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Mais de 11 milhões de crianças de até 5 anos ainda não tomaram a vacina da pólio no Brasil

Baixa adesão à campanha nacional de imunização acende alerta para os riscos do retorno da paralisia infantil, principalmente em grupos com alta vulnerabilidade social

Saúde|

Apenas 22,1% do público-alvo da campanha recebeu a vacina
Apenas 22,1% do público-alvo da campanha recebeu a vacina Apenas 22,1% do público-alvo da campanha recebeu a vacina

A menos de duas semanas do fim da campanha nacional contra a poliomielite, mais de 11,1 milhões de crianças ainda não receberam a vacina contra a doença. Conforme o Ministério da Saúde, houve cerca de 3,174 milhões de aplicações até segunda-feira (29) — só 22,1% do público-alvo.

Diante disso, médicos alertam para os riscos de volta da paralisia infantil perante o registro de novos casos no exterior, incluindo países como Estados Unidos e Israel.

Lançada pelo governo federal em 8 de agosto, a mobilização vai até 9 de setembro e pretende atingir cobertura de 95% ou mais do público. Cerca de 14,3 milhões de crianças devem ser vacinadas, segundo informe técnico da campanha feito pelo ministério.

No estado de São Paulo, a cobertura contra pólio segue a tendência nacional (21%), segundo o último balanço do governo paulista, da última sexta-feira (26).

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Segundo especialistas, entre os motivos para a baixa procura estão a pandemia, dificuldades dos pais que trabalham de levar os filhos aos postos de saúde, baixa percepção de risco diante do longo período sem casos da doença e falta de campanhas mais intensas do governo federal. Fake news (informações falsas) sobre insegurança ou ineficácia dos imunizantes também atrapalham.

A pólio, ou paralisia infantil, é altamente contagiosa. Atinge principalmente crianças com menos de 5 anos e que vivem em alta vulnerabilidade social, sobretudo onde não há tratamento de água e esgoto adequado.

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O poliovírus (vírus causador da doença) é transmitido de pessoa para pessoa por via fecal-oral ou por água ou alimentos contaminados, e também de forma oral-oral, por meio de gotículas expelidas ao falar, tossir ou espirrar.

O vírus ataca o intestino, mas pode chegar ao sistema nervoso e provocar paralisia irreversível nas pernas e demais membros, e também dos músculos respiratórios, o que pode levar à morte. A poliomielite não tem cura, apenas prevenção, que é feita com a vacina oferecida pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

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O esquema vacinal contra a poliomielite consiste na administração de três doses iniciais. A VIP (vacina injetável) de vírus inativado é disponibilizada para os bebês aos 2, 4 e 6 meses de vida. Depois, como reforço, são administradas duas doses adicionais de VOP (vacina oral): uma quando a criança está com 15 meses e a outra quando tem entre 4 e 5 anos.

Há também vacina injetável indicada para pessoas de até 19 anos ou para situações especiais, como indivíduos imunocomprometidos. A força-tarefa de vacinação vai até 9 de setembro, mas é possível se vacinar nos postos de saúde depois dessa data.

Baixa procura

A baixa procura pela vacina não é novidade se comparada com os anos anteriores. Conforme números do DataSUS, o Brasil não ultrapassa a linha de 90% de crianças protegidas com a vacina inativada — administrada de forma injetável em bebês com menos de um ano completo — desde 2015.

Ou seja, há sete anos que o país não consegue cumprir com o objetivo de imunizar 95% ou mais do público-alvo da doença.

Segundo especialistas, a pandemia da Covid-19 e a quarentena imposta para frear a transmissão do vírus derrubaram ainda mais as taxas de imunização infantil. Em 2021, por exemplo, o índice de bebês vacinados ficou abaixo dos 70%.

Risco de retorno

O problema fez a Opas (Organização Panamericana de Saúde), braço da OMS (Organização Mundial da Saúde), inserir o Brasil no grupo de países da América Latina que correm o risco de voltar a apresentar casos se a vacinação não tornar a crescer.

O último caso registrado de poliomielite no Brasil foi em 1989. A OMS reconheceu, em 1994, que o país conseguiu eliminar o vírus em todo o território nacional. Mesmo sem o país registrar infecção há mais de 30 anos, especialistas advertem que a vacinação é necessária porque novas infecções têm sido identificadas nos últimos meses.

Em julho deste ano, os Estados Unidos detectaram uma contaminação por poliomielite depois de 29 anos. O caso foi identificado no Condado de Rockland, em Nova York, e, conforme o Departamento de Saúde do Estado, a infecção pode ter acontecido fora do país.

Também em 2022, Moçambique (em maio) e Malauí (em fevereiro) foram outros dois países que registraram pacientes diagnosticados, bem como Israel, que voltou a ter pacientes contaminados pelo poliovírus depois de três décadas.

