Amizade com cão ajuda menino com paralisia cerebral a voltar a falar
A solidariedade ajudou Henrique em São Paulo, mas, distante do cão, ele só melhorou mesmo quando um grupo de pessoas trouxe o animal do Paraná
Brasil|Eugenio Goussinsky, do R7
Por alguns meses, Henrique Gabriel Muraro, de seis anos, teve uma recaída em sua recuperação. O menino nasceu com paralisia cerebral, epilepsia e falta de monitoramento psicomotor. Chegou a apresentar uma boa evolução, principalmente depois de mudar para o Estado de São Paulo, onde, em Osasco, passa por tratamento na AACD.
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Mas, justamente aquilo que havia impulsionado a sua terapia, não estava mais presente. Ausência fez o menino voltar a viver momentos de desânimo. Afinal, estava longe de seu cãozinho, Pipo.
Foi o pequeno animal, no início de 2018, que trouxe a certeza de que havia saída para o menino. Henrique estava praticamente sem tratamento, morando em sua cidade natal, Almirante Tamandaré (PR). Pipo foi lhe dado como um presente, de uma prima.
O carinho entre ambos fez Henrique evoluir muito e serviu como um impulso. Uma verdadeira terapia inicial, que motivou a mãe, Marislaine Muraro, de 43 anos, conhecida como Mari, a vislumbrar uma cura para o filho.
Quando o irmão mais velho de Henrique, Rodrigo, divulgou nas redes sociais o vídeo de Pipo esperando o menino na porta de casa, para pular dentro no ônibus e sair com ele na cadeira de rodas, a cena, corriqueira, viralizou.
Acontece que, quando se transferiram definitivamente para São Paulo, em setembro último, mãe e filho se depararam com dois obstáculos. O primeiro, a falta de recursos. E o segundo, a falta de Pipo, que teve de ficar no Paraná.
Sem o cachorro, Henrique aproveitou apenas parcialmente o tratamento iniciado na AACD de Osasco, conforme conta Mari.
"Ele havia melhorado por causa do cachorro. Era a única terapia que meu filho tinha. Isso motivou outras terapias e me fez acreditar ainda mais na recuperação dele, a ponto de lutar com mais força por um tratamento adequado em São Paulo."
Mari conta que, para chegar a São Paulo, acionou a Justiça em busca de um tratamento pago pelo poder público. E isso em parte tem ocorrido, segundo ela.
Ausência do cachorro
Mas, como o cachorro ficou a maior parte do tempo em Almirante Tamandaré, com Ronaldo - marido de Mari, que é motorista de ônibus escolar - e Rodrigo, Henrique perdeu a motivação. Tinha saudades daqueles olhinhos de ébano reluzindo alegria em meio à pelagem branca, mistura de yatsu com poodle.
Naquele momento, o fator solidariedade começou a prevalecer. Mari só conseguiu ficar em Osasco com Henrique, porque recebeu ajuda. Primeiro de um policial, a quem conheceu logo que chegou, com o filho em cadeira de rodas, apenas com as malas. O policial dividiu com um grupo de colegas o pagamento das diárias de um hotel.
Dias depois, procurando um lugar para alugar, Mari, por meio de uma placa de anúncio, se deparou com o sr. Joel Faustino de Oliveira, o Manduri, dono de um pequeno escritório de negócios imobiliários no bairro Presidente Altino, Osasco. Por coincidência, ele era conhecido do policial, que o indicou.
Junto com sua família (os filhos Joel Júnior, Luciana e Patrícia Keller, entre outros), Manduri se sensibilizou com a situação de Henrique e, rapidamente, conseguiu, com a comunidade local, dividir o aluguel de cerca de R$ 1,2 mil mensais de um apartamento de dois dormitórios para Mari e Henrique.
"Estávamos em uma situação desesperadora. Tínhamos a aprovação do tratamento pela AACD, mas nem sabia onde iria ficar. Está dando certo por causa da solidariedade das pessoas. Não teríamos recursos para custear tudo, nosso rendimento não é suficiente para isso", conta Mari.
