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Arqueólogos descobrem cidade maia perdida no México

Tecnologia ajuda a encontrar construções sob a vegetação, mas não substitui árduas caminhas pela mata fechada da região

Internacional|Alan Yuhas, do New York Times

Arqueólogos localizaram uma pedra com desenhos maias esculpidos em cidade perdida na selva
Arqueólogos localizaram uma pedra com desenhos maias esculpidos em cidade perdida na selva Arqueólogos localizaram uma pedra com desenhos maias esculpidos em cidade perdida na selva

Armados com facões e serras elétricas, que usaram para abrir caminho entre as árvores caídas e os arbustos cerrados, os arqueólogos tiveram de criar uma trilha no terreno rochoso para finalmente chegar ao seu destino: uma cidade escondida na Península de Yucatán, no México, cujas pirâmides e palácios se erguiam acima da população há mais de mil anos, com direito a campo de esportes e terraços, hoje enterrados e cobertos pela vegetação.

O Instituto Nacional de Antropologia e História anunciou a façanha no fim do mês passado, declarando que tinha descoberto uma cidade maia antiga "em uma área vasta praticamente desconhecida para a arqueologia". "Essas histórias de 'cidades perdidas no meio da selva' geralmente são decepcionantes ou criadas pelos jornalistas, mas desta vez a coisa é séria", disse Simon Martin, antropólogo político não envolvido no projeto.

A equipe responsável pelo descobrimento lhe deu o nome de Ocomtún, usando a palavra em maia iucateque para as diversas colunas de pedra encontradas ali.

Possível mapa da cidade maia localizada por arqueólogos no México
Possível mapa da cidade maia localizada por arqueólogos no México Possível mapa da cidade maia localizada por arqueólogos no México

Segundo a entidade, o local, situado no estado de Campeche, foi um importante centro maia – e, durante pelo menos parte do período clássico, que se deu entre 250 e 900 d.C., uma área bem povoada, ainda que hoje seja parte de uma reserva ecológica onde as trepadeiras cobrem botas e pneus, e a água escorre pelo solo poroso de calcário. "Muitas vezes já me perguntaram por que ninguém tinha explorado aquele lugar antes; bom, talvez seja porque é preciso ser meio maluco para chegar até lá. Não é fácil", declarou Ivan Sprajc, principal arqueólogo do projeto e professor do centro de pesquisa esloveno ZRC Sazu.

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Na última década, o trabalho foi facilitado por uma criação revolucionária: o lidar, tecnologia que usa raios laser aerotransportados para, através da vegetação densa, identificar as estruturas antigas e as paisagens alteradas pelo homem. No fim das contas, porém, é preciso percorrer o caminho árduo a pé. "Sprajc está fazendo a coisa certa, ou seja, usando o lidar como instrumento de pesquisa, mas interpretando os resultados de campo só depois de uma inspeção física", explicou Rosemary Joyce, antropóloga da Universidade da Califórnia em Berkeley.

Segundo e-mail enviado ao New York Times, a especialista afirma que é pouco provável que qualquer local novo, mesmo documentado, mude a narrativa histórica de forma concreta, mas esse tipo de trabalho pode ajudar os pesquisadores a saber mais sobre a vida diária das comunidades maias durante o período clássico.

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"Não é muito comum descobrir sítios grandes dos quais ninguém sabe absolutamente nada. Durante muito tempo, os arqueólogos contaram com a ajuda dos descendentes para identificar e escavar os locais que lhes eram familiares, mas, como essa região do Campeche é reserva há décadas, nenhum profissional tinha estado ali antes", informou Scott Hutson, da Universidade do Kentucky.

Cidade maia México
Cidade maia México Cidade maia México

Martin reforçou a explicação, dizendo que a área é uma "zona vazia" nos mapas dos arqueólogos.

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De acordo com Sprajc, de 67 anos, a expedição a Ocomtún durou aproximadamente um mês e meio, período considerado "relativamente curto", em comparação com a média mínima de dois meses desse tipo de missão. "A expedição foi feita no período de estiagem, o que pode ser complicado, mas nunca tanto quanto as caminhadas mais longas na estação das chuvas. Cercada por pântanos, Ocomtún tem pirâmides, praças, residências de elite e complexos 'estranhos' de estruturas dispostas quase que em círculos concêntricos, diferentes de tudo que já vimos nos baixios ocupados pela civilização", completou.

A maior estrutura registrada ali é uma pirâmide de pouco mais de 15 metros de altura, que, segundo o estudioso, teria sido um templo. Esta e outras estruturas se encontram sobre uma imensa plataforma retangular a dez metros de altura e com laterais de 76 metros de comprimento. "Só pelas proporções e a localização, já dá para perceber que é um lugar de destaque e importância. Agora, as escavações devem ajudar a esclarecer várias dúvidas, tipo quem vivia ali e qual sua relação com as outras cidades maias da época", afirmou Charles Golden, antropólogo da Universidade Brandeis.

Parece que os moradores saíram de Ocomtún mais ou menos na mesma época do abandono de outras cidades da civilização, entre 800 e 1000 d.C., período de declínio que os pesquisadores atribuem a fatores como a seca e as disputas políticas. De fato, ali também há sinais desse tipo de conflito. "A maior parte das estruturas não tem adornos, mas encontramos, em uma das escadarias, um bloco de ponta-cabeça com hieróglifos que parecem ser de outro assentamento maia. Às vezes, esse tipo de objeto era despojo de guerra de outros locais, o que parece ser o caso aqui", esclareceu Sprajc.

De acordo com Joyce, as imagens do bloco que retratam conquistas são normais, o que pode provar que Ocomtún participou das grandes guerras travadas pelas grandes potências do mundo maia.

A equipe também encontrou alguns terraços agrícolas – o que, para os arqueólogos, é marca das amplas modificações promovidas pela civilização para transformar os ambientes mais difíceis em espaços produtivos. "Usando a hidráulica, captando e conservando água e aplicando técnicas de engenharia como os terraços, os maias conseguiam viver em áreas que hoje parecem inóspitas", observou Martin.

Tanto que, para os grupos modernos de passagem, a água tem de ser fornecida por caminhões-pipa. Segundo Sprajc, mesmo depois de seu grupo ter aberto 60 quilômetros de picadas largas o suficiente para a passagem de carros até Ocomtún, ainda levavam de cinco a dez horas para chegar ao sítio por causa da dificuldade do terreno.

Agora é provável que outros pesquisadores batalhem pela verba, pelas autorizações e pelos suprimentos necessários para a escavação ali, mas Sprajc não será um deles. "Estou ocupado, já planejando outra expedição para março ou abril do ano que vem, também em Yucatán. As imagens do lidar já nos deram algumas pistas."

Os colegas, empolgados com o trabalho feito em Ocomtún, estão curiosos para saber o que pode vir por aí. "Isso é prova de que lugares como Campeche, ao mesmo tempo tão próximos de Cancún e de outras atrações turísticas tão disputadas, ainda tem locais que ninguém registrou antes. É sempre muito estimulante saber que ainda há regiões com segredos esperando para ser revelados", concluiu Golden.

c. 2023 The New York Times Company

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