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Empresas definem teto até onde o negro pode crescer, diz consultora

Psicóloga da EmpregueAfro, com 9 mil candidatos em seu banco de talentos, conta que lida diariamente com preconceitos velados ou mesmo declarados

Brasil|Marcos Rogério Lopes, do R7

EmpregueAfro tenta reduzir dívida social histórica
EmpregueAfro tenta reduzir dívida social histórica EmpregueAfro tenta reduzir dívida social histórica

Camila Adriano de Oliveira Lima se orgulha de um trabalho que, na verdade, preferia que não existisse, que não fosse necessário. Ela é psicóloga e consultora sênior de Recursos Humanos (RH) da EmpregueAfro, uma empresa que tenta corrigir uma falha na maneira como vários empregadores se comportam quando há candidatos a vaga negros.

Fundada em 2004, a consultoria de RH tem hoje 57 empresas parceiras e mais de 9 mil pessoas inscritas em seu banco de talentos. A EmpregueAfro une jovens profissionais que normalmente passam por filtros ainda mais apertados que a juventude em geral a companhias que procuram não pagar uma dívida histórica do Brasil com a raça negra, mas tentam ao menos não contribuir para que ela aumente.

"A gente vai a locais com poucos ou nenhum funcionário negro e tenta evitar que o candidato se iniba por causa disso ou por qualquer outra cobrança e comentário que possa surgir", diz Camila. Ela explica que é muito desconfortável se sentir em uma seleção na qual parece que você está sempre um passo atrás dos outros concorrentes.

Não aconteceu com ela, mas sabe de casos de amigos que foram descartados de vagas apenas pela cor de suas peles. "Já me falaram, por exemplo, que, 'apesar de eu ser negra, eu era muito bonita'. E isso também é humilhante."

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Camila: 'Muito trabalho a ser feito'
Camila: 'Muito trabalho a ser feito' Camila: 'Muito trabalho a ser feito'

Ouvindo Camila a gente descobre que o termo racismo talvez seja melhor que a palavra falha, usada no primeiro parágrafo e amena demais para qualificar situações claras de discriminação por causa de cortes e tamanho de cabelos ou de preconceitos de chefes que se espantam quando descobrem que aquele rapaz ou moça a sua frente é qualificado profissionalmente e tem bom nível educacional. "As pessoas pensam que todo negro mora longe, em comunidades, e não tem experiência", lamenta a psicóloga. 

"Sem contar que mesmo as que estão em lugares mais afastados muitas vezes têm perfil de competências e emocional superiores à maioria", complementa.

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Camila diz que é comum o espanto (e talvez esse também seja um eufemismo) de gerentes e responsáveis por departamentos quando descobrem que o candidato fala uma segunda língua estrangeira ou tem um MBA.

A EmpregueAfro é contratada por departamentos de RH que buscam ações afirmativas, que entendem a necessidade de estimular a diversidade e coibir as discriminações. Porém, o trabalho do dia a dia da consultoria, com os responsáveis pelas entrevistas de emprego, se dá com outro público. "Nossos interlocutores são de outros setores, das mais diversas áreas. E é com esses chefes que a gente encontra muita coisa a ser feita."

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A EmpregueAfro se senta com os funcionários das empresas que a contrata antes das entrevistas com os candidatos e explica a importância do público negro, de suas capacidades e fala sobre cores. "A questão vai bem além da tonalidade da pele. Convencê-los a aceitar e valorizar essas pessoas é o nosso trabalho. Fico triste que isso precise ser feito, mas, se é necessário, e é, que bom que existe alguém disposto a fazê-lo."

Os focos da consultoria são, portanto, sensibilizar os representantes das companhias e ao mesmo tempo estimular a autoconfiança dos aspirantes às vagas. "Mas também buscamos profissionais qualificados em redes sociais e por outros meios para oferecer-lhes empregos ainda melhores." 

Para a psicóloga, as pessoas que discriminam escondem isso com piadas, preconceitos velados e falsos elogios. "Se você olhar a quantidade de pessoas da cor negra que ocupam posições elevadas nas empresas você constata que, infelizemnte, considera-se normal atribuir a esse grupo trabalhos menores ou subalternos", afirma. "Muitas empresas definem um teto até onde um negro pode crescer', ele pode até chegar a um cargo mais alto, mas vai ser com mais sofrimento e com grande chance de ter atingido o limite naquela empresa." 

Camila diz que uma dificuldade de sua consultoria é o receio de alguns profissionais que temem ser escolhidos apenas por "cotas". "Não há reserva para negros e deixamos isso claro com as nossas contratantes. Queremos a vaga por merecimento, porque temos certeza que quem escolhermos do nosso banco de talentos tem condições de ocupá-la", finaliza.

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