Se no segmento de quatro rodas o modelo “Crossover”, equivocadamente chamado SUV, praticamente aposentou o modelo “Station wagon”, não se pode afirmar o mesmo no mundo da motocicleta com a Sport Touring frente a Crossover que muitos chamam, também equivocadamente, de Big Trail. Explico: Crossover tem posição ereta de Big Trail, suspensão de longo curso, mas… está calçado com rodas de liga-leve de 17 polegadas com pneu de perfil esportivo, enquanto a trail tem rodas raiadas de 19 e 21 polegadas com pneus de uso misto com a possibilidade de pneu off-road. Temos ainda, alguns fabricantes que, talvez, por marketing tem chamado o modelo Crossover de Sport Touring ou, ainda, trata como Big Trail, mesmo sabendo que o projeto não é uma coisa nem outra. A categoria Sport Touring é moto que foi derivada de uma esportiva, motor amansado, carenagem, cara de esportiva, mas com o conforto de turismo. Assim é a Kawasaki Ninja 1000 Tourer, uma moto cujo alquimistas, entenda engenheiros, de Akashi pegaram a esportividade da ZX-10R que há 3 anos ganha tudo no mundo das competições do WSBK e a tornaram um produto de turismo com uma competência ímpar. Rodei bastante com o modelo 2015 durante o apoio da Kawasaki ao Projeto Motociclismo com Segurança em 2016 e consultando minhas anotações, as principais alterações, além da carenagem que a deixou mais esportiva remetendo a sua irmã ZX-10R, faróis em Led, luzes de pisca menores, banco do piloto com mais espaço e o do garupa com mais espuma e uma elevação que ajuda o ou a garupa não deslizar para cima do piloto, as alças mais ergonômicas que integram ocultamente as conexões das malas que vêm de série da marca GIVI, novo painel, melhor proteção aerodinâmica e bolha ajustável em 3 posições.Motor É o mesmo quatro em linha com 1043 centímetros cúbicos com novas calibrações apenas para atender normas anti-poluição, refrigeração líquida, 4 tempos, que rende 142 cavalos de potência a 10.000 RPM e 11,3 Kgfm de torque a 7.300 RPM. O módulo de potência foi mantido e é possível brincar no F de Full mantendo a potência máxima ou no Low reduzindo para cerca de 100 cavalos.Eletrônica Aqui na minha opinião a principal novidade dessa Sport Touring que utiliza sistema de gerenciamento eletrônico de motor da Bosch ou plataforma inercial tecnicamente chamado de IMU (unidade de medição inercial) que na NInja 1000 é denominado KCMF (Kawasaki Cornering Management Function) que controla a tração (ajustável em três configurações, denominado KTRC) e os freios - KIBS (Kawasaki Intelligent anti-lock Brake System).Chassi Não foi alterado, tubular duplo de alumínio com o motor fixado em quatro pontos oferecendo excelente rigidez. Suspensão dianteira com curso de 120mm com garfo telescópico invertido de 41 mm com retorno, compressão e pré-carga da mola ajustáveis e suspensão traseira horizontal com curso de 144mm com amortecedor a gás, retorno de pré-carga da mola ajustáveis com muita facilidade, dado o ajuste remoto do lado direito, ambas de grife Öhlins. Freios dianteiros com dois discos de 300 mm em formato margarida, monobloco com fixação radial de 4 pistões opostos e freio dianteiro simples de 250 mm, também, em formato margarida com pistão simples. Rodas de 17 polegadas dianteiro com 120/70 e traseira com 190/50, calçados originalmente com Bridgestone.Pilotando Contemplado a máquina, você percebe o cuidado no acabamento, peças perfeitamente encaixadas, manetes ajustáveis na cor preta foi de muito bom gosto. Ao montar na máquina, me senti vestindo uma roupa confortável sob medida. Do alto dos meus 1,65 de estatura, coloco os dois pés no chão, me familiarizo com painel, como já disse bolha ajustável em 3 posições por meio de uma alavanca escondida do lado direito logo abaixo do painel, punhos ergonômicos e aqui uma NOTA: os punhos da Kawasaki considero exemplar, o melhor do mundo das motos, tudo no seu devido lugar, punho direito só com o botão para acionar e afogar o motor, punho esquerdo com botões de buzina, pisca de direção, pisca-alerta, lampejador de farol alto no dedo indicador, além do botão para acessar computador de bordo e configurar a eletrônica. Todas as vezes que precisei de uma função como pisca-alerta, buzina ou pisca de direção, agi por instinto sem precisar pensar onde estava a p@#$% do botão. Especialmente a Honda e a Harley-Davidson podiam, literalmente, copiar