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Os Incansáveis: artistas consagrados contam os segredos de uma carreira para a vida toda

Estudos globais apontam que a proporção de pessoas com 65 anos ou mais está aumentando mais rapidamente do que aquelas abaixo dessa faixa etária

Economia|Ruth La Ferla e Guy Trebay, do The New York Times

Joan Collins, 90 anos: "Adoro escrever e atuar – subir ao palco e fazer meu pequeno espetáculo solo" (Amy Harrity/The New York Times - 16.02.2024)

Como é a ambição aos 90 anos? Como se explica a motivação que mantém alguém como Giorgio Armani firme, sob o controle total de seu império internacional de moda, agora que se aproxima de sua décima década? Todo dia, a artista Betye Saar se dedica à criação das obras que são amplamente exibidas e que colecionadores e grandes museus procuram avidamente – arte que remonta à sua infância no bairro de Watts, em Los Angeles, durante a presidência de Franklin D. Roosevelt.

Para que se incomodar? A meta da aposentadoria não era uma velhice tranquila? O plano não era começar a praticar bordado ou jogar golfe? Acontece que os idosos representam uma população global que está crescendo depressa: a proporção de pessoas com 65 anos ou mais está aumentando mais rapidamente do que aquelas abaixo dessa faixa etária, de acordo com as Perspectivas da População Mundial, estudo da ONU. Espera-se que, de 2022, quando o relatório foi emitido, até 2050, a população global com mais de 65 anos aumente de dez para 16%. As pessoas já estão trabalhando durante mais tempo e, diante disso, parece que é necessário um plano de ação, uma maneira de entender por que pessoas como Martha Stewart permanecem não só imunes ao envelhecimento, mas também em plena atividade.

Ao longo dos últimos meses, perguntamos o que torna alguém como Stewart aparentemente incansável. Existe uma explicação, além da prosperidade e da saúde boa, para o fato de algumas pessoas terem motivação para perseguir seus sonhos muito depois da idade em que a história recente sugere que deveríamos estar descansando em uma cadeira de balanço?

Os Incansáveis é uma série sobre pessoas cuja ambição não é desgastada pelo tempo. Todas as entrevistas foram editadas e resumidas.

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– Martha Stewart, de 82 anos, sente uma ‘curiosidade inesgotável’ (e se arrepende de algumas coisas).

Este ano, reservei tempo para cultivar os melhores vegetais – aqueles gigantes – que já produzi na minha vida. Minhas casas nunca estão finalizadas. E estou escrevendo minha autobiografia. Esse é o projeto mais assustador, porque não gosto de tudo em mim – o que fui, o que fiz.

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Martha Stewart, de 82 anos: "Este ano, reservei tempo para cultivar os melhores vegetais – aqueles gigantes" (Ysa Pérez/The New York Times)

Acordo às seis e meia da manhã. Minha funcionária doméstica chega às sete e não posso estar na cama quando ela chega – seria muito vergonhoso. De qualquer maneira, não durmo bem. Algumas vezes, prefiro assistir a um documentário. Outras, posso me sentir ansiosa, não por mim, mas pelos meus netos. Se acordo à noite, leio manchetes para garantir que não estamos sendo bombardeados.

Talvez um pouco de incerteza possa ajudar a impulsionar a ambição. Quando deixei meu emprego em Wall Street, sabia que tinha de criar outra carreira. Comecei a oferecer serviços de alimentos e bebidas, e passei a servi-los em festas todas as noites. Mas ainda pensava: “Vai chegar um momento em que vão perguntar à minha neta – ela tem 12 anos: ‘O que sua avó fazia?’ E tudo que ela vai poder dizer é que eu organizava festas para as pessoas. Pensei: ‘Tenho de fazer mais alguma coisa.’ Isso foi na década de 1980, quando escrevi meu primeiro livro, aquele sobre entretenimento.

