Em coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira (22) para apresentar o balanço da participação do Brasil na COP-26 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática), que ocorreu em Glasgow (Escócia), ministros do governo Jair Bolsonaro criticaram proposta feita pela União Europeia, que ainda não foi aprovada, de proibir a importação de mercadorias ligadas ao desmatamento.
"Acho inaceitável e inadmissível fazer esse tipo de movimento, especialmente no tema clima. Não acho que deva fazer políticas unilaterais, impondo regras de um bloco ou de um país sobre outro país quando o tema for clima. Isso tem que ser feito em consenso multilateral para garantir a soberania nacional", afirmou Joaquim Leite, ministro do Meio Ambiente.
"Protecionismo climático. Cacau é cultura que faz no meio da floresta e refloresta com ele. Café também ajuda a proteger. Então tem alguma coisa errada aí. Essa proposta tem que ser revista", complementou Tereza Cristina, ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
A proposta foi feita pela Comissão Europeia e tem o objetivo de impedir a importação de commodities ligadas ao desmatamento, e exigir que as empresas provem que suas cadeias de oferta globais não estão contribuindo para a destruição das florestas.
A lei proposta pelo órgão executivo da União Europeia estabelece regras obrigatórias a importadores de soja, carne bovina, óleo de palma, madeira, cacau, café e alguns produtos derivados, incluindo couro, chocolate e móveis.
O não cumprimento pode resultar em multas de até 4% do faturamento de uma empresa em um país da União Europeia. Se a lei for aprovada pelos governos da UE e pelo Parlamento Europeu, as empresas que operam nos 27 países terão de mostrar que as mercadorias especificadas foram produzidas de acordo com as leis do país produtor.
Relatório sobre desmatamento
O Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) divulgou que, entre agosto de 2020 e julho de 2021, foram desmatados 13.235 quilômetros quadrados da Amazônia Legal, o maior volume em uma década e meia e 21,97% maior que o registrado no mesmo intervalo de 12 meses anterior.
O documento, no entanto, está datado de 27 de outubro, o que levantou suspeitas de que o governo poderia ter escondido o salto no desmatamento por 22 dias e feito sua divulgação apenas depois da COP26.
Questionado se, de fato, recebeu o documento e segurou a publicidade antes do principal evento sobre o clima do mundo, o ministro do Meio Ambiente negou e avalia como "irrelevante informar esse número [de desmatamento] antes ou depois [da COP26]".
"Não. Eu tive o contato no mesmo dia que vocês tiveram contato. Eu acho que é uma desinformação essa matéria. O que aconteceu foi que os dados do Deter, no mesmo período, de agosto a julho, anunciados pelo vice-presidente Mourão em agosto, indicavam uma redução de 5%. O mesmo período que foi anunciado pelo Prodes [Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite] veio com 22% a mais. Por causa dessa diferença o Inpe deve ter tido a cautela de revisar os dados e os anunciou no dia 28", disse.
Joaquim Leite conta que, durante a COP26, nenhum país iria apontar as fragilidades de outra nação, uma vez que buscam consenso sobre um tema muito complexo. "Então seria irrelevante informar esse número antes ou depois, porque o que estávamos buscando era um consenso multilateral para o grande desafio de alcançar a neutralidade de emissões de efeito estufa até metade desse século. O contato que nós tivemos com os dados foi a mesma data em que foram apresentados a sociedade", acrescentou.
Meta de US$ 100 bilhões
Em 2009, grandes economias mundiais prometeram a doação de US$ 100 bilhões a países pobres a partir de 2020, o que ainda não ocorreu. Os recursos seriam usados para ações que reduzam a emissão de gases de efeito estufa. Lideranças conversaram sobre o assunto na COP26, mas o tema não avançou. O ministro do Meio Ambiente avalia que foi uma "gigantesca frustração" para todos.
"Nada mais injusto do que proibir, reduzir, mas não dar capacidade financeira e tecnologia para um país. Os países desenvolvidos — industrializados e maiores poluidores — não se prepararam para essa conferência do clima. Eu tive reuniões em que o país falou que precisaria passar no Parlamento e ver se daqui a três anos o recurso ia estar disponível. Infelizmente, isso foi uma frustração de todos, que os países desenvolvidos, principalmente os do G7, que historicamente foram os maiores poluidores de gases estufa, não fizeram a lição de casa, não chegaram lá para colocar um volume robusto de mais de US$ 100 bilhões de dólares".
Brasil e US$ 10 bilhões
O ministro do Meio Ambiente informou que, por outro lado, o mercado global de créditos de carbono pode ser uma alternativa — as cotas são estipuladas em tratados ambientais, como o Acordo de Paris. Cada país determina um número-limite de emissão de gases de efeito estufa num determinado período e, caso ultrapasse o valor acordado, compra cotas restantes de países que possuam crédito. Joaquim Leite estima que o país deve se beneficiar com US$ 10 bilhões ao ano.
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"Tivemos uma outra forma de financiamento que é o mercado global de créditos de carbono, que deve gerar US$ 50 bilhões de dólares e o Brasil deve se beneficiar em US$ 10 bilhões — para transformar projetos inviáveis economicamente, mas sustentáveis e de baixa emissão, e projetos viáveis economicamente, podendo exportar 10 bilhões de toneladas de carbono equivalente para viabilizar projetos de energia renovável e agricultura sustentável", disse.
Negociações
O ministro Carlos França, das Relações Exteriores, também esteve presente na coletiva de imprensa. De acordo com o titular, o país teve papel central nas negociações para finalização do livro de regras do Acordo de Paris.
"O Brasil atuou como articulador de consensos, nas discussões sobre o marco fortalecido de transparência, sobre marcos temporais comuns e sobre o artigo 6º", contou.
*Com informações da Reuters e Agência Estado