Com as contas do País no vermelho, o Congresso concluiu nesta terça-feira (9) uma mudança na lei orçamentária de 2014 (apelidada pela oposição de “manobra fiscal”) que altera a forma como será calculado neste ano o superávit primário — a poupança que o governo faz para pagar os juros de sua dívida. Para as contas do Brasil, no entanto, a mudança não terá nenhum efeito prático. Com ou sem essa manobra, a dívida brasileira irá aumentar por uma razão bem simples: o governo gastou mais do que arrecadou.
De janeiro a outubro, o rombo do governo central (Tesouro, Banco Central e Previdência Social) foi de R$ 11,55 bilhões negativos — vale ressaltar que a meta seria economizar R$ 116,1 bilhões.
Para reverter esse quadro e fechar o ano com as contas aprovadas, o Palácio do Planalto mobilizou o Congresso e aprovou uma regra que vai considerar os gastos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e das desonerações tributárias como parte do superávit primário (VEJA OS GASTOS ABAIXO).
A solução, no entanto, só vai impedir o Planalto de ter problemas com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Para as contas, como explica o professor de finanças do Ibmec/RJ Gilberto Braga, a situação é semelhante a pagar o mínimo na fatura do cartão de crédito. Como o País não terá todo o dinheiro para pagar a dívida, será preciso refinanciá-la.
— Apenas a mudança no cálculo da meta fiscal não implica em pagar mais ou menos juros. Só implica não ficar fora da Lei de Responsabilidade Fiscal. No entanto, se o Brasil não pagar os juros da dívida, será como uma bola de neve. Por isso, é importante ter uma estratégia de pagamento da dívida pública.
A seguir, tire suas dúvidas sobre as principais questões que envolvem a revisão da lei orçamentária de 2014.
O que é superávit primário e déficit primário?
O “resultado primário” é a diferença entre receitas e despesas do governo, excluindo-se da conta as receitas e despesas com juros. Os dados consideram os gastos do governo com salários, investimentos, obras, programas sociais, entre outros, enquanto a receita são os impostos e recebimento de dívidas, por exemplo.
Caso essa diferença seja positiva, tem-se um “superávit primário”; caso seja negativa, tem-se um “déficit primário”. O superávit primário é uma indicação de quanto o governo economizou ao longo de um período de tempo com objetivo de pagar os juros sobre a sua dívida. O resultado negativo indica que o governo teve de se endividar para poder cumprir com seus compromissos.
Com o déficit primário, os juros não pagos de dívidas anteriores se somam à atual dívida — ou seja, fica maior a dívida pública.
Por que é preciso fazer economia para pagar os juros da dívida?
Assim como um consumidor que usa o cartão de crédito, se o governo não pagar os juros da dívida, ela aumentará. Neste ano, o Brasil já pagou mais de R$ 258 bilhões em juros, segundo a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
O que é essa manobra fiscal?
O governo enviou uma lei ao Congresso para considerar os investimentos feitos pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e as desonerações tributárias concedidas neste ano como parte do superávit primário. Sem essa mudança, o Brasil provavelmente não ficaria com as contas no azul e estaria ilegal, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por que o governo fez as desonerações tributárias?
Segundo o professor de economia do Mackenzie Agostinho Celso Pascalicchio, as desonerações tinham a intenção de reduzir os custos da produção, estimular setores específicos da economia e diminuir a pressão da inflação.
No entanto, as medidas não atingiram o objetivo, já que o PIB (Produto Interno Bruto) deste ano terá um crescimento muito baixo e a inflação continua acima do teto da meta.
Braga, do Ibmec/RJ, afirma que as desonerações até poderiam ter efeitos positivos, já que o governo abre mão de receber um valor agora para compensar a arrecadação no futuro. Mas, como o governo continua gastando muito, entra em um círculo vicioso: o governo deixou de arrecadar com as desonerações, mas empresas e consumidores produziram e consumiram menos, então, ao final, o governo não teve a arrecadação de volta.
Como fica a credibilidade do País para os investidores?
Péssima, segundo Braga. O professor diz que a manobra fiscal para fechar as contas deste ano traz certa insegurança contratual, especialmente para o investidor estrangeiro.
— Mudar a regra no meio do jogo faz com que o investidor não tenha confiança no pagamento da dívida.
Como fica a dívida do Brasil no futuro?
Pascalicchio afirma que serão necessários pelo menos dois anos para corrigir o superávit do País. Ele lembra que, além de pagar os juros da dívida, o governo precisará levantar dinheiro para financiar as obras do PAC. Com essa manobra fiscal, diminui a credibilidade do País e aumenta o risco Brasil. Com isso, os empréstimos no futuro ficarão mais caros.
Braga diz que será preciso cerca de um ano e meio para arrumar a casa, mas que a próxima equipe econômica tem anunciado metas que tornaria desnecessário o uso dessa mesma manobra nas contas de 2015. Isso seria positivo para controlar a dívida.
Quer fazer compras online? Use o R7 Ofertas