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Na época, eu não estava envolvida com a casa – mesmo sendo conhecida como dona de casa. Não era suficiente para um casamento. Talvez eu me arrependa de não ter tido mais filhos e do fato de que meu casamento terminou tão abruptamente. Ficamos juntos durante 27 anos, o que era considerado muito tempo. Por isso, quando um casamento longo terminava, era como se alguém tivesse morrido. Talvez tivesse sido bom me casar novamente. Não fiz isso, mas não me importo. Mesmo assim, fico curiosa em relação ao que poderia ter sido.

Minha curiosidade interminável me impulsiona. Vou parar? Isso nem sequer me passou pela cabeça.

Projetos atuais e futuros: autobiografia em andamento; um documentário sobre Martha Stewart ainda sem título, de R. J. Cutler, que dirigiu “The September Issue”, para transmissão na Netflix, em 2024; uma série documental da rede de televisão PBS, “Hope In the Water”, que será lançada em 2024; uma colaboração com a Samsung para uma campanha publicitária de 2023-24; e uma linha de roupas e acessórios para jardinagem em colaboração com a marca French Dressing Jeans a Marquee Brands.

Betye Saar, de 97 anos, está criando algumas das melhores obras de sua vida.

Quem cresceu durante a Grande Depressão aprendeu a ser criativo com o que tinha à mão. No Natal ou no meu aniversário, eu sempre ganhava material de arte e ficava com inveja quando meus irmãos ganhavam uma bicicleta e outras coisas. Agora percebo que meus pais estavam incentivando minha criatividade.

Uma das primeiras influências que me levaram a ser artista foi Simon Rodia. Minha avó morava em Watts e passávamos pelas Torres de Watts quando estavam sendo construídas. Eu ficava fascinada com a maneira como ele usava tampas de garrafas, espigas de milho e pratos quebrados – lixo, basicamente – para fazer arte, para fazer uma coisa bonita. Muito mais tarde, na década de 1970, vi o trabalho de Joseph Cornell, que refinou o uso de materiais, de caixas e de objetos encontrados, e pensei: “Uau, também tenho feito isso.” Eu não sabia que se chamava assemblage, mas fazia sentido para mim e me encaminhou nessa direção como artista.

Betye Saar, de 97 anos: "Quem cresceu durante a Grande Depressão aprendeu a ser criativo com o que tinha à mão" (Kayla James/The New York Times - 09.02.2024)

Acho que o principal desafio nesse campo é ganhar a vida. Mas ser uma pessoa criativa implica ter de encontrar uma maneira de fazer isso. Estudei design na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e, depois de me formar, fiz cartões comemorativos, joias, gravei e vendi minhas gravuras. Dei aulas de arte em universidades de todos os estados do país. Minha criatividade foi evoluindo com minhas necessidades à medida que me casei, comprei uma casa, tive minhas filhas e as coloquei na universidade. Ao longo desse tempo todo, adorei fazer arte. Isso me permitia ir em frente. E quero seguir fazendo.

Às vezes, de manhã, quando acordo, é difícil sair da cama, voltar ao meu corpo e me movimentar. Mas faço isso. Nem todo mundo tem uma razão para sair da cama – alguma coisa que goste de fazer e que dê sentido à vida. Tenho muita sorte de que isso faça parte da minha existência. De fato, não penso na minha idade, a menos que alguém a mencione. Acho que me sinto na meia-idade, que para mim fica entre os 50 e os 70 anos. Seria ótimo viver até os cem – dar cem voltas em torno do sol. Estou bastante perto.

Projetos atuais e futuros: concluiu “Drifting Toward Twilight”, instalação na Biblioteca Huntington, de Nova York; “Betye Saar: Heart of a Wanderer”, no Museu Isabella Stewart Gardner, de Boston; “Betye Saar: Serious Moonlight”, no museu de arte de Lucerna, na Suíça; e criou uma nova obra de arte sob encomenda para “Paraventi; Folding Screens from the 17th to the 21st Century” na Fondazione Prada, de Milão.

