Deus ajuda quem cedo madruga 

Aquele era meu dia de sorte. E olha que nem em sorte eu acredito. Mas, em certos momentos, parece que o universo conspira a favor.

Caminhão, carregado de carne, invade muro de condomínio, em SP

Caminhão, carregado de carne, invade muro de condomínio, em SP

Reprodução/Record TV

A história, por si só, já seria inusitada. Um caminhão, desgovernado, e carregado de carne, havia invadido o muro de um condomínio, na zona norte de São Paulo. Era madrugada quando a notícia chegou à redação. Aquela seria a nossa aposta do dia.

Coincidentemente, o prédio atingido era o mesmo onde morava o meu repórter cinematográfico, Ricardo Bonifácio. Pra nós, já era meio caminho andado. O Ricardinho tinha livre acesso ao condomínio e ainda conhecia a síndica e moradores que poderiam ajudar na nossa apuração.

Quando chegamos, a movimentação de policiais era grande. Logo, de cara, flagramos uma pequena confusão na porta de um estacionamento. Tinha sido por lá que o caminhão havia invadido o condomínio. A dona e a síndica do prédio batiam boca. A mulher, responsável pelo espaço, não quis falar comigo. Nem me deixou entrar pra mostrar o estrago. De longe, a imagem já era impressionante. O caminhão estava pendurado com a carroceria aberta. Faltou um triz pra ele despencar do barranco e atingir os apartamentos.

Como num piscar de olhos, a dona do estacionamento mudou de ideia. "De que TV você é?", perguntou ela."Da Record", respondi. "Ok, vai lá. Pode entrar". Não pestanejei. Entrei rápido antes que a mulher decidisse voltar atrás. Aquela era a chance de ver tudo mais de perto. E foi a oportunidade que eu tive pra descobrir que a história não era bem aquela. Não tinha sido, apenas, um acidente. Tinha algo muito maior por trás.

Ao entrar, me aproximei dos policiais. Assim que me apresentei, perguntei o que tinha rolado. Um dos oficiais me disse: "O caminhão é roubado e, aparentemente, ao tentar fazer uma manobra no estacionamento, o motorista perdeu o controle e desceu ladeira abaixo até bater no muro do prédio, aos fundos". Naquele momento, eu tinha outra reportagem. Era outra versão. Aquilo mudava tudo e me fazia pensar nas mais diversas possibilidades.

Câmeras de segurança registraram o momento em que o caminhão desce, desgovernado

Câmeras de segurança registraram o momento em que o caminhão desce, desgovernado

Reprodução/Record TV

Entre uma pergunta e outra, num bate-papo informal com o policial, questiono se o motorista – provavelmente, o criminoso – havia sido localizado. Ele responde: "Não. Inclusive, a imagem da câmera de segurança mostra um homem fugindo logo em seguida". Eu rebato: "Câmeras? O senhor tem essa imagem? Eu posso ver?". Esperando uma resposta negativa, me surpreendi, novamente. "Tenho aqui, sim, dá uma olhada", respondeu o PM.

A imagem era nítida. Mostrava, exatamente, tudo. Toda a dinâmica daquele incidente estava registrada no vídeo. Enquanto eu assistia, pensava em como iria convencer o policial a me passar o circuito. Eu era, até então, o único repórter lá dentro. Aquela era a primeira imagem do caso, que tinha acontecido há poucas horas. "O senhor poderia me passar essa imagem? Me ajudaria muito". De forma sucinta, ele disse: "Me passa seu número".

Pronto. Aquele era meu dia de sorte. E olha que nem em sorte eu acredito. Mas, em certos momentos, parece que o universo conspira a favor. É Deus ajudando quem cedo madruga. Eu tinha outra história e imagens exclusivas daquela que era nossa aposta do dia. Ao chegar mais perto do caminhão, a imagem era ainda mais surreal. Técnicos da CET – Companhia de Engenharia de Tráfego – e da Defesa Civil estudavam a melhor maneira de tirar o veículo, pesado, carregado com 12 toneladas de carne, daquele lugar. Seria uma baita força-tarefa.

Força-tarefa pra içar caminhão pendurado em barranco

Força-tarefa pra içar caminhão pendurado em barranco

Reprodução/Record TV

Felizmente, ninguém ficou ferido. Mas, a síndica e os moradores do prédio estavam indignados. O Ricardo Bonifácio, repórter cinematográfico, e morador do prédio me ajudou a ter acesso ao condomínio. Lá, conversamos com as pessoas que, assustadas, passaram a madrugada em claro. Algumas, tiveram de se amontoar, de forma improvisada, na academia e outros espaços do local. O que mais se via eram os vizinhos carregando colchões, travesseiros e cobertores.

Passamos a madrugada e, praticamente, a manhã toda por lá. Graças ao Ricardinho, conseguimos um local privilegiado para abrir o Balanço Geral Manhã, ao vivo. Estávamos, praticamente, debaixo do caminhão pendurado. Era uma área isolada, mas o ponto onde ficamos estava seguro. Nesse meio tempo, enquanto a gente se preparava pro jornal, eu ia escrevendo a reportagem, falando com a chefia, editores e gerando todo o material exclusivo.

Ao vivo, no Balanço Geral Manhã, pela Record

Ao vivo, no Balanço Geral Manhã, pela Record

Reprodução/Record TV

O jornalismo factual é, mesmo, vibrante. A gente se surpreende a cada instante. A história chega de um jeito, mas, quanto mais a gente cava, mais a gente descobre novos detalhes. E, muitas vezes, são detalhes que mudam todo o direcionamento do caso. É claro que nem sempre é assim. Tem dia que parece água mole em pedra dura. Só que a gente bate e não fura. Dá aquela frustração, mas amanhã é sempre um novo dia. Depois, ficam as histórias, os bastidores e os perrengues pra contar. E eu, como não sou baú, não estou aqui pra guardar segredo, né?

Até quinta-feira!

Como foi pro ar? Veja um trecho da cobertura no dia, ao vivo, no Balanço Geral Manhã

Últimas