Paquistão e Afeganistão, duas das únicas nações endêmicas no mundo e que não conseguiram eliminar o vírus até hoje, documentaram 15 diagnósticos de pólio neste ano, de acordo com a OMS.

Razões para a queda

São várias as razões que explicam a queda na taxa de cobertura vacinal, segundo os especialistas ouvidos pelo Estadão.

Para a pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), os baixos números estão associados a uma menor preocupação das pessoas em relação à doença — uma vez que ela está eliminada no Brasil há quase 30 anos.

Também pesa, diz ela, a falta de prioridade por parte dos gestores públicos e, em alguns casos, dificuldades dos pais em conseguir levar os filhos a um posto de saúde.

"A gente vê o esquecimento. Imagino que nenhum pai de criança menor de 5 anos, hoje, tenha medo que o filho ou a filha pegue poliomielite, porque é passado", afirma. Além disso, destaca, nem sempre os pais têm disponibilidade para levar os pequenos ao posto de saúde para receber as doses necessárias.

"O Brasil tem 38 mil salas de vacinação. Mas o que é falta de acesso? É uma mãe sair de casa com seis filhos, sendo que um só tem de tomar a vacina. Ela chega ao posto e o local está fechado porque na parte da manhã os profissionais da sala de aplicação estão colhendo sangue. E aí? Essa mãe volta?", exemplifica a médica.

Ela entende, porém, que não foram só as famílias que deixaram de dar prioridade à doença e que uma comunicação "muito enfática" por parte do Ministério da Saúde faria a diferença para despertar novamente o interesse das pessoas pela vacinação. "Falta priorização da parte dos políticos e dos gestores."

Em resposta, o Ministério da Saúde diz que "reforça a importância da vacinação contra a poliomielite para manter o país protegido de uma doença já erradicada". Afirma ainda que campanha tem sido "veiculada nos principais meios de comunicação e em locais de grande circulação de pessoas".

A pasta acrescentou que trabalha em articulação com estados e municípios para reforçar ações de incentivo à vacinação.

Uma solução, segundo a médica Ester Sabino, é fazer um trabalho de comunicação em massa que aumente a divulgação sobre a importância da vacina.

"À medida em que as pessoas não veem a doença, esquecem", comenta a professora associada do Departamento de Moléstias Infecciosas da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).

Assim como Isabella Ballalai, Ester acredita que as autoridades públicas não realizam campanha sólida de incentivo à imunização e vê "descaso" nos últimos anos.

"Eu me lembro de ver várias propagandas durante um ano inteiro para as crianças se vacinarem. Fica difícil, ainda mais quando se fala um monte de bobagem [sobre a vacinação]. Não é só falar mal, mas não está se falando bem também", acrescenta.

A Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, por sua vez, reforçou o convite para que os pais e responsáveis se dirijam aos postos de vacinação para levar os filhos menores de 5 anos para se imunizar contra a pólio.

A Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo afirmou que a cidade vem divulgando a campanha de vacinação de forma constante e por diversos meios, e que os imunizantes estão disponíveis nas UBSs (Unidades Básicas de Saúde) de segunda a sexta-feira.

Além disso, afirma a capital paulista, é feita busca ativa por aqueles que ainda não se vacinaram em parceria com a Secretaria de Educação.

"O retorno da pólio", afirma Isabella Ballalai, "além de ser um retrocesso, significa também alto risco para nós, e principalmente para as crianças. Mas lembrando que, apesar de a doença ser mais comum nas crianças, o risco também é grande nos adultos", alerta.

Na segunda-feira (22), a SBIm, que tem Isabella como vice-presidente, lançou a campanha "Paralisia infantil — a ameaça está de volta" com o objetivo de estimular a procura pelo imunizante por parte do público-alvo tanto por meio da campanha do Ministério da Saúde, como também pela vacinação de rotina, que está disponível de forma gratuita pelo SUS.

Multivacinação

Junto com a campanha de vacinação contra a pólio, o Ministério da Saúde promove campanha de multivacinação, que também começou no último dia 8 de agosto e se encerra em 9 de setembro. A mobilização oferta 18 imunizantes que integram o Calendário Nacional de Vacinação para crianças e adolescentes e que são aplicados em postos de saúde municipais.

Veja a lista abaixo:

• hepatites A e B;

• penta (previne contra difteria, tétano, coqueluche, meningite causada pela bactéria Haemophilus influenzae tipo b, e hepatite B);

• pneumocócica 10 valente;

• VIP (vacina inativada poliomielite);

• VHR (vacina rotavírus humano);

• meningocócica C (conjugada);

• VOP (vacina oral poliomielite);

• febre amarela;

• tríplice viral (previne contra sarampo, rubéola, caxumba);

• tetraviral (previne contra sarampo, rubéola, caxumba e varicela);

• tríplice bacteriana ou DTP (previne contra difteria, tétano e coqueluche);

• varicela; e

• HPV quadrivalente (papilomavírus humano).

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