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Na era digital, editora ainda fatura com enciclopédia Barsa no papel

Primeira edição foi lançada em 1964 e se esgotou em oito meses. Até aquele ano, só havia enciclopédias em inglês, francês e espanhol no mercado

Economia|Marcus Lopes, especial para o R7

Enciclopédia Barsa em papel representa 60% do faturamento do grupo
Enciclopédia Barsa em papel representa 60% do faturamento do grupo Enciclopédia Barsa em papel representa 60% do faturamento do grupo

Quando a Encyclopaedia Britannica anunciou, há seis anos, o encerramento da sua edição impressa, parecia o começo do fim de um modelo de coleção de livros que durou séculos. Não foi o que aconteceu. No Brasil, a Enciclopédia Barsa segue firme e forte no papel.

Mesmo com a concorrência da internet grátis e uma versão online disponível para assinantes, a coleção de 18 volumes e mais de 6.000 páginas continua o principal produto da publicação, criada no Brasil há mais de 50 anos e que subsidiou gerações inteiras de trabalhos escolares e acadêmicos.

“O papel ainda é o nosso carro-chefe”, explica o diretor da Barsa, Anderson Silva. Sem revelar detalhes de números por questões estratégicas da empresa, ele afirma que as vendas de coleções para clientes físicos e jurídicos, como escolas e órgãos públicos, respondem por cerca de 60% do faturamento da Barsa Planeta, que pertence ao grupo editorial espanhol Planeta.

Diretor da Barsa, Anderson Silva: 'Papel é carro-chefe'
Diretor da Barsa, Anderson Silva: 'Papel é carro-chefe' Diretor da Barsa, Anderson Silva: 'Papel é carro-chefe'

A Barsa foi criada na década de 60 pela Britannica, que, na época, sentia falta de uma versão em português para o seu conteúdo. O que era para ser apenas uma versão traduzida se transformou em uma genuína enciclopédia brasileira, graças ao trabalho de Dorita Barret, filha de um dos donos da Britannica e que veio morar no Brasil na década de 50 com o marido, o diplomata brasileiro Alfredo de Almeida Sá. O nome Barsa é a união de BAR (de Barret) e SA (de Sá).

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Primeira edição da Barsa foi lançada em 1964 e se esgotou em oito meses
Primeira edição da Barsa foi lançada em 1964 e se esgotou em oito meses Primeira edição da Barsa foi lançada em 1964 e se esgotou em oito meses

A primeira edição da Barsa foi lançada em 1964 e se esgotou em oito meses. Até então, só era possível encontrar no mercado enciclopédias em inglês, francês e espanhol, todas elas com poucos assuntos brasileiros.

Além dos verbetes tradicionais sobre os mais variados assuntos em todas as áreas do conhecimento, foram incluídos na nova publicação textos de colaboradores como Gilberto Freyre (“A Civilização do Açúcar”), Oscar Niemeyer (“Como Brasília foi Construída”) e Jorge Amado (“Civilização do Cacau’). Todos sob a batuta de Antonio Callado, redator-chefe da primeira edição.

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Segundo os organizadores, os segredos para a longevidade da enciclopédia, que nos primeiros anos equivalia ao preço de um carro popular, são o rigor técnico, a variedade de assuntos e a imparcialidade na redação e tratamento dos verbetes. “Nós temos de tratar de todos os assuntos, como política, mas sempre fazemos de maneira técnica e imparcial”, explica Rosana Rebello, responsável pelo conteúdo editorial da Barsa.

“Somos a união de conhecimentos de qualidade e confiabilidade”, completa Rosana, sobre a resistência da publicação impressa e a concorrência com outras formas de pesquisa livres na internet, como Wikipédia e Google. “A Wikipédia qualquer pessoa pode editar e o Google não produz conteúdo próprio, é apenas um meio de pesquisa que direciona para outros conteúdos na internet, nem sempre confiáveis”, completa Rosana.

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Rosana: 'Somos a união de conhecimentos e confiabilidade'
Rosana: 'Somos a união de conhecimentos e confiabilidade' Rosana: 'Somos a união de conhecimentos e confiabilidade'

Além das pessoas que não abrem mão do livro físico, o público consumidor do papel geralmente possui uma relação de afetividade com a Barsa. Os mais velhos recordam das pesquisas para trabalhos escolares amparadas na enciclopédia.

