Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Publicidade

Argentina: preso há 3 meses, líder indígena expõe conflitos por terras

Facundo Jones Huala denuncia opressão sofrida por comunidades

Internacional|Ana Luísa Vieira, do R7

Facundo Jones Huala é um dos chefes da comunidade mapuche, que reivindica 500 hectares de terras na Patagônia argentina
Facundo Jones Huala é um dos chefes da comunidade mapuche, que reivindica 500 hectares de terras na Patagônia argentina Facundo Jones Huala é um dos chefes da comunidade mapuche, que reivindica 500 hectares de terras na Patagônia argentina

Preso desde o último 27 de junho na Argentina, o líder indígena Francisco Facundo Jones Huala, de apenas 31 anos, é um dos personagens centrais da crise política que enfrenta atualmente o governo de Mauricio Macri. O motivo: o jovem é hoje um dos chefes da comunidade mapuche, que reivindica 500 hectares de terras na Patagônia do grupo italiano Benetton — fabricante de lãs que possui uma fazenda de ovelhas no local.

Em constantes protestos, os mapuches têm sido alvo de repressão policial e levaram milhares às ruas pelo desaparecimento forçado do militante Santiago Maldonado — abordado por forças de segurança argentinas durante uma manifestação da tribo.

Em entrevista ao R7, a advogada de Jones Huala, Sonia Ivanoff — que é especialista em direitos indígenas e vice-presidente da AADI (Associação de Advogados de Direito Indígena da República Argentina) —, explica as principais reivindicações do povo mapuche.

— Este é um conflito histórico que está diretamente relacionado ao exercício da lei territorial. Muitos estados na Argentina e no Chile foram constituídos em um território que já era ocupado por comunidades indígenas muito antes da colonização. Hoje, diante da lei, essas imensas propriedades estão nas mãos de poucos grupos estrangeiros. Existe uma falta de reconhecimento histórico, uma falta de reconhecimento de que os indígenas são também atores políticos relacionados ao Estado e devem ter seu direito à consulta e participação respeitados.

Publicidade

Leia também

Segundo a advogada, Jones Huala foi preso em uma operação de rotina feita pela Gendarmería — força militar argentina, subordinada ao Ministério da Segurança. Consta na ficha do líder um pedido de extradição feito pelo Chile. O país vizinho alega que, em janeiro de 2013, o argentino atravessou a fronteira ilegalmente e participou do incêndio em uma propriedade rural. Em 2016, entretanto, o líder indígena já havia sido detido, julgado e liberado na Argentina pelo mesmo episódio. Para Sonia, a segunda prisão de seu cliente sem sentença alguma é “ilegal, abusiva e inconstitucional”. Na unidade prisional de Esquel, Jones Huala fez greve de fome e espera por um novo pronunciamento das autoridades argentinas. “O segundo julgamento em Bariloche ainda não tem data definida”, diz a advogada.

Séculos de conflito

Publicidade

Na província de Chubut, onde a comunidade liderada por Jones Huala reivindica terras do grupo Benetton, vivem pelo menos 43 mil índios e descendentes indígenas, segundo dados do último Censo Nacional de População, Casas e Habitação da Argentina, de 2010. Em todo o país, a população indígena conta com pouco mais de 950 mil pessoas (2,4% de toda a população nacional). A diretora executiva da Anistia Internacional Argentina, Mariela Belski, reforça que a reivindicação por terras é uma constante entre todas as tribos.

— A relação com a terra é muito importante para os índios, é parte da identidade deles. Acontece que governo não reconhece a titularidade dessas terras para a população indígena e, para fazer valer seus direitos, essa população se utiliza de protestos sociais, às vezes bloqueando vias e estradas. E a resposta das autoridades, muitas vezes, é a violência e a criminalização.

Publicidade
Desaparecimento do jovem Santiago Maldonado aumentou debates sobre demarcação de terras indígenas
Desaparecimento do jovem Santiago Maldonado aumentou debates sobre demarcação de terras indígenas Desaparecimento do jovem Santiago Maldonado aumentou debates sobre demarcação de terras indígenas

Mariela Belski pondera que, quando chegou ao poder, Mauricio Macri não apresentou nenhuma proposta específica para as populações indígenas. “É verdade, de qualquer forma, que dentro da Secretaria de Direitos Humanos e Pluralismo Cultural existe a intenção de fortalecer do INAI (Instituto Nacional de Assuntos Indígenas)”, explica a diretora-executiva da Anistia Internacional.

O INAI, conforme ressalta Mariela, luta principalmente pela implementação de uma legislação que determina que os indígenas não sejam desalojados dos territórios que hoje ocupam e que, juntamente das comunidades, os governos façam uma demarcação legal das propriedades das tribos.

— Essa lei foi sancionada em 2004 com duração de quatro anos e vem sendo prorrogada desde então. O problema é que ela foi muito mal implementada. Só 700 comunidades tiveram suas terras mapeadas desde então, diante de mais de 1.500 presentes no país. A próxima prorrogação vence em novembro e deve ser reanalisada pelo Senado. O governo só passou a defender mais explicitamente que esse prazo seja prorrogado de novo depois do desaparecimento de Santiago Maldonado.

Para a advogada de Francisco Facundo Jones Huala, por sua vez, a postura das autoridades e mesmo o desaparecimento forçado de Santiago Maldonado refletem o grau de opressão sofrido pelas comunidades indígenas em séculos de história.

— A desaparição de Santiago é uma entre muitas de membros da comunidades indígenas. Esse governo atual quer passar uma imagem de poder e controle, por isso não aceita protestos de expressão social — tanto que quase todas as manifestações, em diferentes esferas, acabam com detenções e uso das forças de segurança. Francisco Facundo Jones Huala é um líder mapuche que não se calou diante do conflito histórico que vive seu povo e outros povos indígenas na Argentina. Esse é o maior perigo que aparenta para o Estado.

O Portal R7 tentou contato com o Ministério da Segurança e a Secretaria de Direitos Humanos e Pluralismo Cultural da Argentina, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Últimas

Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.