Os policiais civis Antonio Romero Dias Roxo e Fábio Marcos Galvão, ambos investigadores do 5º Distrito Policial de Santos (a 72 km de São Paulo), foram condenados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a oito anos de prisão pelo crime de extorsão mediante sequestro. Dias Roxo é neto de Antonio Erasmo Dias, ex-deputado, ex-vereador, ex-secretário da Segurança Pública de São Paulo e coronel do Exército reformado, morto aos 85 anos, em janeiro de 2010, vítima de câncer no estômago e no fígado. De acordo com a denúncia do Ministério Público Estadual, os dois policiais civis sequestraram, em 09 de janeiro deste ano, D.S.P.R., investigado sob a suspeita de ser um distribuidor de drogas em vários morros de Santos, inclusive na área atendida pela delegacia onde a dupla trabalhava, o 5ºDP. O crime dos policiais foi descoberto porque D.S. era alvo de uma investigação do Ministério Público Estadual e tinha suas linhas telefônicas grampeadas com autorização da Justiça e também porque o suspeito de ligação com o tráfico era vigiado permanentemente por outros policiais. A detenção de D.S. por parte dos dois investigadores foi toda registrada em fotografias, já que ele era seguido pelos policiais que o monitoravam. Segundo documentos da investigação entregues à Justiça, os investigadores Dias Roxo e Galvão exigiram R$ 20 mil para que o suspeito de tráfico fosse libertado. Algumas imagens feitas pelos policiais que seguiam D.S. mostram os dois investigadores o algemando e, minutos depois, o soltando. Também foram registrados os momentos nos quais o investigador Galvão assumiu a direção do carro de D.S., um Ônix, e passou a circular por Santos com ele no banco do passageiro. Enquanto isso, Dias Roxo usava o carro da Polícia Civil nº 18.727 para escoltar o veículo com o parceiro de trabalho e o investigado por tráfico. Perto do 5º DP de Santos, Dias Roxo parou o carro oficial e também entrou no Ônix, onde sentou no banco traseiro. O trio ficou por aproximadamente de 15 minutos no carro, até que D.S. foi liberado e partiu com seu carro. Assim que partiu, D.S. começou a utilizar os seus telefones, todos monitorados pela Promotoria, para falar sobre a extorsão que havia sofrido instantes antes. Com autorização da Justiça, mandados de busca e apreensão foram cumpridos nas casas dos investigadores Dias Roxo e Galvão. Dez mil reais, exatamente metade do valor da extorsão, foram apreendidos na residência de Galvão. Uma pequena quantidade de maconha, uma balança de precisão e munições de uso restrito também foram localizadas. Os dois policiais civis acabaram presos temporariamente. Para as defesas dos investigadores Dias Roxo, o neto do coronel Erasmo Dias, e Galvão as interceptações telefônicas que flagraram D.S. falando sobre a extorsão mediante sequestro que havia sofrido, não são válidas porque eram mantidas pela Polícia Militar e não pela Polícia Civil e também porque as interceptações haviam sido prorrogadas sete vezes pela Justiça até o dia em que os dois investigadores foram descobertos. Dois meses antes de Dias Roxo e Galvão terem sequestrado D.S., segundo a investigação, um amigo dele, L.S.S., também monitorado pela Promotoria, aconselhava um homem que não foi identificado a ficar em alerta com os policiais da “Pretona” (por causa das cores branca e preta dos carros da Polícia Civil de São Paulo). Na gravação telefônica, L.S. diz que os policiais do 5ºDP de Santos da “Pretona” realizavam blitze contra suspeitos de ligação com o tráfico de drogas não para combater o crime, mas, sim, para extorquir dinheiro de quem eles detinham. L.S. narrou ter sido preso pelos policiais civis da “Pretona”, quando “transportava o bagulho no banco de trás do carro”, e teve de pagar R$ 2.000 para continuar com a droga.Defensa dos réus Os defensores dos policiais também tentaram convencer a Justiça de que eles não praticaram extorsão mediante sequestro, já que “não houve grave ameaça” por parte de Dias Roxo e Galvão contra D.S. Para a defesa de Galvão, D.S. encenou que fora extorquido pelos dois policiais civis para tentar tirar dinheiro de seus comparsas no tráfico, os R$ 10 mil apreendidos na casa do investigador não eram provenientes da extorsão contra o investigado detido por eles e também que não existe documentação de que ele fora, de fato, alvo da extorsão. O dinheiro seria, segundo o policial Galvão, da loja de roupas de sua mulher. De acordo com a advogada de Dias Roxo, a abordagem feita por ele e Galvão contra D.S. “ocorreu dentro dos limites do exercício legal da profissão, no estrito cumprimento de dever legal” e que nada de ilícito foi apreendido na casa do neto de Erasmo Dias para que a acusação de extorsão pudesse ser embasada. Ao tentar justificar a abordagem contra L.S., os dois policiais civis disseram à Justiça que haviam recebido uma denúncia anônima dando conta de que o carro dele era usado no transporte de mercadorias contrabandeadas. Além de condenar os dois policiais civis à prisão, o juiz Walter Luiz Esteves de Azevedo também determinou que os R$ 10 mil apreendidos na casa do investigador Galvão sejam repassados à União. “Eles [policiais civis] praticaram a extorsão durante o horário de trabalho. Empregaram os bens do Estado (algemas e viaturas) na execução do delito. Pior do que isso, usaram a função pública para reforçar a intimidação. Praticaram crime quando deveriam ser, como policiais, a linha de frente ao combate ao ilícito. Assim agindo, quebraram a confiança que lhes fora depositada pelos seus superiores e pela sociedade. Conspurcaram a imagem da Polícia Civil. Receberam vantagem indevida de valor expressivo. Dada a qualidade da vítima, sabiam que embolsavam dinheiro odioso, auferido com a desgraça de pessoas e famílias, que padecem os efeitos nocivos da droga. Como policiais, haviam recebido treinamento e instrução específicos. Portanto, tinham completa ciência dos efeitos deletérios de sua conduta”, escreveu o juiz Azevedo na sentença contra os policiais civis Dias Roxo e Galvão.Erasmo Dias, o avô de Dias Roxo Em seu currículo, o coronel Erasmo Dias tem como um dos pontos de destaque o comando da invasão, em 1977, da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo. Cerca de 3 mil policiais detiveram 2 mil estudantes. À época, a invasão foi considerada um último grande golpe da Ditadura contra o movimento estudantil no país. Erasmo Dias participou, em 1962, da conspiração do golpe contra o presidente João Goulart e, em 1968, do cerco aos 1.700 estudantes que participavam do 30º Congresso da UNE (União Nacional de Estudantes), em Ibiúna (interior de SP). Dos 1.700 estudantes, 845 foram levados para um batalhão da Polícia Militar e 43 foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional, em vigor à época. Em 2004, quando era entrevistado pelo jornalista Marcelo Godoy para o livro “A Casa da Vovó”, Erasmo Dias confessou que policiais militares da Rota (tido como grupo especial da PM paulista) haviam forjado um tiroteio para justificar o assassinato de três jovens no caso nacionalmente conhecido como “Rota 66”. A confissão de coronel foi revelada por Godoy neste ano, 40 anos após a farsa envolvendo os militares da Rota 66, no bairro dos Jardins, um dos mais caros de São Paulo.