Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Publicidade

Lucas Braathen troca Noruega pelo Brasil por ouro olímpico no esqui: ‘Vou carregar a bandeira’

Fã de Ronaldinho e samba, campeão mundial no gelo muda de lado pela mãe, se inspira no futebol e vê missão social com comunidades

Entrevista|Raphael Hakime, do R7

Lucas Braathen trocou a Noruega pelo Brasil e defenderá o verde e o amarelo no esqui alpino (Joerg Mitter/Divulgação Red Bull Content Pool – 22.01.2023)

Sem qualquer tradição nos esportes no gelo, o Brasil ganhou um reforço de peso para os próximos Jogos Olímpicos de Inverno de Milão em 2026: Lucas Pinheiro Braathen, campeão mundial de slalom no esqui alpino pela Noruega, passou a vestir o verde-amarelo há um mês. Por conta da mãe, que é de Campinas (SP), Pinheiro Braathen migrou do potente time norueguês para a seleção brasileira.

Fã de samba e bossa nova, modelo e DJ nas horas vagas e dono de “músculos e jeitinho brasileiros”, Braathen conversou com o R7 direto de Lillehammer, na Noruega, palco dos Jogos Olímpicos de Inverno em 1994. O atleta detalhou a conversa com o pai norueguês quando resolveu mudar de bandeira e resgatou as raízes brasileiras que ainda tem no interior paulista.

Pinheiro Braathen revelou também que quer usar o esqui alpino como catalisador social nas comunidades brasileiras, apontou Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo Fenômeno e Neymar como ídolos e explicou como o futebol o inspirou para se tornar um dos principais esquiadores no gelo do mundo.

A partir de julho, o norueguês-brasileiro terá a oportunidade de levar as cores do país ao pódio e já adianta que uma medalha olímpica no gelo é a meta: “Quero carregar a bandeira brasileira para o top 3 nos Jogos Olímpicos. Posso representar 200 milhões”.

Publicidade

Leia abaixo a entrevista com Lucas Braathen:

Lucas Pinheiro Braathen anunciou, em março de 2024, que passaria a disputar campeonatos com as cores do Brasil (Joerg Mitter/Divulgação Red Bull Content Pool – 07.03.2024)

R7 — Você é bicampeão mundial júnior, medalhista de bronze no campeonato mundial de esqui alpino e foi campeão do mundo em 2023 na categoria slalom. Você é filho de mãe brasileira e pai norueguês. Como é essa relação com o Brasil?

Lucas Braathen — Viajo para o Brasil uma vez por ano. Faço isso para encontrar minha família no Brasil, já que metade dela, do lado da minha mãe, continua em Campinas. Então vou para visitá-los. [...] Mas teve um período de seis meses em que morei no Brasil, quando eu ainda era criança.

Publicidade

Quando comecei com o esqui, precisava de mais tempo de dedicação, então, passei a ir a cada 2 anos. Mas, nos últimos três anos, eu voltei a viajar uma vez por ano ao Brasil. Acho que só sou atleta e a pessoa que sou hoje pelo meu lado brasileiro. No esqui, como todo mundo é dos Estados Unidos, da Europa, da Ásia, acho que sou o único que pode trazer o jeito brasileiro para um esporte de inverno. O esqui alpino é a Fórmula 1 do esporte de inverno. Sou muito orgulhoso de levar a bandeira brasileira para esse esporte.

R7 — Para tomar essa decisão de defender o Brasil, você levou um tempo, houve um hiato, um intervalo em que você tirou um período sabático. Você parou de competir pela Noruega e agora está entrando no time brasileiro. Como foi esse processo? Mexeu muito com a sua cabeça?

Publicidade

Braathen — Claro, foi um processo muito intenso, já que eu estava fora do esporte que eu mais amo. Via competição na televisão, e isso foi muito difícil. Quero fazer ‘parte do show’. Para mim, o esporte um show, é uma dança. Eu estava vendo a dança, mas não estava dançando. Isso foi muito difícil.

Diante disso, procurei meus patrocinadores e perguntei em janeiro: ‘Gente, o que vocês acham de eu voltar para o esporte? O que vocês pensam?’ Eles disseram: ‘Claro, nós estamos aqui para te ajudar. A gente quer te ver na pista de novo. É ali onde você mora’. Aí, eu disse que a gente poderia ir para o time brasileiro e escrever a história. A gente pode trazer a bandeira brasileira para o esporte, para os Jogos Olímpicos. O que vocês acham? Eles disseram: ‘Fechou, vamos nessa’.

Junto com meu pai, ligamos para a federação de esqui no Brasil. Eu estava em São Paulo, encontramos eles e achamos um jeito de fazer isso, de escrever a história. Quando eu soube disso, no meio de janeiro, comecei a trabalhar todo dia para criar esse novo time, arrumar novos patrocinadores, tudo o que é preciso para carregar a bandeira brasileira.

