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Mães escolhem a luta para enfrentar dor da incerteza

Fundadoras de entidades que buscam desaparecidos vivem o drama

São Paulo|Ana Cláudia Barros, do R7


Para Ivanise Esperidião, uma das fundadoras do Mães da Sé, Estado deveria dar amparo a famílias dos desaparecidos
Para Ivanise Esperidião, uma das fundadoras do Mães da Sé, Estado deveria dar amparo a famílias dos desaparecidos

“Quando vivi a minha busca isoladamente, cheguei à beira da loucura”. O desabafo é de Ivanise Esperidião da Silva, que três meses após o desaparecimento da filha, ajudou a fundar a ONG (organização não governamental) Mães da Sé, em 31 de março de 1996. Fabiana Esperidião da Silva sumiu em 23 de dezembro de 1995, com 13 anos de idade, a 120 m de onde morava, no bairro de Pirituba, zona oeste de São Paulo. Ela voltava da casa de uma colega de escola.

Inspirado no grupo Mães do Brasil — antigo Mães da Cinelândia —, do Rio de Janeiro, o movimento Mães da Sé foi criado e já cadastrou, em 17 anos, quase 10 mil desaparecidos de diferentes partes do País. Neste período, ajudou a encontrar 2.869 pessoas, 2.657 delas com vida.

— As pessoas nos chamam de Mães da Sé pelo fato de ficarmos nas escadarias da Catedral da Sé [centro de São Paulo], a cada 15 dias. Fazemos uma manifestação silenciosa com fotos e cartazes de nossos filhos desaparecidos, como forma de chamar a atenção da sociedade e das autoridades em relação à problemática do desaparecimento.

A entidade oferece ainda atendimento psicológico, social e jurídico.

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— No Estado, falta política pública que dê amparo psicológico, social e até mesmo financeiro para essas mães que, na busca pelos seus filhos, perderam seus empregos e começam a passar por dificuldade. O Estado que deveria dar esse respaldo, esse amparo.

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Ivanise, que é presidente da ONG, ainda não descobriu o paradeiro da filha.

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— A esperança é o que me mantém viva. Tenho certeza de que um dia vou encontrar uma resposta para o que aconteceu. Não é possível que alguém desapareça tão perto de casa. Tem que ter uma explicação. Não saber o que aconteceu, é isso que vai matando aos pouquinhos. Se está viva, por que ninguém nunca viu? Se está morta, cadê o corpo?

No grupo Mães em Luta, Vera Lúcia conta que dá enfoque especial na prevenção
No grupo Mães em Luta, Vera Lúcia conta que dá enfoque especial na prevenção Daia Oliver

Prevenção

A história de Ivanise se cruza com a de Vera Lúcia Ranu, outra fundadora do Mães da Sé e, atualmente, à frente da ONG Mães em luta, que criou no dia 8 de março de 2005. Em 12 de novembro de 1992, a filha dela, Fabiana Renata, então com 13 anos, sumiu a caminho da escola, no Jaraguá, na zona norte.

— Como Jaraguá era uma região, e ainda continua, de muito mato devido ao pico, a minha imaginação foi que alguém havia pegado minha filha, levado para fazer uma maldade. Então, que estava machucada ou até em situação pior. Mais nada a respeito dela foi encontrado. Até porque nem investigação foi feita na época.

No grupo Mães em Luta, Vera Lúcia conta que dá enfoque especial na prevenção. De acordo com ela, mais da metade dos casos de desaparecimentos que chega à entidade tem relação com conflitos familiares.

— A divulgação é extremamente necessária. Você não consegue encontrar sem a divulgação da imagem, mas a prevenção tem que ser trabalhada. É fazer com que as famílias identifiquem os conflitos familiares que podem estar tendo e por que eles estão acontecendo. Mostrar que não é só o filho do vizinho que pode desaparecer. Qualquer criança pode.

Ela relata que o trabalho é feito principalmente em comunidades carentes e escolas.

— Levamos às famílias, meios de informação de como identificar e como prever um desaparecimento. Uma criança quando desaparece por conflitos familiares é porque já estava se sentindo desparecida no âmbito familiar. Dali para a rua, é um pulo.

Desde sua criação, a entidade já cadastrou em torno de 2.000 pessoas de vários lugares do Brasil. Até agora, cerca de 300 desaparecidos foram localizados.

Ao falar sobre a esperança de encontrar Fabiana, Vera Lúcia se emociona e diz que o sentimento renasce e morre a cada dia.

— Eu me sinto como se fosse mãe de um filho morto-vivo. Ele é vivo na minha esperança de encontrar, na minha luta diária de buscar não só o meu, mas os outros também. Mas morto para o poder público, para a sociedade, que pouca atenção dão para essa situação. Não só a minha, mas de todas as famílias. Com o meu trabalho, busco renascer a cada dia. Cada vez que consigo encontrar ou identificar um [desaparecido], mesmo que não seja o meu, é uma felicidade enorme. E traz de volta essa consciência de que talvez Deus tenha me escolhido e falado: “Um trabalho você vai ter que fazer. Se não pela dor, pelo amor”. E é com isso que tenho vivido esses anos todos.

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