Apesar de ser uma doença respiratória, a covid-19 deixa sequelas que afetam as mais diversas partes do corpo. Uma delas, é o cérebro. Alguns estudos mostram que problemas no sistema nervoso fazem parte do amplo rol de efeitos provocados pelo novo coronavírus. A revista científica The Lancet Psychiatry publicou a maior pesquisa já feita sobre o tema. De acordo com os dados coletados, dos 236 mil ex-pacientes um em cada três recebeu diagnóstico de doenças neurológicas ou psiquiátricas no intervalo de um semestre após a infecção.A pesquisa foi realizada por pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido. Em seis meses, em média 34% dos indivíduos relataram problemas de saúde mental. Pelo menos 13% deles nunca tiveram problemas psiquiátricos e neurológicos. As queixas mais comuns eram de transtornos de ansiedade e de humor, com 17% e 14% dos casos, respectivamente. Quadros de transtornos por uso de substâncias (7%) e insônia (5%) também foram registrados. Os desfechos mais graves incluíram acidente vascular cerebral isquêmico (2,1%), demência (0,7%) e hemorragia cerebral (0,6%).Leia mais: Covid e isolamento criam alerta sobre depressão infantilEspecialista sente reflexo da doença nos consultóriosA psiquiatra Nathália Sobrinho Gurgel percebeu esse aumento da demanda nos consultórios. Confira a entrevista completa com a especialista. Houve um aumento nos atendimentos? Apareceram casos como esses na clínica em que trabalha?Após infecção pela Covid-19 observamos um aumento nos sintomas de ansiedade, sintomas de depressão, abuso de substâncias e ideação suicida. No momento sabemos que a Covid-9 não é uma doença exclusivamente pulmonar, é uma doença sistêmica que causa um processo inflamatório sistêmico e o cérebro também é acometido por esse processo inflamatório.Muitos dos efeitos neuropsiquiátricos que ocorrem, estão associados a esse processo inflamatório. Também sabemos que o vírus pode se alojar no cérebro através da disseminação pela corrente sanguínea.Na clínica Aube, temos observado o aumento da incidência dos transtornos mentais acima referidos, o que tem levado a um aumento no número de atendimentos, pois as pessoas estão cada vez mais se conscientizando da necessidade do cuidado com a saúde mental. Os problemas são identificados pelos próprios pacientes ou seus familiares.Quais os problemas mais comuns?Foi realizado um estudo recente na Unicamp que comparou o funcionamento cerebral de pacientes com covid e pacientes sem covid. O resultado desse estudo demonstrou que o cérebro de pessoas com covid tem uma mudança no funcionamento cerebral. Essas mudanças cerebrais contribuem para a manifestação de sintomas psiquiátricos a curto, médio e longo prazo.As manifestações agudas mais comuns são: encefalopatia, confusão mental e alterações nas funções executivas como memória e capacidade de resolver problemas, alterações na concentração, insônia, sintomas depressivos, sintomas ansiosos e ideação suicida.Sabemos também que no Brasil há cerca de 230 mil mortos por covid, e as repercussões pelo falecimento de um ente querido também causam prejuízos para saúde mental. Temos observado o aumento do luto prolongado, que é um luto com duração maior que 6 meses, e isso pode aumentar a ocorrência de quadros ansiosos e depressivos. Por esse motivo é importante criarmos estratégias para o acolhimento dessas pessoas.O que fazer para identificar o problema?Geralmente os sintomas mais comuns relacionados à ansiedade são: falta de ar, agitação psicomotora, taquicardia, sensação de estar acelerado, alterações no foco e na concentração e insônia.Alguns sintomas comuns na depressão são: oscilação do humor, tristeza persistente, crises de choro, irritabilidade, perda de energia e de força muscular.Ao notar o aparecimento de sintomas como esses, é importante a busca por atendimento especializado, pois os referidos transtornos possuem tratamento, e, com o tratamento correto e precoce, buscamos uma melhora clínica e o desaparecimento dos sintomas. Isso visa melhorar a qualidade de vida e o desempenho social e laborativo do paciente.Leia também: Síndrome de Burnout na pandemia: mulheres são as mais afetadas