Na semana passada, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que acaba com a escala de seis dias de trabalho e um de descanso foi apresentada na Câmara dos Deputados. Se o tema for aprovado pelo Congresso Nacional, a regra vai valer para todo o país, se sobrepondo a proposições em tramitação em Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas ao redor do país.Em janeiro, dois vereadores, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, protocolaram projetos que pedem a redução da jornada de trabalho nas terceirizações, contratações de obras e serviços, e nas celebrações de parcerias, públicas ou privadas, realizadas pela administração pública dos municípios.As duas propostas municipais estabelecem que a jornada de trabalho deve se limitar a 32 horas semanais, a serem cumpridas em quatro dias da semana. A PEC a ser analisada pelo Congresso Nacional pede a limitação da semana de trabalho a 36 horas, além do fim da jornada 6x1.Além dos dois projetos, tramitam proposições sobre o mesmo assunto nas cidades de Recife (PE), Florianópolis (SC), Natal (RN), Fortaleza (CE), Porto Alegre (PR), Salvador (BA), Vitória (ES), Belém (PA), Belo Horizonte (MG), São Carlos (SP), Guarulhos (SP), Jundiaí (SP) e no Distrito Federal. Também há uma que é analisada no estado de São Paulo.Especialista em direito constitucional, o advogado e professor da USP (Universidade de São Paulo) Rubens Beçak diz que a aprovação de uma proposta que muda a Constituição vale em todo o Brasil obrigatoriamente.“Tudo o que tramitasse em níveis inferiores da Federação, propostas de emenda constitucional estaduais, proposta de alteração das leis orgânicas municipais, teria que estar de acordo com a jornada fixada a nível nacional, não podendo excedê-la”, afirma.A única exceção, segundo o professor, se daria caso o estado ou município aprovasse uma proposta que estabelecesse jornadas inferiores ao estabelecido pela PEC.“Então se passa a valer a jornada, por exemplo, de 5x2, pode o estado de São Paulo aprovar uma emenda que fixe a jornada de 4x3? Pode, mas só para seus funcionários, aqueles que são contratados pelo estado. Não se aplica para o setor privado e nem pode exceder o número fixado pela norma modificada no nível nacional”, exemplifica.O advogado trabalhista Tomaz Nina explica que a PEC se sobrepõe a todas as leis federais e estaduais. “A jornada de trabalho 6x1 está prevista no inciso XIII do artigo 7º da Constituição Federal, de modo que, ao ser alterada pelo rito adequado, não poderá haver lei que permita a respectiva jornada”, destaca.Ele avalia, porém, que a proposta pode causar insegurança jurídica, pois, atualmente, cada segmento de trabalho possui especificidades de jornadas trabalhistas, a exemplo de duração e período. “No Brasil, especialmente após a Lei 13.467/17, os acordos e as convenções coletivas de trabalho definem a jornada de trabalho de cada categoria. Logo, reduzir a jornada de trabalho da maioria das categorias de trabalhadores por meio da proposta que tramita na Câmara dos Deputados vai gerar insegurança jurídica”, garante.Nina argumenta que o maior problema não é a jornada, mas a falta de trabalho. Segundo informações do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o desemprego subiu para 6,5% no trimestre que terminou em janeiro, com 7,2 milhões de pessoas sem ocupação.Ele diz que as diferenças entre os estados mais produtivos e os menos produtivos vai aumentar com uma eventual aprovação da PEC. “Há um número maior de desempregados nos estados menos produtivos. O aumento do custo econômico, com a medida legislativa, fatalmente será repassado para a iniciativa privada, o que poderá gerar redução da atividade empresarial em regiões menos produtivas e, consequentemente, o aumento do desemprego”, avalia.Por fim, ele defende uma análise profunda do impacto econômico da medida. “É importante que a análise do impacto econômico da medida pretendida seja apreciado, em âmbito nacional, na mesma página e com a mesma importância dada ao caráter social e político da proposta”, pontua.De forma geral, a PEC é voltada para a redução de jornadas de trabalho, em especial aos trabalhadores que têm um dia de descanso a cada seis trabalhados. A proposta também prevê a redução na carga horária, passando o limite de até 44 horas semanais para 36 horas por semana, com máximo de 8 horas por dia.A iniciativa partiu do movimento Vida Além do Trabalho e, agora, terá um longo caminho no Congresso. A primeira etapa de análise da PEC é na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, que vai avaliar se as mudanças não violam pontos estabelecidos na Constituição.Se o texto for aprovado, as discussões avançam para uma comissão especial, que vai analisar o impacto da norma e regras específicas, podendo alterar a redação original da matéria. Parlamentares já preveem discutir regras de transição para uma eventual implementação das novas regras.A data de início da comissão especial será definida pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e líderes partidários vão indicar os representantes do colegiado. Após conclusão na comissão, o texto poderá ser pautado no plenário da Câmara.Para ser aprovada, a PEC precisa alcançar ao menos 308 votos — o correspondente a 3/5 dos deputados — em dois turnos de votação. Depois, o texto segue para o Senado, onde também precisa ser aprovado em duas votações com o aval de no mínimo 49 senadores.Se passar por mudanças no Senado, o texto volta à Câmara. Após o término das análises pelas duas Casas, a PEC é promulgada pelo presidente do Congresso Nacional.