R7 — Na situação atual, os resultados dos brasileiros são modestos em Jogos de Inverno, não são bons. Em 2014, o Brasil conseguiu, por exemplo, a 39ª posição no slalom especial. Você foi campeão do Globo de Cristal no slalom gigante pela Noruega. Dá para repetir esse resultado com a bandeira do Brasil nos Jogos de Milão, em 2026?

Braathen — Claro, esse é o objetivo. Quero carregar a bandeira brasileira para o top 3 nos Jogos Olímpicos. Essa é a coisa que ninguém conseguiu ainda. Acho que esse é o jeito para mostrar para todo mundo no Brasil que você pode fazer tudo o que você quer. Quero ser essa inspiração para a próxima geração, não importa se é um esporte de inverno, futebol ou um artista. Eu só quero mostrar meu jeito para ganhar o que quiser ganhar para um brasileiro num esporte de inverno, que é uma coisa muito estranha. Esse objetivo representa uma inspiração para outros.

Minha história no esporte é essa. Não comecei com o esqui quando eu era criança. Não gostava nada. Achava horrível, porque é frio, você usa botas, as pernas doem, eu não gostava. Eu gostava de futebol. Meu amor pelo esporte começou por causa do futebol no Brasil, quando eu jogava com meus primos e outras crianças que moram em São Paulo. Então, foi o futebol, o jeito brasileiro, essa cultura que me mostrou o amor que existe no esporte. Essa sempre foi a atmosfera que eu quis trazer para o esporte de inverno quando eu me tornei esquiador. Agora, o círculo está completo porque voltei aonde eu achei meu amor pelo esporte e posso praticar na Copa do Mundo do esporte com essa bandeira.

Lucas Braathen, ainda com bandeira da Noruega, competiu em Kitzbuhel, na Áustria (Samo Vidic/Divulgação Red Bull Content Pool – 22.01.2023)

R7 — Vejo ao seu lado uma camiseta e um pôster do Alaba [lateral-esquerdo austríaco do Bayern]. Você é torcedor do Bayern de Munique?

Braathen — Meu time favorito é o Manchester United na Premier League. Mas o Bayern de Munique é especial também porque é um local de esquiadores na Alemanha. Os esquiadores têm uma relação muito forte com o Bayern de Munique. E acho muito legal o David Alaba, da Áustria, que não é um país com tradição em formar grandes jogadores de futebol. Mas o Alaba conseguiu chegar no primeiro time do Bayern de Munique. É um jogador preto [que representa a comunidade] da Áustria, isso é muito legal. Ele é ótimo. No Brasil, meu time é o São Paulo.

R7 — A partir de 1º de julho, sua situação estará regularizada. Mas a partir de quando você poderá efetivamente defender as cores do Brasil?

Braathen — Vai ser na Copa do Mundo em Sölden, na Áustria, em outubro. Vai ser a primeira Copa do Mundo em que eu vou poder carregar a bandeira brasileira. Mas, talvez, eu vá para a Nova Zelândia antes, no fim de agosto, para competir em torneios internacionais, mas não no nível de Copa do Mundo. Vou para competir para treinar, ter a situação de competição. A primeira Copa do Mundo será no fim de outubro, vai ser a primeira chance na televisão para mostrar as cores brasileiras.

R7 — Falando da Nova Zelândia, onde é sua base? Você mora na Noruega?

Braathen — Não estou morando mais na Noruega. No fim de 2023, aluguei meu apartamento na Noruega e fui para o Brasil. Fiquei até o Natal, quando fui para Roma. Agora, tenho um apartamento de esqui na Áustria, que fica bem perto das montanhas. Fica nos arredores de Innsbruck. É onde eu treino. Também treino em Salzburg, onde faço testes físicos e treinos.

No esporte de esqui, você viaja muito para países no centro da Europa, como Itália, Suécia, Alemanha, Áustria. Também vou para Califórnia e Colorado, nos Estados Unidos. Os últimos Jogos Olímpicos foram em Pequim. É um esporte mundial, mas minha base é na Áustria.

Braathen curte música, esportes e moda fora das competições (Fabio Piva/Divulgação Red Bull Content Pool – 02.05.2023)

R7 — O que você faz quando não treina ou está nas competições? Nas redes sociais, você mostra uma vida mais leve, até como modelo e DJ. O que você faz para se divertir?

Braathen — Para mim, todos os outros interesses são muito importantes. Tem dois efeitos. Um é que posso viajar para outro lado da minha vida, que não o esporte ou o esqui, só o que está relacionado aos meus interesses que me deixam sentir alegria. Para mim, é a música, que achei no Brasil, jogando futebol com meus amigos.

