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Interromper tratamento da depressão durante a gravidez pode prejudicar a saúde da mãe e do bebê

"Não deveria haver tanta mulher sofrendo sem necessidade", diz psiquiatra Joel Rennó

Saúde|Marta Santos, do R7

Entre 15% e 30% das brasileiras enfrentam ou enfrentarão a depressão em algum momento das suas vidas
Entre 15% e 30% das brasileiras enfrentam ou enfrentarão a depressão em algum momento das suas vidas

A depressão é uma das doenças psiquiátricas que mais atingem as mulheres. Entre 15% e 30% das brasileiras têm ou enfrentarão a depressão em algum momento das suas vidas, taxa duas a três vezes maior do que nos homens. O quadro pode se tornar ainda mais delicado quando a doença surge ou ressurge durante a gestação.

Porém, muitas mulheres sentem receio de tratar a depressão na gravidez por medo de que os medicamentos possam prejudicar o desenvolvimento do feto. No entanto, a interrupção do tratamento pode ser ainda mais perigosa, explica o professor da FMUSP (Faculdade de Medicina da USP Universidade de São Paulo) Joel Rennó. 

— De forma geral, parar o tratamento pode ser mais perigoso do que seguir com ele sendo adaptado e reajustado. É claro que há um risco e é necessário ter acompanhamento de um psiquiatra, mas não deveria haver tanta mulher sofrendo durante a gravidez sem necessidade. É preciso avaliar sempre os riscos e benefícios do tratamento, porque a própria depressão não tratada pode oferecer riscos ao feto. As grávidas deprimidas não fazem o pré-natal adequado, o bebê tem crescimento intrauterino restrito, pode nascer com baixo peso, parto prematuro. O ideal seria fazer um tratamento multiprofissional, com o psiquiatra e o obstetra, mas, na prática, a gente ainda não vê isso.

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No geral, o tratamento da depressão é feito com remédios antidepressivos. Nos quadros leves a moderados, muitas vezes, não é necessariamente preciso usar os medicamentos, apenas terapia cognitiva comportamental e a interpessoal podem dar resultados similares aos do uso de medicamentos. Já em casos mais graves, a opção farmacológica é essencial, diz Rennó. 


— O tratamento, feito de forma adequada, melhora da qualidade de vida das mães e traz uma gestação mais saudável. No Brasil, é frequente a mulher saber que está grávida e parar a medicação sem consultar um médico psiquiatra, que entenda daquela medicação. Às vezes, isso acontece até mesmo por indicação do obstetra que, muitas vezes, não tem uma atualização sobre o tema.

Segundo o psiquiatra, três em cada quatro mulheres que abandonam o tratamento durante a gravidez têm recaídas.


— Por isso, não é aconselhável que uma mulher estabilizada abandone o medicamento durante a gravidez. Mesmo que essa paciente não tenha depressão durante a gravidez, ela ainda poderá ter no pós-parto, e essa pode ser uma recaída forte, que até prejudique ela de ficar com a criança. Se a mulher não interage com o bebê nos primeiros meses, o bebê pode ter, por exemplo, um desenvolvimento psicomotor atrasado, se desenvolver de forma mais lenta em termos de linguagem, pode ser que essa criança tenha também depressão no futuro.

Rennó alerta também que muitas mulheres fazem uso de substâncias cotidianas que podem ser ainda mais perigosas para o feto.

— Muitas vezes, as pessoas acham que tudo que vem da terra, fitoterápico, é bom. Mas não é bem assim, porque tem algumas substâncias como o chá de boldo que tem propriedades abortivas. A erva de São João, que é um antidepressivo natural, oferece 8% de risco de má-formação congênita. É preciso ter cuidado, até porque essas substâncias não são muito estudadas. É até pior do que medicamentos para tratar medicação.

Quando e por que a doença surge?

Mulheres que já tiveram depressão em algum momento da sua vida têm maior chance de ter uma recaída durante o período gestacional, mas outras também podem apresentar um primeiro período de depressão. Rennó afirma que é preciso ficar atento aos sintomas.

— Na depressão, a gente tem dois sintomas prioritários: o humor deprimido e a anedonia, que é a perda de prazer ou interesse em atividades habituais, sejam relacionadas a família, trabalho ou lazer. Além disso, a mulher pode sentir ansiedade, irritabilidade, dificuldade de atenção ou de memória, perda ou excesso de apetite, compulsão por doces, insônia ou sonolência, pensamentos negativos, baixa alto-estima. Esses sintomas precisam estar presentes por um período de, no mínimo, duas semanas.

De acordo com o psiquiatra, existem alguns fatores que aumentam a incidência da doença.

— Entre os fatores de risco para a depressão antenatal [antes do nascimento] estão a pobreza, sem dúvida mulheres de países em desenvolvimento são muito mais vulneráveis do que mulheres de países desenvolvidos; dificuldade de relacionamento ou falta de apoio do parceiro; mães solteiras ou divorciadas também têm um risco maior de ter depressão na gravidez. Outra população importante são as mulheres que foram vítimas de violência física, psicológica ou sexual. Uma atitude negativa em relação à gravidez também aumenta as chances de ter depressão antenatal, por exemplo, em casos de gravidez não planejada. Também existem fatores obstétricos que podem contribuir, como um histórico prévio de aborto.

Onde buscar ajuda?

Gestantes e mulheres no pós-parto que tenham histórico de problemas psiquiátricos ou que não estejam se sentindo bem com a gravidez devem procurar ajuda. Rennó é diretor do ProMulher, um programa de saúde mental da mulher do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de USP (Universidade de São Paulo), na capital de São Paulo, que atende pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

— Muitas pessoas sofrem caladas porque não sabem que existem um programa especializado nesse assunto e ainda mais pelo SUS. É uma pena porque as mulheres ficam sofrendo durante a gravidez, não interage com a criança no útero e nem depois do parto. É uma tortura para essas mulheres, só quem passa é que sabe.

O ProMulher foi o primeiro programa do Brasil especializado em saúde mental da mulher. Ele existe desde 1993 e atende, em média, 800 mulheres por ano.

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