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Com o hidrogênio, a Alemanha tem chances de liderar a energia verde

Utilização do gás como combustível pode substituir o material fóssil, principalmente na indústria pesada, mas ainda enfrenta barreiras financeiras

Internacional|Stanley Reed e Melissa Eddy, do The New York Times

Gigante alemã investe pesado em produção de hidrogênio e busca a liderança do setor de combustíveis limpos (Felix Schmitt/The New York Times - 19.03.2024)

Na cidade de Duisburg, no coração industrial da Alemanha, existe um grande complexo siderúrgico que é um dos maiores poluidores da Europa. Foi justamente lá, ao lado dos fornos e das fundições das fábricas, que alguns técnicos desenvolveram uma máquina que poderá, em breve, desempenhar um papel vital na redução das emissões de gases de efeito estufa.

Ao utilizar eletricidade para dividir a água nos seus dois elementos, o dispositivo, um modelo de teste denominado eletrolisador, produz hidrogênio, gás isento de carbono que ajudará a alimentar fábricas como a de Duisburg. Se forem amplamente adotados, esses dispositivos vão colaborar para a limpeza da indústria pesada, como a siderúrgica, na Alemanha e em outros lugares.

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“É provável que estejamos em um dos poucos setores muito promissores no qual a Alemanha tem uma base significativa e muito favorável”, disse Werner Ponikwar, CEO da ThyssenKrupp Nucera, que produz eletrolisadores. A empresa foi desmembrada da ThyssenKrupp, a gigante siderúrgica alemã, em 2023.

O projeto Nucera foi apoiado por um fundo do governo alemão no valor de 700 milhões de euros (US$ 746 milhões). Os governos estaduais e federais alemães reservaram, no total, 13,2 bilhões de euros para investimentos em cerca de duas dezenas de projetos de desenvolvimento de hidrogênio.

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Substituto dos combustíveis fósseis

O conceito do hidrogênio como fonte de energia renovável existe há anos, mas foi apenas na última década que decolou a noção do seu potencial para substituir os combustíveis fósseis que alimentam a indústria pesada. Por sua vez, isso levou a um aumento do investimento e a avanços na tecnologia.

Agora, esse apoio começa a dar frutos. Os proprietários de alguns dos projetos de energia limpa mais ambiciosos do mundo – incluindo a petrolífera Shell, a maior empresa de energia da Europa, e o governo da Arábia Saudita – encomendaram versões muito maiores do eletrolisador de dois megawatts em Duisburg, visando estabelecer uma era industrial livre de carbono.

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Do seu lado, Washington destinou mais financiamento como parte dos incentivos permitidos pela Lei de Redução da Inflação, do presidente Joe Biden. Criada em 2022, essa lei reserva centenas de bilhões de dólares para a tecnologia livre de carbono, também chamada de energia verde. O Departamento de Energia dos Estados Unidos concedeu à Nucera uma doação de US$ 50 milhões, no mês passado, para desenvolver ainda mais a produção de eletrolisadores em escala de gigawatts para o país.

Analistas destacam a capacidade que o hidrogênio produzido com energia renovável tem para reduzir as emissões de dióxido de carbono das indústrias pesadas (Felix Schmitt/The New York Times - 20.03.2024)

Esses grandes subsídios são o reconhecimento de que a tecnologia não sairá do papel sem apoio governamental. “Acho que eles entenderam que agora o trabalho precisa ser em grande escala”, afirmou Christoph Noeres, chefe do projeto de hidrogênio verde na Nucera, apontando para as promessas de quantias multibilionárias de investimento para projetos de aço verde e hidrogênio verde vindos de muitas fontes, de Berlim a Washington.

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Analistas destacam a capacidade que o hidrogênio produzido com energia renovável tem para reduzir as emissões de dióxido de carbono das indústrias pesadas, incluindo a produção de aço e as viagens de longo curso por via aérea ou marítima. “Só não devemos acreditar no hidrogênio se não acreditamos totalmente na descarbonização. Há altos e baixos que vêm em ondas, mas estou confiante de que estamos em um caminho longo e constante para a descarbonização”, disse Bernd Heid, que dirige a Plataforma para Tecnologias Climáticas na empresa de consultoria McKinsey & Co.

A Alemanha trabalha para reduzir até 2045 radicalmente a quantidade de dióxido de carbono que emite. Isso significa não só mudar as matrizes produtivas para uso de combustíveis de baixo carbono – como eletricidade para aquecimento e transporte –, mas também encontrar formas de reduzir as emissões das indústrias mais sujas, incluindo a do aço, dos fertilizantes e do cimento.

A ThyssenKrupp planeja utilizar hidrogênio para ajudar a reduzir os 20 milhões de toneladas de dióxido de carbono que sua siderúrgica, em Duisburg, produz a cada ano, o que corresponde a cerca de dois e meio por cento das emissões totais da Alemanha. A empresa, cujas raízes remontam à revolução industrial do século XIX, recentemente viu sua existência ameaçada pela concorrência chinesa e por outros fatores que prejudicavam seus principais negócios, incluindo a produção de aço.

