Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Publicidade

Conheça a 'agonia' de um falso 'pai tranquilo' no primeiro Enem da filha

"O afeto não deveria ser traiçoeiro a ponto de romper o limite entre o apoio carinhoso e o impulso de querer ‘fazer’ prova para filho. Mas é", diz jornalista

Educação|Eduardo Marini, do R7

Mais de 5,9 milhões de estudantes devem fazer a prova neste domingo (3)
Mais de 5,9 milhões de estudantes devem fazer a prova neste domingo (3) Mais de 5,9 milhões de estudantes devem fazer a prova neste domingo (3)

A edição 2019 do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem, tem exatas cinco milhões, noventa e cinco mil, trezentas e oito inscrições confirmadas. Nas últimas semanas, as atribuições e obrigações do jornalismo acabaram por incluir, em tese, todos eles na rotina de trabalho.

Mas, neste ano, a cada retorno do R7 para casa, a cada “troca diária de chip” de jornalista para o de pai, ao final da jornada, o coração e a mente trocaram, compulsoriamente, toda a legião por um único representante desse mundaréu de bravos.

Melhor: uma. Isadora Morena Pedrozo Rosa Marini, inscrição 191 e mais um montão de números, nove se contei bem, é Isa, minha ‘menininha’ de 1,79 metro de altura às portas dos 17 anos. Em busca de uma vaga no curso de Direito, ela fará pela primeira vez o Enem, depois a Fuvest e, em seguida, outros dois vestibulares de universidades privadas.

Sou exemplo de pai rigorosamente tranquilo quando o assunto é educação de filho – obviamente na avaliação de todo pai rigorosamente intranquilo quando é educação de filho.

Publicidade

Para eles, os ‘menininhos’, deve ser de uma chatice amazônica encarar, nesses períodos, um desses cidadãos que, sentindo-se autorizados por duas ou três décadas a mais de vida e trajetória, entopem seus e-mails e whatsapps com dicas, procedimentos, reportagens, provas, alertas e exercícios sem qualquer limite ou constrangimento. Assim, nada obrigatório, só para ajudar, é claro, percebem?

O afeto não deveria ser traiçoeiro a ponto de levar um pai como eu a atravessar, com alguma reincidência, o limite entre o apoio carinhoso e a impulso de querer ‘fazer’ a prova para o filho. Mas é.

Publicidade

O cidadão aqui é daqueles que pergunta a um adolescente, em um domingo de sol de rachar catedral, se ele não quer “dar uma olhadinha com o pai em alguma matéria”. Está entre os que mandam mensagens para as amigas da filha ‘sugerindo’ que elas estudem juntas. E também em meio aos traídos pelo impulso que perguntam, antes de tudo, “como estão os estudos?” – e recebe de volta um preciso e justificado “bom dia”. Bem feito. Ah, meu Deus... 

“Pai, você mandou essas provas e orientações umas quatro vezes”. Desculpe-me, filhota. “Por que imprimiu duas vezes o Cartão de Confirmação? Não basta um?”. Foi mal, filhota. “É claro que reservei o documento”. Então está ótimo, filhota, mas... só para você não esquecer: cópia do documento não vale, nem autenticada, só original com foto. “Tenho canetas pretas transparentes, pai, umas três...”. Ok, filhota. “É claro que vou desligar o celular, se tocar durante a prova poderá me eliminar”. Perdão, filhota...

Publicidade

Neste domingo (3), data da primeira prova do Enem, levarei Isa até o local, mas não poderei aguardar o final. As ações do plantão do nosso R7 estarão me esperando. Ela contará com a companhia e o apoio luxuosos da mãe na saída.

Mas no domingo seguinte, dia 10 de novembro, data da segunda e última etapa, aí ninguém vai me segurar. A única coisa certa para mim até agora, neste segundo domingo, é que estarei lá, na calçada, esperando minha ‘menininha’.

E talvez lembrando, como agora, do costume de mães e pais chineses de mergulhar em pedidos religiosos enquanto esperam os filhos nos portões dos locais de prova no Gaokao, o maior ‘Enem’ do mundo (o brasileiro é o segundo). Na China, até o som das lojas, sirenes e eventos públicos são interrompidos durante a avaliação para não atrapalhar os adolescentes.

Ou me recordando da alegria da minha mãe, professora, não mais entre nós (Isa se chama também Morena por causa do apelido dela) em momentos como esse, no passado, comigo e também com meus dois irmãos.

Se porventura eu der uma amolecida básica não terá problema: dessa vez Isa estará devidamente protegida dos impulsos e da emoção do pai rigorosamente intranquilo na cadeira da prova. Ufa. Sucesso, minha menina. Sucesso, milhões de menininhos.

Últimas

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.