"É aquela pessoa mais velha que fez pesquisas na Barsa quando estava no colégio e agora quer transmitir esse mesmo conhecimento aos filhos. Ou então possui uma coleção muito antiga e deseja uma mais nova para substituir", diz Silva.

“A relação do papel ainda é muito próxima do ser humano. Há pessoas que gostam de tocar, manusear e até cheirar o livro e não abrem mão disso”, diz o diretor da Barsa, sobre a preferência analógica de parte dos consumidores.

Outra parte do público é formada por instituições de ensino públicas e privadas, bibliotecas e órgãos públicos. O governo federal, por exemplo, adquire coleções para o programa de bibliotecas em todo o país. 

Escritor Luiz Ruffato, vencedor de vários prêmios literários nacionais
Escritor Luiz Ruffato, vencedor de vários prêmios literários nacionais Escritor Luiz Ruffato, vencedor de vários prêmios literários nacionais

Consultas

Leitores e pesquisadores elogiam a resistência da enciclopédia impressa. “Sou um tarado por enciclopédias desde pequeno”, diz o escritor Luiz Ruffato, vencedor de vários prêmios literários nacionais e internacionais com suas obras e que teve o primeiro contato com a Barsa na biblioteca pública de Cataguases (MG), onde nasceu e passou a infância e parte da juventude.

“Eu costumava ler verbetes de maneira completamente aleatória, o que abriu muito a minha cabeça”, diz o autor de Eles Eram Muito Cavalos. “Sempre que preciso de informações para escrever continuo recorrendo a locais como a Barsa, pois são fontes muito confiáveis e duradouras”, explica Ruffato.

“Eu lembro direitinho quando a Barsa chegou em casa. Eu e meu irmão choramos de emoção, pois minha família era pobre, mas investia muito em nossa educação”, diz a historiadora e socióloga Cláudia Coelho Hardagh. Como era raro na época uma família possuir a enciclopédia, pois o preço era alto, Claudia lembra das tardes em que os amigos e colegas de escola se reuniam em sua casa, em Santos, no litoral paulista, para fazer trabalhos escolares. “Sempre cito a Barsa em minha palestras como referência em conhecimento”, completa a doutora em educação pela PUC-SP e professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Apesar do saudosismo e das boas lembranças dos volumes encadernados e cuidadosamente colocados na estante, Cláudia Hardagh acredita que, para garantir espaço no futuro, as enciclopédias devem investir pesado em novos recursos eletrônicos para atrair os novos leitores.

Em relação ao conteúdo, diz a professora do Mackenzie, os editores poderiam investir em uma linguagem mais simples e palatável às novas gerações, mas sem abrir mão da qualidade das informações contidas nas enciclopédias. “Seria um ajuste de linguagem para o contexto atual, mas sem perder o conceito de enciclopédia, que é a reunião do saber em um só lugar”, completa Cláudia.

Digital

A resistência do papel não significa que a Barsa parou no tempo. Pelo contrário. A enciclopédia também possui uma versão digital completa na internet, onde é atualizada e ampliada de maneira contínua. Além das atualizações e elaboração de novos textos nas mais diversas áreas do conhecimento, a Barsa na rede (www.barsanarede.com.br) conta com diversos recursos multimídia para os clientes, que podem adquirir apenas a versão eletrônica. Uma equipe de cerca de 40 colaboradores revisa textos e abastece o conteúdo digital com novos verbetes referentes a assuntos da modernidade, como fake news e mobilidade urbana.

“Lá no começo, a enciclopédia era algo quase que vitalício, pois parecia que o tempo corria mais devagar. Mas, com o passar dos anos, o conhecimento também se tornou mais dinâmico e dar velocidade à Barsa faz um total sentido”, diz Silva, destacando as vantagens dos meios digitais e novos projetos para ampliar a presença da enciclopédia, em especial nos meios escolares e acadêmicos.

E a versão em papel, resiste por muito tempo ou será extinto, como ocorreu em 2012 com a mãe da Barsa, a Britannica? “Por enquanto, fica tudo como está e não planejamos o fim do papel”, resume Silva.

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