'Devem criar não só canais de comunicação como também de participação'
Tuca Vieira / Folhapress / 26.06.2018A pesquisa “Viver em São Paulo: Qualidade de Vida”, publicada pela Rede Nossa São Paulo, apontou a pouca participação dos habitantes na vida política da capital paulista, evidenciada por 63% dos entrevistados que não se lembravam dos vereadores em que votaram, ou dos 91% que disseram não ter participação das atividades na Câmara Municipal.
Mas, para Rosemary Segurado, cientista política e professora da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) e da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), o resultado indica falhas do poder público em se comunicar com a população.
“É sempre muito pequena a participação das pessoas. Isso mostra a insuficiência dos canais criados pelas instituições”, afirma Segurado.
Na avaliação da professora, a prefeitura e suas sedes regionais deveriam estimular e investir nos canais de comunicação com os cidadãos paulistanos – 57% dos entrevistados, por exemplo, afirmaram não participar da vida política da cidade. “Por exemplo: colocar o telefone da Câmara e dizer para as pessoas ligarem e mandarem opiniões não é o suficiente. Claro que não”, afirma ela, que prossegue:
“Devem criar não só canais de comunicação como também de participação. Fazem audiências públicas no meio da semana, durante a tarde. Quem pode ir?”
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Rosemary considera que o poder público tem dificuldade para criar esses canais. “Acredito que nem tenham essa vontade. Porque, se abre o canal para a população participar, talvez o povo diga coisas que não querem ouvir”, avalia a cientista política, que diz que o Brasil já possui uma trajetória de pouca participação política ativa – “não foram canais efetivos de linhas abertas à cidade”, considera.
É preciso ter atenção com outsiders
Um dos destaques da pesquisa da Rede Nossa São Paulo foi o baixíssimo número de pessoas que consideram ser importante que um candidato seja “outsider”, ou seja, novo na política – 5% para prefeitos e, para vereadores, 6%.
Relembrando o caso de João Doria, eleito prefeito e governador nas eleições de 2016 e 2018 com o perfil de debutante na esfera política, Segurado contrapõe as baixas porcentagens no estudo e acredita que a procura por outsiders em São Paulo e no país deve ser maior nos próximos anos.
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A professora acredita que, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, houve um perigoso processo de criminalização dos políticos, intensificado nos últimos anos: “Quando se criminaliza políticos e partidos, se criminaliza a política também. E isso é perigoso porque afasta a população do tema e se cria uma desinformação e deseducação política”. Para ela, há quem se aproveite da situação como estratégia. “Temos um presidente eleito que demoniza política e políticos, mas foi deputado por 28 anos. Ele sabe que esse discurso funciona”, diz.
Outros dados
Os paulistanos ouvidos pela pesquisa avaliaram que "conhecer bem os problemas da cidade" e "ter visão de futuro" são as duas características principais para confiar o voto a um candidato.
Aproximadamente um quinto (21%) dos ouvidos assina petições ou abaixo-assinados, e 9% afirmaram que participam de manifestações e protestos.
Nas duas possibilidades de voto, "ter pulso firme" (34% para prefeitos e 28% para vereadores) e "preservar os valores familiares" (28% e 23%) superam "ter uma trajetória na política" (14% e 12%).
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Além disso, dos entrevistados pela pesquisa, 64% disseram que, se pudessem, se mudariam da capital paulista.
“Se tivéssemos em São Paulo formas de intensificar a participação, canais ativos com a população e, por exemplo, um subprefeito se disponibilizando para conversar com a população, avisando onde estaria, as coisas seriam diferentes”, diz Segurado.