veio a se tornar.

Para seus amigos, parentes e ex-vizinhos, ele não era o Dr. Hermógenes, “dentista das celebridades”, mas sim, o filho da empregada e do camelô, o menino que “filava boia” na casa de todo mundo, que andava nunca teve uma bicicleta e que precisou trabalhar desde cedo para ajudar a família a pôr comida na mesa. O menino Mógi tirava toda autoridade do famoso Dr. Hermógenes, o que o deixou arrasado. “De que adiantou tudo isso?”, questionava a si mesmo como um garotinho assustado.

Foi preciso um certo tempo para que ele entendesse que Mógi não existia mais e que aquele menino havia se tornado alguém diferente. Não havia nada de errado com ele, mas sim, com a maneira como as pessoas o viam. Era muito difícil para aquelas pessoas compreenderem que alguém que vivia como eles – e até em condições financeiramente piores – podia mudar de vida tão radicalmente. Foi então que, em vez de desistir, o doutor levou seu projeto social a outras periferias, onde a adesão de pessoas totalmente desconhecidas foi imediata e massiva.

Há pessoas que sempre nos verão como fomos e não como quem nos tornamos, porém, não devemos permitir que elas nos confundam e nos façam abandonar quem somos para vivermos presos em quem não existe mais. Muitas vezes, nosso crescimento pessoal, profissional e espiritual depende da distância que tomamos de certas pessoas e de certos ambientes.

“Jesus lhes disse: ‘Só em sua própria terra, entre seus parentes e em sua própria casa, é que um profeta não tem honra’.” – Marcos 6.4

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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