os punhos da Kawasaki. Na quinta-feira pré-carnaval, tempo seco, rumei para Joinvile-SC, sai de casa por volta das 14 horas, trânsito um pouco pesado na BR 116, mas fluindo, surpresa na Serra do Cafezal já duplicada, mas com a pista sentido Curitiba com asfalto bem ruim, já se notando o bom acerto de suspensão (default) da Ninja 1000, bem entre o conforto e esportividade, copiando bem as imperfeições do asfalto, mas sem dar fim de curso. As malas de 28 litros cada da GIVI, que cabe um capacete fechado, não atrapalha em nada em baixa ou alta velocidade, no tráfego em rodovia ou urbana quando necessário passar por corredor, basta ter como parâmetro os espelhos retrovisores que são excelentes, propiciando boa visão. Sempre viajo com protetor auricular, mas estava com saudade da sinfonia dos 4 cilindros de uma japa e como o capacete que usei é um dos mais silenciosos do mercado, deixei o protetor na bagagem e fui curtindo aquele som, que fica enfurecido a partir dos 6500RPM, emanado pelos dois escapamentos. A viagem durou cerca de 6:30 horas, cheguei no hotel já estava noite e pude constatar a excelente iluminação em LED e um detalhe bacana que aumenta a segurança, quando lampeja o farol alto, o baixo é mantido. O painel com conta giro analógico e todas as demais informações (marcha engatada, km total, km´s parciais 1 e 2, hora, range, temperatura externa, temperatura do motor em barra, nível de combustível) em tela LCD, é bonito e completo, mas sua visualização é complicada com sol a pico e perfeita à noite. Cansaço zero: o piloto, como já disse, fica vestido na Ninja 1000, pedaleiras levemente recuadas, braços ficam relaxados, pernas bem posicionadas no tanque de 19 litros, banco com boa densidade de espuma, ao menos o “popo” não acusou nada, o vento é bem deslocado pela carenagem, a proteção aerodinâmica melhorou em relação ao modelo 2015 com as pernas bem protegidas, mas braços, peito e cabeça leva vento e a carenagem só cumpre sua função quando você já está cometendo infração de trânsito no quesito velocidade.Na faixa dos 120km/h toma vento e o capacete suja, sendo necessário carenar, mas se você viajar com uma mala de tanque como eu fiz, não tem jeito, seja qual for o ajuste da bolha. No sábado, fiz um passeio por Santa Catarina com os amigos Cristiano e João Carlos, ai sem malas e no ajuste 2 da bolha e podendo pilotar mais carenado, foi perfeito. Nos trechos de serra bem travado, por vezes bem íngremes subindo ou descendo, você se rende à tecnologia da máquina e o acerto. Em retomadas, o giro sobe rápido e 4ª, 5ª ou 6ª marchas, e muito rápido, um míssel em 2ª e 3ª marchas. Tem baixa vibração, mas é possível sentir em altas rotações, mas nada que chega a incomodar. O motor é tão linear, que é possível passar por aquelas chicanes de pedágio a míseros 30 km/h em 6ª marcha e só enfiar a mão. A embreagem é macia e assistida, ou seja em reduções bruscas não permite o travamento da roda traseira, o câmbio é perfeito como um relógio suíço bem justo, preciso, é só tocar, não precisa chutar como ocorre com máquinas italianas, por exemplo. Foram cerca de 300 km por intermináveis curvas e retas onde trabalhei bem o motor em alto giro, deixando para frenar já dentro da curva e com ela inclinada por vezes, depois de muito preparo mental, acionar o freio dianteiro e notar que ela continua inclinada e na trajetória a que foi imposta. Os freios são excepcionais na potência e progressividade, antes de enfiar a mão, não esqueça de travar as pernas no tanque, pois a mordida inicial é bruta como deve ser uma esportiva, lembrando que existe o controle inercial da IMU - KCMF que controla o sistema KIBS e que permite utilizar o freio dianteiro mesmo com a moto inclinada sem sair da trajetória. Com um freio convencional moto levanta e sem o freio ABS é bem provável, dependendo do tato, que se perca frente. No final do passeio, pós almoço, entre Pomerode e Blumenau, muita chuva e confesso que a BR-470 não é minha pista favorita, por ser pista única com sentidos opostos, asfalto péssimo com ondulações ou esburacada. Aí reduzi a potência para o Low e enfiei o controle de tração no nível 3 e percebi que a atuação fica ruim. Passei para o controle 2 melhorou bastante e não a meu gosto e no 1 ficou ideal com a potência no L, ou seja cerca de 100cv. Logo depois das entradas para Blumenau, com