Amo pessoas criativas. Amo ver o que tem de novo na moda, exibições de arte. Essas experiências trazem muita inspiração para mim e acho novas maneiras de me tornar um atleta melhor. Surfar é um dos meus esportes favoritos. [Também gosto de] Jogar tênis, gosto de esportes acrobáticos como o trampolim.

R7 — Que tipo de música brasileira você costuma escutar?

Braathen — No Brasil, samba e bossa nova. Eu uso muito a música no meu esporte. Quando eu tenho um dia da competição e percebo que não estou competitivo e preciso ficar mais intenso, ouço techno, rap, ritmos que me agitam um pouco. Mas tem outras vezes que eu estou muito intenso, preciso baixar um pouco a adrenalina. Então, busco a bossa nova. É assim que eu uso a música. Escuto João Gilberto, Jorge Bem Jor, para acalmar um pouco e achar um meio-termo. E samba é mais para dançar, para a balada.

R7 – Quantas horas por dia você faz de treinamentos físicos?

Braathen – Em torno de 6 horas ou 7 horas. Num dia da semana, fico sem treinamento ou, talvez, só treinar muito leve, como [fazer] ioga. É vida de atleta, faz parte.

R7 — Quais ídolos você tem no esporte mundial? E no Brasil?

Braathen — Meu amor pelo esporte nasceu por causa do futebol no Brasil. Eu via Ronaldinho, Ronaldo e, claro, toda a seleção brasileira. Mas esses dois são muito especiais. A geração seguinte foi a do Neymar, que é um artista do esporte, porque toca na bola de um jeito totalmente diferente de todos os outros jogadores no mundo. Para mim, os três são uma grande inspiração, porque eles trouxeram um jeito novo para a experiência do futebol. Claro que ainda tem Ayrton Senna, atleta brasileiro de Fórmula 1, já que tem uma semelhança com meu esporte para mim. São grandes ídolos.

R7 — No seu esporte, quem é referência no esqui alpino?

Bratheen — Tem um cara que se chama Aksel Svindal, um norueguês que fez história. É um cara que criou uma nova cultura no esporte de esqui. Tem o Bode Miller, dos Estados Unidos, que foi um rockstar. No esporte de inverno de corrida, ele trouxe festa, foi uma nova experiência vê-lo esquiando. Mas o maior do mundo é Alberto Tomba, da Itália. No esqui alpino, você faz o circuito duas vezes. No meio dessas duas vezes, quando ele estava esquiando, ele dava entrevistas para a televisão mundial, comendo espaguete e tomando vinho. Acredite! E ele ganhava depois de beber vinho. Esse cara é louco. Ele é de duas gerações para trás.

Lucas Braathen vestirá as cores do Brasil nas próximas Olimpíadas de Inverno (Reprodução/Instagram @pinheiiiroo)

R7 – Na atualidade, quem são seus dois ou três grandes rivais?

Braathen — Marco Odermatt, que é o melhor do mundo agora no slalom gigante e no super g. Ele é forte. É da minha geração, só 3 anos mais velho que eu. É um esquiador ótimo da Suíça. Ele é o principal. No último ano, em que eu me tornei campeão do mundo na categoria slalom, tinha um cara que se chama Henrik Kristoffersen, o competidor mais difícil para vencer. Estávamos disputando a última etapa daquele ano. Foi muito pertinho. Ganhei na última competição esse Globo de Cristal. Foi duro de batê-lo. É um competidor fortíssimo.

R7 – Pensando numa criança brasileira, que vai te ver na TV e nas redes sociais e quer praticar o seu esporte num país tropical como o Brasil. O que você recomenda?

Braathen – Na América do Sul, há locais para esquiar. O mais comum para os brasileiros é o Chile, o mais perto. Tem invernos muito bons. Outros vão para os Estados Unidos, mas já é mais longe. No Chile, tem umas pistas para aprender a esquiar.

O que eu quero trazer para a seleção brasileira e a federação de esqui é a mudança. Quero trazer minha experiência, inspiração para novas crianças e, talvez, com um pouco de investimento, todo ano, um pouquinho para começar a fazer um sistema para fazer a introdução de esqui. Acho que eu posso ser essa pessoa.

R7 — Como assim?

Braathen — A ideia seria criar um instituto, junto com a federação brasileira, que pode criar esse espaço para esquiar ou fazer a introdução do esqui. Também quero fazer coisas fora do esporte de inverno, achar um jeito de trazer um pouco de recurso para crianças da favela para fazer esporte e deixar de fazer coisas erradas. O esporte é o jeito melhor para criar a mudança numa comunidade. Esse é o grande valor do esporte. Não é o troféu.

Aqui na Noruega e na Europa, eu já tenho um instituto. Tem uma pista de treinamento, e as pessoas têm que pagar para entrar. Todo esse dinheiro, junto com as marcas, damos para crianças fazerem o esporte e não têm dinheiro para começar. Eu gostaria de leva-lo também para o Brasil.

Últimas

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.