Comandante ressalta importância do treinamento e prioridades na segurança de voo
O brasileiro Conrado Ibri, que atua no exterior, destaca a estrutura e os bastidores das operações nas companhias aéreas
Luiz Fara Monteiro|Do R7
O Comandante brasileiro Conrado Ibri, que atua por uma companhia aérea no exterior, produziu um artigo especial para o Blog sobre a função de tripulantes a bordo de aeronaves. O artigo é importante para boa parte dos passageiros que, muitas vezes, não têm conhecimento sobre as prioridades cumpridas durante uma viagem. Acompanhe:
Quando você viaja de avião, alguma vez já parou para pensar em toda a estrutura que existe por trás daquela empresa para fazer o seu vôo acontecer?
É gigantesca. Muito maior do que você provavelmente possa imaginar.
Para ter tripulantes habilitados e qualificados para conduzirem e atenderem o seu voo, por exemplo, a empresa precisa ter uma estrutura de ensino muito bem estruturada, como uma mini escola. De fato, algumas empresas chamam os seus próprios centros de treinamento de Academia, tamanha a semelhança com uma instituição de ensino.
Pilotos e comissários, quando ingressam na empresa, passam por uma imersão de treinamento que leva, em geral, aproximadamente 3 meses. Aulas sobre regulamentos, procedimentos, etiqueta, equipamentos, provas e mais provas… simulador de voo para pilotos, simulador de cabine para os comissários. Simulações e mais simulações de inúmeras situações inesperadas e de emergência, além do próprio treinamento em voo quando o tripulante passa por todas as fases do treinamento em solo.
Ainda, todos os tripulantes da empresa anualmente voltam à “academia” ao menos uma vez ao ano para comissários - para treinar novamente procedimentos de emergência - e inúmeras outras para pilotos. Esses profissionais realizam avaliações sobre conhecimentos técnicos de diversas áreas ao menos uma vez ao ano, e voltam ao simulador de voo para treinar situações de emergência em voo também de uma a duas vezes ao ano.
Emergências como falha ou fogo nos motores, despressurização, fumaça a bordo, falha elétrica, falha hidráulica, falha dos controles de vôo, estouro de pneu, vazamento de combustível, condições extremas meteorológicas, etc. Situações que provavelmente nunca nem você e nem mesmo os pilotos passaram em um voo real, mas eles são exaustivamente treinados para lidar com elas. E postos à prova a todo instante.
E quando um copiloto faz a sua transição para o posto de comandante, tudo se inicia novamente, como se ele tivesse novamente entrado na empresa. Mais meses e meses imerso em cursos e treinamento em simulador até poder efetivamente “produzir”.
O treinamento é preciso, repetitivo e exaustivo, para que os tripulantes ajam quase que automaticamente e respondam com procedimentos precisos às situações mais difíceis, sem deixar que a tensão os atrapalhe. Pra se ter uma ideia, uma empresa que possua 100 aviões do modelo Boeing 737 ou Airbus 320, aviões que normalmente cobrem a malha continental do Brasil, terão em seu quadro aproximadamente entre 800 e 1000 pilotos e entre 1800 a 2000 comissários de bordo.
Portanto estamos falando de uma estrutura para treinar cerca de 3000 tripulantes non-stop, usando um jargão bem conhecido da aviação. E, evidentemente, as empresas possuem em seus quadros diversos “professores”, que irão ministrar treinamento para este universo enorme de pessoas durante o ano inteiro.
Ah, não esqueçamos que toda esta estrutura tem um custo extremamente alto.
Para se ter uma ideia, um único simulador de voo para treinamento de pilotos, que atende não mais do que aproximadamente 250 pilotos por ano, custa a pequena bagatela de 15 milhões de dólares.
Algumas empresas possuem seus próprios simuladores, outras, alugam de empresas provedoras.
Portanto, quando você atravessa o “finger” e pisa no avião para a sua viagem, saiba que aqueles tripulantes ali trabalhando para fazerem o seu voo acontecer de forma segura e agradável, são pessoas extremamente técnicas, parte de um sistema muito complexo e custoso para mantê-los aptos a lhe conduzir até o destino.
Se pensarmos que em regras gerais o combustível necessário para o voo é de 40 a 45% do custo fixo total da viagem, não sobra muita margem para os outros diversos custos que a empresa tem para a operação, tudo - claro - quase sempre precificado em dólar.
É. Aviação é sem dúvida uma indústria complexa, que opera com margens extremamente mínimas, feita por pessoas em geral altamente qualificadas.
Assim, da próxima vez que você entrar em um avião, tenha duas certezas: a primeira, por mais cara que a sua passagem tenha custado é muito provável que aquele voo esteja operando sem margem de lucro nenhuma, a não ser que esteja lotado. A segunda… bem, a segunda é que aqueles profissionais que ali estão para te conduzir e te atender são pessoas altamente qualificadas em suas funções, por mais que você tenha uma impressão negativa porque não foi atendido com a simpatia que esperava ou não ganhou aquele sorriso que é tão agradável aos olhos. Eles estão ali para te atender bem sim, sem dúvidas, mas sua principal função é agir rápida e eficientemente em caso de uma emergência. E acredite: eles estão muito bem preparados para isso, sorrindo ou não.
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