Werner Ponikwar, presidente-executivo da ThyssenKrupp Nucera, que produz eletrolisadores de hidrogênio (Felix Schmitt/The New York Times - 20.03.2024)

No dia 11 de abril, a ThyssenKrupp anunciou que reduziria em 20% a capacidade de produção na fábrica de Duisburg, que emprega cerca de 13 mil pessoas. A empresa citou os altos preços da energia e a pressão para atingir a neutralidade de carbono entre as razões para a redução.

A incursão da ThyssenKrupp no hidrogênio, por intermédio da Nucera, da qual detém pouco mais de 50%, mostra que as sementes do crescimento econômico para as indústrias alemãs podem estar nas paisagens enferrujadas da decadência industrial. Entre os negócios da ThyssenKrupp, por exemplo, há um fornecedor líder mundial de equipamentos para a produção de cloro, produto químico com muitas utilidades, incluindo água potável e limpeza de piscinas. Acontece que novos aproveitamentos dessas máquinas permitem que sejam utilizadas para produzir hidrogênio.

Estar ligado a uma empresa conhecida, que ajudou a construir fábricas e outras grandes instalações no mundo inteiro, acabou por ser um ponto de venda para potenciais clientes. Quando a CF Industries, grande fabricante de fertilizantes, decidiu investir em um eletrolisador para ajudar a produzir amoníaco com baixas emissões, em uma fábrica em Donaldsonville, na Louisiana, foi o histórico industrial da ThyssenKrupp que a levou a escolher a Nucera para fornecer uma unidade de US$ 100 milhões. “Para nós, ela proporcionava o menor risco do ponto de vista tecnológico e o mais alto desempenho e confiabilidade”, declarou Tony Will, CEO da CF Industries.

Motivos semelhantes levaram a H2 Green Steel, startup sediada em Estocolmo, a escolher a ThyssenKrupp para fornecer o que poderá ser o maior eletrolisador da Europa, destinado a uma fábrica no norte da Suécia que produzirá aço livre de emissões. “Pouquíssimos fornecedores potenciais têm musculatura para cumprir as metas de desempenho exigidas”, afirmou Maria Persson Gulda, diretora de tecnologia da H2 Green Steel.

Pressões financeiras

A Nucera não escapou totalmente à recessão na área das energias renováveis, que afetou as ações de outras empresas focadas no hidrogênio, como a ITM Power, no Reino Unido, e a Plug Power, nos Estados Unidos. As ações da Nucera, cotadas a 20 euros em julho passado, caíram para cerca de 12 euros.

Os eletrolisadores são uma das esperanças para a produção de energia limpa em larga escala (Felix Schmitt/The New York Times - 20.03.2024)

Com taxas de juro mais elevadas e a inflação afetando a economia dos projetos de energias renováveis, analistas reduziram suas previsões para a adoção do hidrogênio. “Tudo é mais caro do que se pensava inicialmente”, disse Hector Arreola, principal analista de hidrogênio da Wood Mackenzie, empresa de consultoria energética.

A Nucera anunciou, em fevereiro, que as vendas no trimestre encerrado em 31 de dezembro aumentaram 35% em relação ao ano anterior, alcançando 208 milhões de euros.

O impulso veio principalmente da entrega de eletrolisadores à Arábia Saudita. A empresa está fornecendo o que poderá ser a maior variedade mundial de produtores de hidrogênio verde, como parte de um projeto de US$ 8,4 bilhões na região de Neom, a ambiciosa cidade que está sendo construída pelo príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman. O governo saudita possui seis por cento das ações da Nucera.

A economia em torno do hidrogênio verde é, em grande parte, balizada pelo preço dos eletrolisadores e pelo custo dos volumes de energia elétrica isenta de carbono necessários para fazê-los funcionar. Em um esforço para manter a liderança energética nos próximos anos, a Arábia Saudita tem grande ambição de ser exportador de hidrogênio, porque pode produzir energia solar barata nos seus vastos desertos. A H2 Green Steel garantiu um contrato de baixo custo para energia hidrelétrica, outra fonte verde.

O hidrogênio verde produzido por eletrolisadores tende a ser mais caro do que o chamado hidrogênio cinzento, que depende de combustíveis fósseis e produz emissões quando utilizado em indústrias como a de fertilizantes e de refino de petróleo. Um indicador experimental de hidrogênio compilado pela Bolsa Europeia de Energia, que é um mercado financeiro, atribui ao hidrogênio verde um custo cerca de oito vezes superior ao de gás natural, nos mercados futuros europeus.

Will, da CF Industries, disse que o principal custo energético para produzir sua amônia verde seria de US$ 600 por tonelada – seis vezes mais que o custo do hidrogênio cinza. Ele está buscando clientes dispostos a pagar mais por um produto verde.

c. 2024 The New York Times Company

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