Todos os anos, toneladas de roupas são jogadas ilegalmente no deserto do Atacama, no Chile. Diante do cenário de desperdício, uma ONG decidiu recolher e distribuir gratuitamente essas peças para pessoas ao redor do mundo.O objetivo da Desierto Vestido é chamar a atenção para o impacto ambiental da indústria da moda e dar uma nova utilidade ao que, até então, seriam apenas resíduos têxteis descartados de maneira incorreta.O engenheiro civil Bastián Barria, cofundador da ONG, percorre semanalmente o deserto em busca de roupas descartadas. Metade das peças que encontra estão em perfeitas condições. Ele armazena o material coletado e, após um processo de seleção e higienização, disponibiliza as roupas gratuitamente na plataforma digital do projeto.Segundo o jornal britânico The Guardian, que conversou com o projeto, a primeira remessa da iniciativa, enviada em março, distribuiu 300 peças de marcas renomadas, como Nike, Adidas e Calvin Klein.Em apenas cinco horas, todas foram distribuídas para compradores de países como Brasil, França, China, Estados Unidos e Reino Unido. Um novo lote deve ser disponibilizado em abril.O Chile é um destino de roupas de segunda mão e não vendidas, muitas delas vindas da Ásia, Europa e Estados Unidos, há anos. Em 2022, mais de 131 mil toneladas de roupas chegaram ao país, especialmente pelo porto de Iquique, uma zona franca no norte chileno. Parte desse material é revendida, mas até 70% de todo o montante acabam descartadas ilegalmente no deserto, segundo fontes locais citadas pelo The Guardian.Diferente de outros países, o Chile proíbe o despejo de resíduos têxteis em aterros sanitários, já que esses materiais podem causar instabilidade do solo. Como alternativa, muitas dessas roupas acabam empilhadas em lixões clandestinos ou são queimadas, gerando nuvens tóxicas que impactam o meio ambiente e a saúde da população.A crise, no entanto, não é exclusiva dos chilenos. Ela também ocorre em outros países, como Gana, onde enormes quantidades de roupas descartadas se acumulam na costa da capital, Accra.O descarte desenfreado de roupas é reflexo da expansão da fast fashion e da ultra-fast fashion. Há duas décadas, grandes marcas lançavam cerca de quatro coleções por ano. Hoje, o número pode chegar a 52 coleções anuais, com novas tendências surgindo a cada semana. Essa velocidade de produção gera um volume gigantesco de peças que não são vendidas e acabam descartadas. De acordo com a organização Global Fashion Agenda, o montante de resíduos têxteis gerados pela indústria da moda chegam a 92 milhões de toneladas todos os anos.Para piorar, o poliéster, material predominante na produção de roupas, é derivado do petróleo e leva até 200 anos para se decompor.A ONU (Organização das Nações Unidas) aponta que o setor é o segundo maior consumidor de água do mundo e responde por 10% das emissões globais de carbono, mais do que a aviação e o transporte marítimo juntos. A ação da Desierto Vestido, que é feita com outra ONG, a Fashion Revolution Brasil, quer não apenas retirar roupas do deserto, mas incentivar um consumo mais consciente. “Mais do que resgatar essas peças, queremos inspirar soluções e repensar o modelo da moda”, disse Fernanda Simon, diretora da entidade brasileira, ao The Guardian.Para participar do projeto e receber uma das peças resgatadas, basta se cadastrar no site da campanha e aguardar a próxima distribuição. O custo fica apenas por conta do frete, que pode chegar a R$ 200, dependendo do destino. O transporte é realizado por uma empresa que compensa a pegada de carbono gerada na logística, reduzindo o impacto ambiental.Fique por dentro das principais notícias do dia no Brasil e no mundo. Siga o canal do R7, o portal de notícias da Record, no WhatsApp