o trânsito já fluindo como se deve em uma rodovia, voltei para o Full e mantive o controle de tração no nível 2, ficando ao meu gosto. No nível 3 nota-se a atuação do controle de tração mas, bem menos que com a potência no L. No domingo sob chuva, subi a serra, passei por Curitiba e cortei o Estado do Paraná para o Oeste de São Paulo, rodando cerca de 570 km até região de Ourinhos-SP. Logo depois da serra já na região de São José dos Pinhais vinha na velocidade da via, o tráfego com vários veículos e de repente tudo pára. Aí você dá real importância para ergonomia dos punhos: acionei o pisca-alerta sem tirar os olhos da pista, iniciei a frenagem e entrei no corredor. Era um acidente bem feio envolvendo dois carros e uma moto, mas além de me safar, pude avisar a tempo os veículos que vinham atrás, por meio do pisca-alerta a necessidade de diminuir a velocidade. Depois de 570 km alternando seco, chuva e chuva torrencial, mais uma vez cheguei sem cansaço e podendo rodar outros 500 km. Voltei para São Paulo com meu filho com cerca de 70 kg e 1,70 de altura na garupa, com as malas sempre carregadas na sua capacidade, quando ele montou, pedi para desmontar e ajustei a suspensão traseira rodando no sentido horário para aumentar a pré-carga do amortecimento, dois clicks foi o suficiente. Com garupa, notei o bom espaço, o quanto as alças para garupa são ergonômicas e em boa altura, já que ele segurava ora nas alças, ora no piloto. Ponto negativo para o fato de que o garupa não consegue ficar com a ponta dos pés na pedaleira devido as malas, gerando um certo desconforto, mas não invade o território do piloto que ficava com a ponta dos pés na pedaleira. Quanto ao banco do garupa apesar do bom encaixe, reclamou da densidade da espuma, achou um pouco duro para todo o trajeto de 420 km. Meu outro filho com mesma estatura e mais pesado, cerca de 80kg, rodou só 30 km e teceu elogios. Com ele eu precisei aumentar a pré-carga da suspensão traseira. Pilotando sozinho voltei a suspensão traseira para default e sem as malas, trafegando pelas ruas de São Paulo pude notar o quanto a Ninja 1000 é polivalente: vai bem nos corredores, vez ou outra enroscando os retrovisores que dependendo da situação basta fechá-los, seu entreeixos de 1,44 m e por ser bem esguia é possível ziguezaguear entres os carros tranquilamente.Nota: é digno ressaltar que mesmo no trânsito pesado, com o indicador de temperatura do motor informando alto grau, nada, absolutamente nada do calor do motor é passado para o piloto o que demonstra o bom trabalho dos alquimistas japonesas com o tratamento térmico das carenagens e o calor que é desviado mesmo com a ventoinha ligada. Por fim, depois de pouco mais de 2 mil km percorridos em trechos urbano e de rodovia, no seco ou com chuva torrencial, de dia, nublado ou à noite, duas palavras que vem a mente para sintetizar a Ninja 1000 Tourer: confiança e tesão. Confiança: o motor japonês é consagrado, não quebra, a corrente da transmissão final só foi lubrificado não necessitando em momento algum seu ajuste. Tesão: a Ninja 1000 faz jus ao nome, é possível uma tocada esportiva com conforto ou citadina. Motor, chassi, eletrônica são os elementos que se completam em perfeita sintonia nessa verdadeira alquimia verde. Preço: 59.990,00 ou 60 mil reais com toda essa tecnologia embarcada mais as malas GIVI, dentro da faixa de preço do que é oferecido no mercado, tem com um bom custo-benefício. E a manutenção não é salgada. Concorrente direta no Brasil no estilo e proposta: Ducati Supersport, apresentada no Salão Duas Rodas, mas que não consta ainda no site brasileiro e nada foi falado se configuração será no standard ou S que vem com as malas laterais. Concorrente direta no Brasil só na proposta: todas as Crossover´s, inclusive sua irmã Versys 1000. A Ninja 1000 Tourer vem completa, faltando apenas tomadas de 12 volts, aquecimento de manopla e o controle de velocidade, vulgo piloto automático, acessórios que são oferecidos pela rede de concessionários. No Brasil não consta o aquecimento de manopla como acessório oferecido, mas é possível comprar no exterior original Kawasaki e colocar. Consumo: depende da mão. Melhor média 20,5 km/l e pior 15,5km/l. Infelizmente dado o preço do combustível só utilizei gasolina comum ou aditivada, mas deve dar uma diferença brutal com gasolina com alta octanagem.