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A nova face da polícia

A hora não é de repetir erros e, sim, planejar e executar acertos. Aos novos chefes cabe a missão de construir o futuro das polícias

Arquivo Vivo|Percival de Souza, da Record TV

Novas cabeças pensantes vão determinar os rumos da política de segurança pública em SP
Novas cabeças pensantes vão determinar os rumos da política de segurança pública em SP

O ano novo de 2023, e com ele teremos novas cabeças pensantes que vão determinar os futuros rumos da política de segurança pública em São Paulo.

Esse futuro gira em torno de nomes. A máquina policial, por ser institucional, que eles irão chefiar continuará a mesma. O que pode mudar é a doutrina de chefia, de filosofia, de orientação, de determinação, de vontade em colocar em prática aquilo que sempre se desejou.

É preciso rejeitar as ideias obtusas que insistem em chegar até nós por meio de sarcófagos. Chega, não dá certo, nunca deu. Sendo assim, não se deve repetir coisas do passado, focar as necessidades do presente e projetar o futuro. Governos passarão. A polícia ficará.

Por vezes, é bem melhor ouvir as vozes de fora do que as de dentro. Aliás, algumas vozes de fora, no momento, são mais ouvidas do que as de dentro – ou seja, opiniões de pseudos “especialistas” são dominantes. Não se tem dado muita importância às vozes de dentro, as que fazem polícia, as vozes do ramo, as vozes de quem tem nas mãos a realidade cotidiana.


Vejamos as novidades. O secretário de Segurança, capitão Guilherme Derrite, será o chefe maior. A rigor, ele foi escolhido mais por ser deputado federal, ligado ao capitão-presidente Bolsonaro, do que oficial (não superior) da Polícia Militar. Aliás, era tenente ao se aposentar e ganhar, como é de praxe, uma estrela a mais nos ombros, dentro do critério de promoção automática para quem passa a vestir o pijama. O governador Tarcísio de Freitas foi eleito sendo enfant gatê indicado pelo presidente. A aliança política beneficiou Derrite, portanto escolhido como deputado e não capitão da reserva, num abismo hierárquico com o antecessor, general Campos, ex-Comandante Militar do Sudeste. Chegou a haver dúvida entre ele e o coronel PM, também aposentado, Melo Araújo. Derrite prevaleceu.

Nunca existiu na pasta de Segurança um titular oriundo da PM ou da Civil. Isso pode, ou poderia, gerar desconforto. Daí, o dedo de Tarcísio de Freitas foi diplomático: escolheu como secretário-adjunto o delegado de polícia Osvaldo Nico Gonçalves, até aqui delegado-geral de Polícia (chefe de toda a Polícia Civil). Simultaneamente, extinguiu os cargos de secretários-executivos da Polícia Civil e da Militar, respectivamente um delegado aposentado e um coronel reformado – o primeiro, ex-delegado-geral. O segundo, ex-comandante geral da PM. Os cargos eram fictícios e visavam, principalmente, blindar a sólida imagem do general Campos, que não poderia ser atingida por nenhum mal-feito de qualquer uma das Polícias.


Nico mostrou eficiência, muito empenho e desempenho, destacando-se com um delegado extremamente operacional e se tornando uma carta na manga, porque possui habilidade suficiente para ser um executivo de fato, pois possui livre e saudável trânsito entre as duas polícias, algo muito necessário no dia a dia.

Para o Comando Geral da Polícia Militar foi ungido o coronel Cássio Araújo de Freitas, atual comandante do CPI-6, na Baixada Santista, onde também obteve destaque em situações delicadas, mostrando-se um homem de princípios (é cristão) e equilibrada voz de comando. Ele e Derrite, que será secretário de Estado, relacionam-se bem e trabalharam juntos no 1º Batalhão de Choque, a sede da Rota, Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar.


A designação do coronel Cássio para o Comando Geral não é demérito algum para Ronaldo Miguel Vieira, ex-comandante do CPCh, o Comando de Policiamento de Choque.

A Delegacia Geral de Polícia, chefia de toda a Polícia Civil, ficará com o delegado Artur Dian, atual diretor do Dope, o Departamento de Operações Policiais Estratégicas. Trata-se do departamento, o maior dentro da estrutura da Polícia Civil. É o departamento caçula da Civil, que nasceu sob a chefia de Osvaldo Nico Gonçalves, justamente o delegado indicado para ser subsecretário de Segurança.

Como se vê, a cúpula operacional da Segurança Pública possui consistência, experiência, sabe o que quer e precisa fazer, em termos de eficácia e evolução. Saberá aparar arestas e dar respostas para críticos de plantão, que vivem atormentando as polícias, sem apresentar sugestão alguma, factível, para as atividades-fim: polícia judiciária, investigativa, e polícia ostensiva, ambas indispensáveis para a segurança pública em todos os sentidos.

O quarteto Derrite-Nico-Cássio-Dian vai precisar esquecer práticas ultrapassadas, inovando em suas tarefas, e saber dividir as fatias iguais desse imenso bolo chamado segurança, “direito e responsabilidade de todos”, na forma do caput do artigo 144 da nossa Constituição da República.

Aqui cabe uma lição preciosa de Bertold Brecht, filósofo, poeta e dramaturgo: “Há quem prepare cuidadosamente o seu próximo erro”. É preciso inteirar-se profundamente do que se passa dentro das duas máquinas policiais, porque – como ensinou o padre Vieira, num dos seus sermões, quem não pergunta não quer saber – e quem não quer saber, quer errar.

A hora não é de repetir erros e, sim, planejar e executar acertos. É necessário mudar algumas coisas. Os novos chefes sabem quais são e recebem, agora, a missão de desenhar e construir o futuro das polícias, pelo qual eles próprios sonharam, durante as suas trajetórias profissionais.

Mudar em alguns pontos é preciso. Tanto em prevenção como em investigação. As polícias são coirmãs. Os grandes inimigos de ambas são externos, e não internos. A missão delas é combater o crime, que é aquilo que interessa para a população, tapando os ouvidos para os que só querem combatê-las, fazendo de conta que não existe uma criminalidade avassaladora, da qual são, talvez inconscientes, inocentes úteis.

A propósito, interessante recordar alguns versos de Camões, na sua obra Os Lusiadas, quando diz que os tempos se mudam, “mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança, todo o mundo é composto de mudança”.

Nessa hora de mudança, a vontade da sociedade é que os novos chefes de polícia tenham sucesso, transmitindo uma sensação de segurança, afastando a tenebrosa, trágica e sinistra insegurança.

As prioridades policiais giram em torno, principalmente, dos assassinatos – um dos maiores índices do planeta, 6 vezes mais do que nos Estados Unidos e 29 vezes maior do que no Reino Unido.

A violência criminal somada provoca traumas e representa mais de 5% do PIB nacional. Há regiões dominadas por bandidos, em geral traficantes, que aterrorizam a maioria honesta dos habitantes, que não estão nesse tipo de lugar porque querem, e sim porque são alijados pelas desigualdades sociais. É o domínio do cruel sobre o mais fraco. É a inversão da lei que deveria proteger os fracos contra os mais fortes. É a prova de que apenas a força contra o direito é pura estupidez, mas o direito sem a força é uma ficção inútil. É a verdade escrita por Vitor Hugo: quem protege o lobo, condena automaticamente as ovelhas à morte.

Boa sorte, novos chefes. Se eu tivesse procuração da sociedade, diria que se espera muito da nova cúpula de segurança. E que há confiança no currículo profissional de cada um, suficientes para mudar rumos em direção ao bem de todos.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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