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Como protestos contra reforma previdenciária afetam Macron e a centro-direita na França?

Taxa de rejeição ao presidente francês, que é a mais alta desde o final de 2018 e o início de 2019, abre espaço para a oposição

Internacional|Sofia Pilagallo, do R7


Manifestantes protestam contra a reforma da Previdência nesta sexta-feira (14), em Paris
Manifestantes protestam contra a reforma da Previdência nesta sexta-feira (14), em Paris

O Conselho Constitucional da França aprovou nesta sexta-feira (14) — em meio a uma onda de protestos que já dura meses — medidas-chave da impopular reforma da Previdência do presidente Emmanuel Macron, como aumentar a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos até 2030. A popularidade de Macron caiu ao menor nível desde o final de 2018 e o início de 2019: 28%, o que representa queda de 9 pontos percentuais desde dezembro de 2022. O dado é de uma pesquisa do Instituto Ifop, encomendada pelo jornal francês Journal du Dimanche, divulgada em março.

Segundo especialistas ouvidos pelo R7, a avaliação negativa é puxada, principalmente, pela impopularidade da reforma da Previdência. Mas há um agravante: a invocação do artigo 49.3 da Constituição. A medida permitiu ao presidente aprovar a proposta sem passar pelo crivo da Assembleia Nacional (a Câmara dos Deputados Francesa), que representa a vontade do povo.

"O uso do artigo 49.3 não é inconstitucional, mas é pouco democrático", afirma o professor de Relações Internacionais James Onnig, das Faculdades de Campinas (Facamp).

"Macron não fez nada de ilegal. Mas uma democracia é o governo do povo, então é a vontade da maioria", diz a professora de Relações Internacionais Ana Carolina Marson, da Universidade São Judas Tadeu (USTJ). "Fazer uso de um artigo que dribla representantes do povo é muito pouco democrático."

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Para os professores, Macron está isolado politicamente e não tem mais o apoio do povo. Isso, claro, abre espaço para a oposição — seja ela de extrema-direita ou de esquerda. O presidente é hoje de centro, embora tenha sido criado em uma família com tendências políticas de esquerda e sido membro do Partido Socialista entre 2006 e 2009.

Onnig acredita que Macron "jogou fora" a força que a centro-direita havia conquistado devido a algum avanço na estabilização do país — grande parte pela capacidade que o Estado francês teve de gerenciar a gigantesca máquina social do país, uma das maiores da Europa. Agora, a tendência é que a centro-direita perca muitos eleitores, principalmente para a extrema-direita, que vem crescendo a passos largos no mundo todo.

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O levantamento do Ifop, citado no início deste texto, colocou Marine Le Pen, política de extrema-direita, no topo das intenções de voto no primeiro turno da próxima eleição presidencial, com 30% dos votos. Na sequência, aparecem Macron e o líder da esquerda radical Jean-Luc Mélenchon, empatados com 28%. O ex-primeiro-ministro Edouard Philippe, por sua vez, receberia 22% dos votos se o pleito fosse hoje.

Uma reportagem da rádio francesa RFI (Rádio Francesa Internacional) reforça esses dados. De acordo com o texto, analistas políticos franceses têm advertido que a aprovação da reforma da Previdência favorece a extrema-direita. Por mais contraditório que possa parecer, muitas pessoas que têm baixa qualificação e enfrentam problemas para chegar à aposentadoria já votaram na extrema-direita ou estão suscetíveis a fazê-lo.

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Qual é a justificativa do governo para implementar a reforma da Previdência?

O governo da França argumenta que a reforma é fundamental para evitar o colapso do sistema previdenciário, que deve gerar uma economia de 18 bilhões de euros (R$ 100 bilhões) até 2030. Segundo a professora Ana Carolina, da USTJ, o sistema está em colapso porque quem paga a previdência é a classe trabalhadora — e, nos últimos anos, a pirâmide etária se inverteu. Nos países europeus, de forma geral, menos bebês vêm nascendo, enquanto a população idosa vive mais devido aos avanços da medicina. Logo, não há cidadãos economicamente ativos suficientes para conseguir pagar a previdência de todos os aposentados.

O professor Onnig, das Faculdades de Campinas (Facamp), ressalta que a França é um dos países onde mais se gasta com previdência social no mundo. Pouco mais da metade do orçamento é destinado ao setor público. Isso, no entanto, não é algo negativo, uma vez que foi assim que a sociedade francesa conquistou acesso a bons serviços públicos e atingiu uma melhor qualidade de vida.

Onnig lembra que a França, historicamente, sempre defendeu muito as classes trabalhadoras. Nos anos 1980, o presidente da época, Fraçois Mitterrand, definiu que os franceses poderiam se aposentar a partir dos 60 anos. No começo dos anos 1990, houve uma reforma e essa idade passou a ser 62. Agora, Macron quer que as pessoas se aposentem aos 64 anos. Isso gera indignação não só porque a idade da aposentadoria imposta é mais avançada, mas também porque as condições de trabalho em 1980 não eram tão precárias como as de atualmente.

À época, as pessoas menos qualificadas trabalhavam em indústrias e em parte do comércio. Hoje, os mais afetados pela reforma serão os jovens do setor precarizado e sem capacitação técnica, que trabalham, em sua maioria, em aplicativos de forma informal.

Para o professor, uma alternativa à reforma da Previdência, sugerida por muitos economistas, passa pela taxação das grandes fortunas. Não por acaso, na quinta-feira (13), manifestantes invadiram a sede do grupo Louis Vuitton, em Paris, em ato simbólico para exigir que os ricos contribuam mais para financiar a pensão do Estado.

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