Joan Collins, de 90 anos, recusa-se a se definir pela idade.

Adoro escrever e atuar – subir ao palco e fazer meu pequeno espetáculo solo; e me recuso a ser definida por um número, pela idade. Acho isso muito ultrapassado e irrelevante para o mundo atual.

Mas é preciso ser resiliente neste ramo. A rejeição faz parte da indústria. Olho com consternação para muitos dos meus colegas atores, derrubados pela bebida e pelas drogas. Meu pai, que era agente teatral, me ensinou que eu deveria ter uma pele grossa, como a do rinoceronte, e por dentro ser como um marshmallow.

Joan diz que "é preciso ser resiliente no ramo da arte" (Amy Harrity/The New York Times - 16.02.2024)

Também é preciso ter paciência. Nesta área, temos de esperar. Por exemplo, escreveram para mim um roteiro sobre a duquesa de Windsor [Wallis Simpson]. Eu queria fazê-lo desde os anos 1980. Recebemos a aprovação só há um mês.

Anos atrás, pensei que seria maravilhoso fazer um filme sobre minha infância com minha irmã Jackie. Mas não se concretizou. Seria ambientado na época em que éramos crianças, durante a Blitz. Naquele tempo, eu não sentia medo. Não sabia nada sobre bombardeios. Pegávamos estilhaços de bombas nas ruas, e à noite eu os colocava na minha caixa de charutos. Desenhávamos imagens bobas de Hitler. Fomos evacuadas dez ou 12 vezes. Íamos para estações de metrô para nos protegermos e as pessoas tocavam gaita e cantavam.

Uma pergunta que me fazem com frequência é: “Por que você ainda está trabalhando?” Que estupidez dizer uma coisa dessas. Continuo trabalhando porque adoro estar ocupada. Quando faço meu espetáculo solo, é exaustivo ir para um hotel diferente toda noite. Mas é gratificante. O público responde muito bem. Isso me anima.

Projetos atuais e futuros: “Behind the Shoulder Pads, Tales I Tell My Friends”, livro de memórias; “Joan Collins Unscripted”, turnê teatral britânica.

Giorgio Armani, de 89 anos, não pensa muito na idade.

Para aqueles que cresceram à sombra da guerra, a ambição era natural, um impulso vital. Não era um desejo de fama e notoriedade, mas de realização pessoal – uma forma de se afirmar apesar das dificuldades e superá-las. Minha mãe e meu pai me ensinaram o valor do compromisso e do trabalho árduo para conseguir as coisas. É uma lição que nunca me abandonou.

Levei algum tempo para encontrar meu caminho. Primeiro, estudei medicina, e depois veio a La Rinascente [loja de departamentos italiana, na qual Armani trabalhou como expositor] e a Cerruti, ou seja, a moda. Foi quando encontrei minha ambição, quando descobri o poder da roupa não só para mudar a aparência, mas, mais profundamente, para influenciar a maneira de ser e de se comportar.

Acredito que os desafios – ou os problemas – e as recompensas de permanecer ativo caminham juntos se você trabalhar tanto tempo quanto eu e continuar presente. A principal dificuldade é seguir sendo relevante sem ceder às pressões do momento, que frequentemente parecem muito urgentes, mas que são esquecíveis em longo prazo.

O fato é que não penso muito na idade. Na minha cabeça, tenho a mesma idade que tinha quando comecei a Giorgio Armani. As situações e as pessoas mudam, mas no fim os desafios e os problemas são os mesmos. Minha maneira de enfrentá-los não mudou: com grande determinação. Mas o público evolui, e isso não deve ser subestimado. Por isso, a coerência estilística deve ser elástica. Caso contrário, torna-se rígida. A maior recompensa é você se tornar um clássico – além e acima das modas – e ser identificado com um estilo.

Projetos atuais e futuros: projetou 14 coleções de alta-costura masculina e feminina em 2023.

c. 2024 The New York Times Company

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