"A solidão me protege", diz único morador de cidade, sobre pandemia
Pedro Meier é proprietário de uma mercearia que vende produtos a viajantes ou moradores de povoados próximos, em um vilarejo argentino
Internacional|Eugenio Goussinsky, do R7
Escondida no meio da Sierra de la Ventana, a pequena cidade de Quiñihual, na Argentina, mal pode ser encontrada no mapa. Em determinado momento, o jornalista e escritor Leandro Vesco, na primeira vez que foi lá, teve de usar a intuição para, onde a orientação do Waze e do Google Maps perdem o alcance, chegar ao local e entrevistar Pedro Meier, o único morador do centenário vilarejo, cujo nome homenageia um cacique que habitava a região.
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Meier é proprietário de um farto armazém que vende produtos e alimentos básicos para viajantes e moradores da região, como pão, macarrão, arroz, grama, leite, alpargatas, vinho e cana, conforme contou Vesco em artigo do La Nación.
Mas, que nestes tempos de pandemia, teve a clientela zerada. Ela se reunia em pequenos grupos, alguns de passagem e outros vindos de cidades próximas, como Coronel Pringles (30 km) ou Coronel Suárez (50 km).
Durante o dia, Meier passou a viver exatamente como quando chega a noite: na solidão, preenchida somente pelo seu fiel cão doberman, Moncho. Ele disse ao jornalista que, por isso, não teme a contaminação pelo novo coronavírus.
"Sinto que a solidão me protege. Eu vejo na televisão tudo o que está acontecendo, há medo nos campos, ninguém quer ir à cidade", afirma. Neste momento, ele nem pode mais receber a visita de sua esposa, que mora em Pigué, a 100 km.
Vesco é autor de livros como Desconocida Buenos Aires - Secretos de una província e Desconocida Buenos Aires - Historias de fronteras. Também é fundador da ONG Proyecto Pulpería, que trabalha na recuperação de pequenos povoados. Ao R7, ele falou sobre a preseverança de Meier e seu nobre apego à terra.
"Pedro resiste em silêncio em seu armazém, em seu povoado, com suas histórias. Vive ali desde pequeno e sente falta do trem, que deixou de passar na década de 90", conta.
Para Vesco, Meier acaba simbolizando uma maneira de viver, marcada por uma simplicidade, que vem se perdendo com o avanço tecnológico, mas que não deixa de ser preciosa.
"Suas recordações e seu inseparável cachorro Moncho o acompanham. Ele gosta de viver na solidão. Representa o homem do campo, o gaúcho que tem um amor muito grande por sua terra", completa.
Meier, ao longo de seus 63 anos, testemunhou as mudanças, muitas vezes para pior, que a influência humana provoca nas regiões. Sua vida acabou se tornando um verdadeiro aprendizado sobre geografia, ecologia, economia e história desta cidadela, localizada a 560 km de Buenos Aires.
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O solitário comerciante viu a região ganhar habitantes com a chegada da ferrovia e ser esvaziada em função do plantio de soja, que tomou conta de várias áreas. E com a desativação da própria ferrovia.
Agora, está vendo o impacto provocado pela pandemia, cujo surgimento também teve a contribuição dos maus hábitos dos seres humanos.
Meier só consegue se comunicar pelo celular, quando sobe para regiões mais altas da cidade. As tentativas de ligação do R7 não foram completadas.
"Restaram somente nós, que moramos no campo", comenta no artigo, orgulhoso de sua vida rural.
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