Dois meses após mortes em presídio no RN, Alcaçuz tem muro, cerca e reforço de agentes penitenciários
Segundo secretário, situação ainda é crítica: "Todo dia, a gente espera uma crise"
Cidades|Ana Ignacio, do R7
Um muro agora divide os 1.296 presos que estão no Complexo Penitenciário de Alcaçuz, na região metropolitana de Natal (RN). Dois meses após a morte de 26 presos em uma rebelião que tomou o presídio por mais de duas semanas, a penitenciária ganhou também cercas para evitar que objetos não autorizados sejam jogados para dentro da penitenciária.
Do dia 17 de janeiro até o dia 3 de março, mais de 2.000 armas brancas e 271 celulares foram apreendidos na primeira etapa da Operação Varredura, realizada em presídios estaduais de todo o País pelas Forças Armadas. Foram vistoriados dez presídios de cinco Estados do Brasil que solicitaram o apoio das Forças.
Walber Virgulino, secretário da Sejuc (Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania) do RN, falou ao R7 sobre as medidas tomadas desde o início do ano, quando a crise no sistema penitenciário do País voltou a ser discutida. Apesar de mencionar alguns avanços, Virgulino assume que a situação está longe de ser considerada tranquila.
— No Estado, todo dia a gente espera uma crise no sistema penitenciário. O clima é tenso e todos trabalham esperando que aconteça algo. Nas penitenciárias do Brasil, em qualquer unidade, pode acontecer o que aconteceu em Alcaçuz. Mas estamos trabalhando para evitar que isso aconteça.
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A tensão também é relatada por agentes penitenciários. Vilma Batista, presidente Sindasp (Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado do Rio Grande do Norte) conta que nenhum agente trabalha com tranquilidade.
— A gente continua com as atividades, ainda sem estrutura. Hoje temos a vulnerabilidade dos agentes e dos presos. Nenhum agente trabalha com segurança. Sentimos que podem acontecer a qualquer momento novas crises e rebeliões. E a tensão aumenta a cada dia por falta de condições de trabalho e de estrutura.
Atualmente, o complexo penitenciário de Alcaçuz é formado pelo presídio de Alcaçuz, que abriga 826 detentos da facção Família do Norte, e o Rogerio Coutinho, com 470 detentos do PCC (Primeiro Comando da Capital). Logo após as mortes, o governo colocou contêineres no pátio para separar os detentos — agora divididos pelo muro, como explica o secretário.
— O governo do Estado repara um erro de não ter dividido o complexo. Isso era uma falha de outras épocas e agora praticamente impossibilita o encontro das facções. Não posso dizer que é impossível, mas dificulta.
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Além disso, o secretário diz que há reforço de 100 agentes penitenciários federais no presídio — além de 40 do Estado. Foi também aprovado um concurso para contratar mais 570 agentes ainda neste ano. Virgulino afirma ainda que o governo realiza treinamento dos agentes. Desde a última quinta-feira (16), ocorrem mutirões dentro da unidade prisional para rever os processos e há presença de equipes de saúde para mapear as necessidades dos detentos. Segundo o secretário, o objetivo é se aproximar dos presos.
Apesar das medidas, que também são reconhecidas pelo Sindicato dos Agentes Penitenciário, a presidente da entidade alerta para a situação crítica do Estado.
— Teve que acontecer essa tragédia para que as autoridades se alertassem, mas nossa preocupação não é só Alcaçuz. Existem outras unidades no interior que merecem cuidado, como o presídio Agrícola Doutor Mário Negócio, em Mossoró.
Mortes e sistema penitenciário do RN
No dia 15 de janeiro, a Secretaria de Segurança do Rio Grande do Norte confirmou 26 mortos em rebelião na Penitenciária Estadual de Alcaçuz. O motim começou na noite de sábado (14) e só foi controlado no início da manhã de domingo com a entrada de policiais militares e agentes penitenciários no local.
No Estado, há 32 unidades prisionais sendo 24 unidades para presos provisórios; cinco para regime fechado; uma para regime semiaberto; uma de medida de segurança; e uma para outros tipos de regime. Ao todo, são 4.502 vagas e 7.081 detentos — 68% estão presos há mais de 90 dias sem terem sido julgados.
De acordo com o Infoepn (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias) do Depen (Departamento Penitenciário Nacional) de junho de 2014 — os dados mais atuais disponíveis — a taxa de lotação do sistema do RN é de 157%. No RN, apenas três unidades não estão superlotadas. A média nacional de ocupação prisional, de acordo com o estudo, fica em 161% e todos os estados estão superlotados. Pernambuco possui a maior taxa de ocupação prisional, com 265%.
A maioria dos presos do Rio Grande do Norte (37%) tem entre 18 e 24 anos, são negros (69,5%), solteiros (60%), com ensino fundamental incompleto (41%). Taxa de mortalidade violenta (excluindo mortes naturais) no primeiro semestre de 2014 para cada dez mil pessoas presas é de 9,9 no RN.