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Fome na Venezuela: crianças desnutridas hoje podem ser geração mentalmente debilitada no futuro

Pobreza e falta de alimentos assolam país; 73% dos venezuelanos perderam peso em 2016

Internacional|Ana Luísa Vieira, do R7

73% da população venezuelana perdeu peso no último ano, apontam pesquisas
73% da população venezuelana perdeu peso no último ano, apontam pesquisas 73% da população venezuelana perdeu peso no último ano, apontam pesquisas

Colapso econômico, escassez de produtos básicos e, sobretudo, fome: a realidade atual da Venezuela pode causar sequelas para as próximas décadas — especialmente no que diz respeito a um futuro saudável para as crianças. De acordo com especialistas ouvidos pelo R7, a desnutrição infantil, quando não solucionada imediatamente, compromete tanto o crescimento dos pacientes quanto o processo de aprendizagem.

Dados divulgados pela organização Cáritas da Venezuela em novembro de 2016 mostram que, em quatro estados do país (Distrito Capital, Miranda, Vargas, Zulia), a desnutrição crônica atinge 18,4% das crianças com menos de 5 anos de idade. Os últimos números oficiais do governo são de 2015, referentes ao ano de 2014, e apontam que a desnutrição crônica afetava apenas 3,4% das crianças em todo o território da Venezuela. 

Problema generalizado

Segundo Mauro Fisberg, que é pediatra, nutrólogo e professor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a desnutrição crônica ocorre quando as crianças, principalmente bebês, param de crescer por falta de ingestão de alimentos ou porque os nutrientes da comida não estão sendo absorvidos pelo organismo.

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— O organismo do paciente fica sem energia e sem condições de desenvolver suas funções metabólicas. Todo o sistema de enzimas, de respiração, de crescimento, tudo isso vai ser afetado. Com a falta de ferro, zinco e vitaminas A, C e D, vai haver alterações no crescimento, alterações nos sistemas de defesa do organismo, alterações nos processos de cicatrização de feridas e também comprometimentos do sistema cognitivo da criança.

O sistema cognitivo, diz o médico, envolve aspectos como memória e as capacidades de aprendizado e de resolução de problemas dos indivíduos. Os danos, entretanto, costumam ser percebidos anos após o diagnóstico da desnutrição.

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— Essas consequências vão começar a ser notadas no momento em que se começa a acelerar o crescimento da criança, que é também o período de formação do sistema nervoso central, logo nos primeiros anos de vida. Outro período decisivo é aquele de desenvolvimento das funções do paciente, que é a fase pré-escolar. Em geral, quanto mais precoce é a desnutrição crônica, mais intensas são as consequências sobre o crescimento e o desenvolvimento desse indivíduo.

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Ary Lopes Cardoso, pediatra e chefe da Nutrologia do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo, alerta para a necessidade de uma intervenção imediata por parte dos órgãos públicos no país: “Se essa situação política não for resolvida, você vai ver que essa geração que está desnutrida hoje, aos vinte anos de idade, vai ser uma geração realmente debilitada dos pontos de vista da saúde física e também mental e intelectual”.

A solução ideal em relação às crianças desnutridas, para ambos os especialistas, é uma intervenção imediata dos órgãos públicos de saúde nas condições de alimentação dos diagnosticados, com o fornecimento de nutrientes adequados para a idade desses pacientes: “Não é só dar proteína e caloria. É dar proteína, caloria, vitaminas e sais minerais e micronutrientes — todos fundamentais para o desenvolvimento do indivíduo”, completa Cardoso.

Ciclo vicioso

Um dos aspectos mais preocupantes da desnutrição crônica na infância é o comprometimento do sistema imunológico do indivíduo — o que pode causar diversas reações em cadeia no organismo das crianças, conforme explica o pediatra do Hospital das Clínicas.

— O desnutrido é um indivíduo suscetível. Ele corre o tempo inteiro risco de ter outras doenças, já que a falta de nutrientes compromete também o sistema imunológico do paciente. Há uma menor capacidade de resposta do organismo principalmente em relação às infecções. Consequentemente, há mais internações. Enquanto internado, ele pode voltar a se desnutrir, contrair infecções novamente e aí se estabelece um ciclo vicioso.

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O problema da fome no país é generalizado: no último ano, a população venezuelana tem sido obrigada a passar horas nas filas de supermercados para poder comprar alimentos básicos. Uma pesquisa realizada pela OVS (Observatório Venezuelano da Saúde), ONG que atua em parceria com a Universidade Central da Venezuela, de Caracas, revela que 73% da população no país perdeu peso no último ano. O estudo mostra também que os venezuelanos emagreceram, em média, 8,7 kg em 2016.

Ary Cardoso reforça que, do ponto de vista médico, os fatores envolvidos na equação ainda são muitos.

— O problema não é só a desnutrição infantil por falta de comida. É a pobreza, a falta de acesso a serviços básicos, a falta de higiene e todo um conjunto social e infeccioso. A Venezuela me parece um caso grave porque, diante das notícias às quais temos acesso, não há como vislumbrar, no momento, um fim para essa situação.

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