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Rússia e Ucrânia: uma guerra de independência adiada

Conflito armado deixou nesses cinco anos mais de 10.300 mortos e centenas de milhares de deslocados, segundo a ONU

Internacional|Da EFE

Conflito entre os países já deixou mais de 10 mil mortos, segundo a ONU
Conflito entre os países já deixou mais de 10 mil mortos, segundo a ONU

O conflito armado no leste da Ucrânia, que completou cinco anos nesta sexta-feira (12), é para o governo e muitos cidadãos do país uma espécie de extensão da declaração de independência feita em 1991, em meio ao colapso da União Soviética (URSS).

"Todos sabemos que a atual guerra russo-ucraniana é uma guerra pela independência da Ucrânia", escreveu no Twitter o presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, que concorre à reeleição no pleito que será realizado no próximo dia 21.

As tensões entre Kiev e Moscou não começaram há cinco anos, mas sim logo após a derrocada do império soviético, com o Tratado de Partição sobre o Estatuto e as Condições da Frota do Mar Negro e, mais tarde, com a "guerra do gás", que provocou a suspensão temporária do fornecimento de gás pela Rússia a consumidores europeus.

Desde o início, a Ucrânia se posicionou como um país disposto a assumir um protagonismo próprio e a se distanciar do passado soviético, tanto que nunca chegou a ratificar os estatutos da Comunidade de Estados Independentes (CEI), projetada como um mecanismo de integração das repúblicas que surgiram das ruínas da URSS.


"A Ucrânia não é a Rússia", é o eloquente título de um livro publicado em 2003 pelo segundo presidente ucraniano, Leonid Kuchma, para explicar a diferença de mentalidade dos cidadãos dos dois países.

Além disso, desde os primeiros dias de independência, a Ucrânia via a Europa como uma referência alternativa à Rússia pós-soviética, mas sem abandonar sua neutralidade e sem deixar de aproveitar, em benefício próprio, sua situação de ponte entre os dois polos geopolíticos.


A Revolução Laranja

No entanto, este frágil equilíbrio foi rompido em 2004 com a chamada "Revolução Laranja", que frustrou uma tentativa de fraude eleitoral para levar à presidência da Ucrânia Viktor Yanukovich, um político do leste do país — de maioria russófona — e cuja candidatura contava com o apoio aberto de Moscou.


A repetição das eleições presidenciais deu a vitória a Victor Yuschenko, um político que reorientou a Ucrânia para a integração com a União Europeia (UE), que lhe ofereceu um Acordo de Associação imediatamente depois da guerra russo-georgiana de agosto de 2008.

À luz dos acontecimentos no Cáucaso, o então presidente francês, Nicolás Sarkozy, enfatizou que "a integridade territorial da Ucrânia é inegociável".

A frustrada tentativa de se voltar para a Rússia

Menos de dois anos depois, em fevereiro de 2010, Yanukovich venceu as eleições e assumiu a presidência da Ucrânia. Em 2013, suspendeu a assinatura do Acordo de Associação com a UE, uma decisão que provocou uma insurreição popular, que culminou com a fuga do presidente para a Rússia, onde se encontra refugiado até hoje.

A derrocada de Yanukovich e o temor de uma ascensão dos ultranacionalistas ucranianos desencadearam uma campanha de desobediência civil na região da Crimeia e no leste do país, que na península se traduziu na convocação de um plebiscito sobre sua incorporação à Rússia.

Em 16 de março de 2014, em meio a uma enorme mobilização de militares sem distintivos, "homens de verde" e "pessoas amáveis" segundo a imprensa russa, ou "forças de ocupação" de acordo com os veículos de imprensa ucranianos, aconteceu a consulta popular, declarada ilegal por Kiev e pela comunidade internacional.

Segundo os organizadores do plebiscito, 96% dos eleitores apoiaram a incorporação da península à Rússia, que formalizou a anexação da Crimeia e do porto de Sebastopol.

