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Terror na Europa só terá fim com o término da guerra na Síria, diz especialista

Situação deverá se prolongar por muitos, já que interesse das potências só acirra o conflito

Internacional|Eugenio Goussinsky, do R7


Discurso das potências não tem surtido efeito para diminuir o terror
Discurso das potências não tem surtido efeito para diminuir o terror

Além do medo a incerteza. A sequência de atentados que tem assolado a Europa é reflexo de um mundo conturbado, onde o problema em uma região afeta necessariamente o bem-estar em outra.

A guerra na Síria e no Iraque, por exemplo, é um foco de inspiração, no mau sentido, tanto para lobos solitários quanto para células terroristas desferirem sua fúria, vinda de Estados falidos, em direção ao Ocidente, na opinião do professor de Relações Internacionais, Feliciano de Sá Guimarães, do Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo). E, pela proximidade territorial, a Europa acaba sendo a primeira vítima.

— Enquanto a situação da guerra da Síria não se estabilizar, no sentido de uma pacificação ou repartição do país, veremos essa onda de sobe e desce de atentados terroristas dessa natureza, ligados à situação pela qual passam a Síria e também o Iraque.

Qualquer guerra tem a capacidade enlouquecedora de fomentar ódio, em meio a ruínas empoeiradas de regiões já marcadas pela desigualdade. Ódio gera ódio e o perfume azedo da amargura acaba, querendo ou não, penetrando na atmosfera parisiense, ou qualquer outra, mesmo que esta abrigue inocentes com a pele impregnada de perfume francês. A mais recente página dessa história macabra ocorreu na última quinta-feira (17), quando uma van, provavelmente em ação orquestrada por um grupo de radicais islâmicos, atropelou centenas de pessoas na avenida Las Ramblas, em Barcelona, deixando pelo menos 14 mortos.

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Para Guimarães, somente as potências e outros países envolvidos não percebem o quanto esse ódio os fere, preferindo, por meio de seus governantes, o discurso permanente do não vamos desistir, vamos acabar com o terror. Permanente, mas inócuo, enquanto a situação do Oriente Médio, principalmente, não for melhor equacionada e as distâncias entre Ocidente e Oriente não começarem a ser atenuadas pelo diálogo e cooperação. E ele ressalta que não se refere a refugiados.

— Essa situação ainda vai perdurar por longos anos. E é injusto atribuí-la aos refugiados, que não podem de forma alguma serem relacionados ao terror. A proporção daqueles que aderem a tal prática é ínfima. A questão é que a guerra civil da Síria é cada vez mais uma guerra regional com controle global. Enquanto houver lados como do Irã, Estados Unidos e Rússia intervindo sistematicamente no território, com recursos materiais militares praticamente infinitos, em que qualquer ganho de um é a derrota de outro no combate pelo território, teremos uma guerra civil que não tem fim e se espalha para outros países na forma desses ataques.

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Guimarães diz: o Oriente Médio é o grande palco de poder mundial. Portanto, segundo tal convicção, não há como escapar. Neste organismo chamado Planeta Terra, quando um órgão (seja um país ou uma região) está doente, ele transmite essa patologia para outro aparentemente são. Las Ramblas, a ponte de Westminster, a romântica e contemporânea Paris pensam respirar a liberdade mas não o farão de verdade até que regiões muito distantes cultural e economicamente não a respirem também.

Mundo complicado

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O professor José Niemeyer, coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec no Rio de Janeiro, até concorda com essa premissa. Mas apenas em parte. Para ele, o fim do Estado Islâmico e o fim da guerra na Síria apenas acirrariam o terrorismo, já que, na opinião do especialista, o terror supera as dimensões de um Estado e, sendo absolutamente informal e irracional, busca outras alternativas para se manifestar.

Por outro lado, esta questão de "mundo doente" é altamente válida como explicação para os ataques de lobos solitários e para os planos maquiavélicos dos líderes de grupos organizados como o Estado Islâmico, na visão do professor. O termo doente diz respeito à desigualdade e, neste caso, a solução, muito mais do que política, é econômica.

E simples, se o mundo não fosse tão complicado como se mostra no momento, em que verdades similares à do estopim da Revolução Russa (1917) e às duas grandes guerras (1914 -1918 e 1939 - 1945) afloram não em conflitos entre nações, mas entre sociedades. O radicalismo, nesse caso não vem inicialmente dos terroristas, obviamente extremistas religiosos. Radical, porém, é a miséria de Estados falidos. Um país com instituições falidas, como se apresentam muitos do Oriente Médio e da África, gera descrença e insanidade, segundo o professor.

— Tais ataques são feitos por grupos ou pessoas que querem erodir o conceito de Estado. Eles vivem em Estados falidos, nas fronteiras, a questão não é nacional ou estatal. Um Estado falido é um Estado pobre, um laboratório de terroristas, que interpretam o mundo de maneira radical. Até nos Estados Unidos, mesmo sendo um Estado forte mas com crescimento de regiões mais pobres, tem ocorrido isso, com esses extremistas de direita.

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Niemeyer também considera a solução inexistente neste momento. A tese dele é a de que, em curto prazo, o problema só será amenizado com combates pontuais a focos terroristas. O controle mesmo só viria com projetos econômicos, de cooperação técnica internacional, políticas multilateralistas e grupos de integração regional, entre outras iniciativas.

— Ninguém tem tempo para fazer isso, a crise econômica dos países, as sociedades nacionais em erupção, não tem jeito, o mundo está cada vez mais complicado, com recursos cada vez mais finitos.

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Irônicas ou não - o que não ficou tão claro - as palavras de Niemeyer revelam a imobilidade dos países em relação aos reais problemas. Enquanto isso, os tiros pipocam nos morros, as bombas explodem em Idlib, carros atropelam sonhos de uma tarde de verão europeu. A esperança seria John Lennon. E ela mostra não ser tão utópica, porque, se ele morreu, a música Imagine continua viva.

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