Parlamentares se articulam para derrubar decreto de Bolsonaro sobre Silveira
Congressistas propõem ações no Supremo e decreto legislativo para sustar a decisão do presidente
Brasília|Renato Souza, do R7, em Brasília
![Câmara decide manter a prisão de Daniel Silveira em fevereiro de 2021](https://newr7-r7-prod.web.arc-cdn.net/resizer/v2/FWOPYNQFCBLRVIAUKAG5OBKK2E.jpg?auth=bfab22eb8b3ff8da85f2e68994217d54aaeb947144b41c721913542c706a1cfb&width=1000&height=667)
Deputados se articulam para invalidar o decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL) que concedeu graça e perdoou a pena aplicada ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Enquanto um grupo de parlamentares recorre à Corte contra a medida, outra corrente apoia um projeto de decreto legislativo.
A decisão do presidente, tomada ontem, tem validade imediata e já foi publicada no DOU (Diário Oficial da União). Silveira foi condenado a oito anos e nove meses por atuar para impedir o funcionamento das instituições e por coação no curso do processo. Além disso, o deputado teve os direitos políticos suspensos e ordem para que seu mandato seja cassado. Ele foi preso em fevereiro do ano passado, e a detenção foi mantida pelo plenário da Câmara.
O ex-governador Ciro Gomes, candidato a presidente, afirmou que vai apresentar ação no Supremo contra o decreto. “Acostumado a agir em território de sombra entre o moral e o imoral, o legal e o ilegal, Bolsonaro acaba de transformar o instituto da graça constitucional em uma desgraça institucional. Tenta, assim, acelerar o passo na marcha do golpe. Mas não terá sucesso", afirmou Ciro.
A decisão dele deve ser seguida pelo senador Randolfe Rodrigues, que também levará o caso ao Supremo. A deputada Vivi Reis afirmou que a bancada do PSOL deve propor um decreto legislativo para sustar o texto editado pelo presidente. No Supremo, os magistrados aguardam a impetração de questionamentos ao ato presidencial para analisar o caso. A avaliação, nos bastidores, é que o decreto pode ter vícios processuais que o tornam inconstitucional. Mas, mesmo que seja mantido, a inelegibilidade do parlamentar deve continuar em vigor.
Governistas querem anistia
Enquanto a oposição se movimenta para recorrer do decreto de Bolsonaro, governistas se mobilizam para aprovar um projeto de lei que possa conceder anistia a ele. A proposta em elaboração tem autoria da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e prevê o benefício ao parlamentar nos termos do artigo 48 da Constituição Federal – em que a medida cabe ao Congresso Nacional, com sanção do presidente da República.
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"Ficam assegurados os direitos políticos do anistiado, bem como a manutenção do seu mandato parlamentar, e, ainda, a extinção de todos os efeitos decorrentes das condutas a si imputadas, sejam cíveis ou penais", diz o texto. A proposta acrescenta ainda que a anistia deve abranger todos os fatos da ação penal 1.004, que motivou a condenação de Silveira.
A expectativa é que o projeto seja apresentado ainda nesta sexta-feira (22) ou até a próxima semana. De acordo com uma fonte, a matéria deve ser assinada por outros 40 parlamentares. O objetivo é colocá-la em regime de urgência para que o plenário possa votá-la quanto antes.
"Não houve lesão a alguém, então cabe a anistia. Não se pode anistiar um homicida, um traficante, porque, justamente, houve a lesão. Neste caso, porém, é possível [anistiar]", diz o deputado federal Sanderson (PL-RS), vice-líder do governo.
Interlocutores do presidente Jair Bolsonaro relataram à reportagem do R7 que ele tinha a expectativa de que seu aliado seria condenado no julgamento do STF. "São nove ministros [da Corte] que são inimigos políticos", disse uma dessas fontes.