O exemplo da Crimeia se estendeu para as regiões de Donetsk e Lugansk, onde separatistas pró-Rússia receberam reforços de voluntários procedentes do país vizinho, mas, desta vez, as novas autoridades ucranianas mobilizaram suas forças armadas para conter a insrreição.

O início do conflito armado

Ruínas em Semiónovka, província de Donetsk: marcas da guerra ainda são visíveis
Ruínas em Semiónovka, província de Donetsk: marcas da guerra ainda são visíveis

As ações militares começaram em abril e se prologaram de forma violenta até fevereiro de 2015, quando foram assinados os acordos de Minsk para solucionar o conflito, que nunca chegaram a ser cumpridos, mas ajudaram a reduzir a intensidade dos confrontos armados e a estabilizar a linha da frente.

Segundo Kiev, os separatistas das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk contam com o apoio 'in situ' de unidades regulares do exército russo.

Mas o presidente russo, Vladimir Putin, insiste em afirmar que não há soldados russos no leste ucraniano e que se trata de um "conflito exclusivamente interno", provocado por Kiev por não respeitar as aspirações da população russófona.

Além disso, Moscou explicou que a presença de militares russos na região do conflito, que foram capturados pelas forças ucranianas, não tem caráter oficial, mas privado, e que os mesmos lá estavam de férias.

"Nada menos que 27% do potencial industrial das regiões de Donetsk e Lugansk, os equipamentos que estavam nas fábricas ucranianas, foi desmontado e levado para a Rússia", denunciou Poroshenko um ano depois da explosão do conflito.

As vítimas e os danos causados pela guerra

O conflito armado deixou nesses cinco anos mais de 10.300 mortos e centenas de milhares de deslocados, segundo a ONU.

Além disso, o Ministério da Defesa da Ucrânia calculou em 2017 em US$ 50 bilhões os danos causados pelas ações militares no leste do país.

A Ucrânia também quer que um grupo internacional de trabalho quantifique os prejuízos causados pela anexação da Crimeia e pelo conflito na região do vale do rio Donets.

Esses cálculos, segundo o presidente do Tribunal de Contas ucraniano, Valeri Patskan, podem ser utilizados como provas em futuros processos nos tribunais internacionais.

Para a Rússia, a anexação da Crimeia e o conflito no leste da Ucrânia também custaram caro: a UE, os EUA e outros países impuseram uma série de sanções que prejudicaram seriamente sua economia.

Segundo uma pesquisa da organização independente russa Grupo de Especialistas Econômicos, apenas entre 2014 e 2017 a Rússia perdeu cerca de US$ 170 bilhões com as sanções.

Cinco anos depois, não há sinais de solução

Exército ucraniano faz demonstração em escola na cidade de Mariupol
Exército ucraniano faz demonstração em escola na cidade de Mariupol

Quatro anos depois da assinatura dos acordos de Minsk, a solução para o conflito segue em ponto morto.

A Ucrânia insiste que, primeiro, é preciso que sejam cumpridas certas medidas de segurança: a recuperação do controle ucraniano do trecho de fronteira com a Rússia na região de conflito e a retirada de todas os grupos armados ilegais.

Para os separatistas pró-Rússia, que exigem primeiro conversas diretas com o governo de Kiev, isso significaria abrir mão das provisões que recebem da Rússia.

"A chave para a paz está no Kremlin", disse Poroshenko diversas vezes, enquanto em Moscou as autoridades afirmaram que não haverá solução enquanto políticos "russófobos" estiverem no poder em Kiev.

O último sinal de que não haverá uma solução em breve foi o incidente armado entre Ucrânia e Rússia no Mar Negro em novembro do ano passado - o primeiro em que Moscou reconheceu a participação de seus militares. Na ocasião, a guarda costeira russa, após abrir fogo, capturou três embarcações ucranianas e seus 24 tripulantes.

"Senhor Putin, isto é uma agressão. Senhor Putin, isto é guerra. Não é uma piada, não é um incidente nem uma crise", disse então Poroshenko em mensagem destinada ao chefe do Kremlin.

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