Um dia depois de o governo ter apresentado ao Congresso a nova regra fiscal (também chamada de arcabouço fiscal), os juros tiveram uma forte alta, devido a preocupações do mercado, principalmente de investidores do exterior, com o cumprimento das medidas propostas, em meio a um movimento global de fuga de ativos de risco. A taxa do DI (Depósito Interfinanceiro) para janeiro de 2024 chegou ao fim da tarde desta quarta-feira (19) em 13,275%, ante 13,25% do ajuste anterior. Perto do fechamento, o mercado previa apenas 4% de chances para uma redução de 0,25 ponto porcentual na taxa Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira, em maio. A quarta-feira (19) começou com dados do Reino Unido que mostravam uma inflação anualizada de 10,1% em março, acima dos 9,8% que haviam sido projetados por economistas e dos 9,2% esperados pelo banco central daquele país. Esse dado, juntamente com as declarações James Bullard, presidente do Federal Reserve Bank of St. Louis, na terça-feira (18), em que defendia juros mais altos nos Estados Unidos, criaram um ambiente de aversão a ativos de risco em todo o mundo, logo no início da manhã. Foi esse o impulso inicial para a elevação das taxas dos DIs no Brasil. No entanto, também houve uma reação negativa dos investidores à apresentação da nova regra fiscal do governo ao Congresso. Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, a proposta do arcabouço não trouxe mecanismos robustos para assegurar o retorno das contas públicas a uma trajetória sustentável. “O que mais incomoda é o fato de não haver responsabilização no caso de as metas fiscais não serem atingidas. É um grande incentivo para elevar a carga tributária. A estratégia está bem clara: não vai haver corte de despesas, e o arcabouço dependerá das receitas”, avaliou. A lei do teto de gastos, juntamente com a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), estabelecia punições para o não cumprimento dos parâmetros. Na nova proposta, a punição é branda, afirmam especialistas. O economista-chefe e sócio da Ryo Asset, Gabriel Barros, disse que, de acordo com o novo modelo, se o governo descumprir as metas de superávit primário (o resultado positivo de todas as receitas e despesas do governo, excetuando-se gastos com pagamento de juros), o limite de crescimento do gasto passa a ser de 50% da receita, e não mais de 70%. “Ou seja, a despesa pode continuar subindo”, destacou. Ele observa que, na forma como foi apresentado, o arcabouço não é matematicamente factível. Em seus cálculos, se não houver um forte aumento de arrecadação em todos os anos, a conta não vai fechar. “O mercado resolveu fazer contas nesta quarta-feira”, comentou Barros, em referência ao avanço firme dos juros futuros e do dólar no Brasil. “Fazendo as contas, [percebe-se que] entregar uma meta de primário seria muito difícil, teria que haver surpresa de arrecadação todo ano. E a dinâmica de crescimento das despesas não se sustenta.” Nesse cenário, além de a taxa do DI para janeiro de 2024 subir para 13,275%, ante os 13,25% do ajuste anterior, a projeção para janeiro de 2025 foi para 12,12%, acima dos 11,981% previstos anteriormente. Entre os contratos mais longos, a taxa para janeiro de 2026 estava em 11,94%, ante 11,745% do ajuste anterior, e a taxa do DI para janeiro de 2027 ficou em 12,085%, ante 11,826%. Perto do fechamento do mercado, a curva a termo (a curva da taxa de juros) previa poucas chances de o BC (Banco Central) reduzir a Selic no próximo encontro do Copom (Comitê de Política Monetária), que será realizado em maio, e 96% de probabilidade de ele manter a taxa em 13,75% ao ano. No exterior, os retornos dos Treasuries (tipo de investimento em títulos do Tesouro americano, equivalente ao Tesouro Direto do Brasil) continuaram em alta, refletindo a perspectiva de que o Federal Reserve possa manter sua política monetária de aperto por mais tempo. Às 16h38 (horário de Brasília), o rendimento do Treasury de dez anos, que é a referência global para as decisões de investimento, subia 3,20 pontos-base, a 3,6042%.