Sem saída no fim do mês, uma parcela expressiva da população brasileira recorre ao limite do cheque especial ou ao cartão de crédito para conseguir fechar as contas — as duas modalidades de empréstimo mais caras disponíveis para pessoa física no Brasil.
Pelo menos 2 em cada 10 brasileiros adotam essa estratégia arriscada todo mês, segundo uma pesquisa inédita sobre hábitos dos consumidores, realizada pelo SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito) e divulgada na última quarta-feira (1º).
Entre os entrevistados, 22,9% afirmam que recorrem a esses dois tipos de financiamento. O índice é ainda maior entre as pessoas das classes C, D e E (23,4%) e com menos escolaridade (23,9%).
Os dados mais recentes do Banco Central mostram que, no mês de maio, os juros do cheque especial chegaram a 232% ao ano — maior patamar em 20 anos.
Essa taxa só ganha do rotativo do cartão de crédito, que atingiu 360,6% ao ano. Juntas, são as duas formas de empréstimo mais caras hoje no País.
A falta de planejamento associada a essas altas taxas são os principais responsáveis pela inadimplência, segundo a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti.
— É muito comum que a dívida do cartão de crédito triplique em pouco tempo. Para alguém que já está muito endividado, é muito difícil pagar.
Assumir dívidas por um longo período no momento em que a economia brasileira vai mal é algo que os brasileiros já começam a evitar. De acordo com a pesquisa, 68,3% dos entrevistados dizem que diminuíram as prestações para não comprometer o orçamento familiar. Porém, nas classes com renda menor, o índice é de 61,9%.
Compra por impulso
As compras por impulso podem ser as vilãs do orçamento de qualquer pessoa. Mas quem resiste a uma promoção? Entre os entrevistados, 3 em cada 10 admitiram gastar mais do que o previsto após ver uma oferta. As justificativas foram: medo de não encontrar um preço menor e medo de deixar de comprar algo que queriam.
Depois de comprar, o lado racional fala mais alto. Quase 80% dos brasileiros já se arrependeram de ter comprado algum produto que não precisavam muito. Porém, para adquirir bens de valor mais alto, 6 em cada 10 pessoas admitem fazer algum planejamento.
Com ano difícil na economia, mais da metade dos brasileiros quer diminuir compras parceladas
Pesquisa
Essa foi a primeira pesquisa sobre consumo consciente feita pelo SPC Brasil. O objetivo é traçar o perfil dos brasileiros tanto na hora da compra quanto do consumo de bens e serviços. São levados em conta fatores financeiros (uso do dinheiro e telefonia celular), ambientais (uso racional de água e energia elétrica) e sociais (propaganda, pirataria etc.).
Foram ouvidas 605 pessoas acima de 18 anos, nas 27 capitais brasileiras. A partir dos resultados, o SPC Brasil criou um índice para avaliar, anualmente, as mudanças no perfil dos consumidores. Hoje, apenas 21,8% praticam atitudes corretas na hora de consumir.
Na avaliação da entidade, muitas pessoas consideram apenas o viés financeiro. Isso se explica com o fato de um terço dos entrevistados justificar que a principal vantagem do consumo consciente é apenas o fato de fazer o dinheiro render mais. A expectativa do órgão é que, no futuro, aumente a preocupação com o meio ambiente e com o impacto social de determinadas compras.