Manduri e a família se mostram dispostos a permanecer ao lado da mãe e do filho também no tratamento.
"Alugamos um apartamento para os dois, e demos para eles o que é preciso para se ter uma vida normal. Estamos mobiliando o apartamento e comprando roupas, dando toda assistência necessária para uma vida digna."
Solidariedade e evolução
Apesar de toda a solidariedade, a questão da distância do cachorro atrapalhava. Manduri, então, conseguiu, novamente, dividir com outros voluntários o custo do frete do animal, em uma carreta, para Osasco. A chegada de Pipo fez Henrique voltar a sorrir. E, desta vez, Oliveira foi a testemunha.
"A ligação entre os dois é muito estreita. O cachorrinho fica ao lado dele, apoia a com a boca a perna do menino, é um negócio impressionante, ajudou muito a recuperar uma série de coisas, inclusive a falar. É uma terapia, é muito importante."
O tratamento - que inclui fisioterapia, fisiologia, terapia ocupacional, hidroterapia e ecoterapia - ficou mais eficiente e Henrique foi evoluindo cada vez mais, conforme afirma Mari.
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"Ele evoluiu 90%, faz coisas que eu nem imaginava. No início, o diagnóstico era pessimista. Os médicos me falavam que dificilmente ele iria falar ou se movimentar. Hoje ele já fala algumas sílabas e acredito que irá andar. A presença do Pipo foi fundamental para tudo isso. Além do tratamento, é claro. Mas sem o cachorro não seria a mesma coisa. Ele fica desanimado. Agora, meu sonho é ver meu filho independente, conseguindo andar", diz a mãe.
Mas ela ainda vê dificuldades.
"Se não fosse a ajuda, estaríamos muito atrasados. Ele melhorou bem, já não tem tanta queda de imunidade, se movimenta mais. Mas, se por um acaso não tivermos mais as consultas, tudo voltará à estaca zero. Ainda está difícil."
O próximo passo é a compra de um andador, específico para o caso de Henrique, no valor de R$ 16 mil. Manduri já está organizando outra vaquinha e diz estar próximo de comprar o aparelho, que não é disponibilizado pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e a AACD não possui, segundo conta.
"O Henrique experimentou o equipamento e começou a andar nele. Fiquei sensibilizado com esse menino, ele tem um encanto especial. Em pouco tempo criei uma afeição enorme. Quero ajudar da maneira que puder. E, com minha família e amigos, estamos conseguindo. Não sossegarei enquanto não ver esse menino andar. E ele vai conseguir."
Benefícios reais
De acordo com dados do site do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), Henrique passou por uma espécie de pet terapia, que depois evoluiu para algo semelhante a uma TAA (Terapia Assistida por Animais).
E, baseado no estudo dos especialistas Johannes Odendaal e Susan Iehmann, em 2001, na África do Sul, o texto ressaltou.
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"Dentre as substâncias (que beneficiam o paciente no contato com o animal), há a produção de dopamina, endorfina, prolactina, oxitocina e outros hormônios ligados ao prazer, ânimo e sensação de bem-estar, além da diminuição do cortisol, hormônio do estresse. Com isso, o contato entre animais e seres humanos gera melhoras emocionais, físicas, sociais e cognitivas."
Quando o menino melhora, ele ajuda também quem o cerca. Mari voltou a sorrir com a evolução do filho. E o próprio Manduri, que o conheceu apenas meses atrás, sentiu que um novo vínculo foi estabelecido em sua vida.
Recompensa por isso? Manduri já tem. E revela qual é, orgulhoso. Uma das sílabas que Henrique aprendeu a falar, com a ajuda do cãozinho, foi "vô".
É assim que o garoto passou a chamar Manduri, numa maneira bem mais afetuosa do que apenas dizer muito obrigado.
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