Luiz Fux Seguiu o voto do relator, integralmente, em discurso breve. "Cumprimento o relator, pois tive o prazer de ler as cem laudas do seu voto. Existe um trecho da PGR que cita que o denunciado não busca proteger a prerrogativa, ele busca utilizar ...
Luiz Fux Seguiu o voto do relator, integralmente, em discurso breve. "Cumprimento o relator, pois tive o prazer de ler as cem laudas do seu voto. Existe um trecho da PGR que cita que o denunciado não busca proteger a prerrogativa, ele busca utilizar a prerrogativa. Essas expressões utilizadas pelo denunciado, acerca das instituições, hoje estariam caracterizadas em qualquer país do mundo como uma liberdade de expressão que encerra uma verdadeira anarquia criminosa", disse.
Agora, ganha ainda mais força a estratégia de Bolsonaro de eleger o máximo possível de candidatos ao Senado. Isso porque o presidente quer levar adiante o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso Silveira. A medida, que não tem força entre os políticos, só é possível na Casa Legislativa.
Em 2021, Bolsonaro enviou o pedido de impeachment contra o ministro do STF ao então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). É a primeira vez na história que um presidente pede o impeachment de um ministro do Supremo. O projeto não avançou.
O deputado Daniel Silveira discursa no plenário da Câmara horas antes do início de seu julgamento no STF
O deputado Daniel Silveira discursa no plenário da Câmara horas antes do início de seu julgamento no STF
Entenda o que é a 'graça'
A graça é um benefício particular que só o presidente da República pode conceder e depende de pedido do condenado. O instituto perdoa o beneficiado de qualquer pena imposta por decisão judicial criminal, exceto se for derivada de condenação por crime hediondo. Ele não tem o poder de anular a condenação ou o crime, mas sim de impedir que a pena seja cumprida.
O instituto é diferente do indulto coletivo, conhecido por ser concedido anualmente em data próxima ao Natal. Esse tipo de benefício é coletivo e pode tanto extinguir a pena, quando é pleno, quanto diminuí-la ou substituí-la, quando é parcial.
O indulto pode ser também condicionado, isto é, prever condições para sua concessão, e incondicionado, quando não há essa previsão. Por último, pode ser ainda restrito, quando exige condições pessoais do condenado — como o fato de ter sido réu primário —, e irrestrito, quando é destinado a todos os condenados do país.
Veja o decreto na íntegra
"DECRETO DE 21 DE ABRIL DE 2022
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso XII, da Constituição, tendo em vista o disposto no art. 734 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e
Considerando que a prerrogativa presidencial para a concessão de indulto individual é medida fundamental à manutenção do Estado Democrático de Direito, inspirado em valores compartilhados por uma sociedade fraterna, justa e responsável;
Considerando que a liberdade de expressão é pilar essencial da sociedade em todas as suas manifestações;
Considerando que a concessão de indulto individual é medida constitucional discricionária excepcional destinada à manutenção do mecanismo tradicional de freios e contrapesos na tripartição de poderes;
Considerando que a concessão de indulto individual decorre de juízo íntegro baseado necessariamente nas hipóteses legais, políticas e moralmente cabíveis;
Considerando que ao Presidente da República foi confiada democraticamente a missão de zelar pelo interesse público; e
Considerando que a sociedade encontra-se em legítima comoção, em vista da condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão;
DECRETA:
Art. 1º Fica concedida graça constitucional a Daniel Lucio da Silveira, Deputado Federal, condenado pelo Supremo Tribunal Federal, em 20 de abril de 2022, no âmbito da Ação Penal nº 1.044, à pena de oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos:
I - no inciso IV do caput do art. 23, combinado com o art. 18 da Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983; e
II - no art. 344 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.
Art. 2º A graça de que trata este Decreto é incondicionada e será concedida independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Art. 3º A graça inclui as penas privativas de liberdade, a multa, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, e as penas restritivas de direitos.
Brasília, 21 de abril de 2022; 201º da Independência e 134º da República.
JAIR MESSIAS BOLSONARO
Presidente da República Federativa do Brasil"