Do aço ao agro: Empresa transforma resíduos siderúrgicos em fertilizantes
A Harsco Environmental reaproveita subprodutos da siderurgia e os transforma em fertilizantes para uso no agronegócio
A Harsco Environmental produz um fertilizante feito a partir da escória do aço. O Agrosilicio, é um produto que tem uma pegada de carbono 95% menor do que os fertilizantes convencionais e pode ser aplicado diretamente no solo.
Conversamos com o CEO da empresa na América Latina, Wender Alves, sobre sustentabilidade, economia circular e os planos de expansão da companhia.
Mundo Agro: Me conta um pouco sobre a empresa.
Wender Alves: A Harsco é uma empresa com quase 200 anos. Ela nasceu na capital da Pensilvânia, nos Estados Unidos, berço da produção de aço no país. Desde o início, já tinha um DNA sustentável: surgiu com a proposta de transformar o que era considerado resíduo — a escória siderúrgica — em algo útil, reprocessando esse material para recuperar a sucata metálica contida nele. Ao longo dos anos, especialmente na última década, percebemos que tínhamos uma natureza sustentável e precisávamos resolver um segundo problema: o que fazer com o que não era metal, o que não tinha aplicação imediata. A partir disso, nos dedicamos ao desenvolvimento de novos produtos, principalmente a partir dos óxidos presentes nesses materiais.
Mundo Agro: Ou seja, quando ainda não se falava em sustentabilidade, a Harsco já atuava com essa visão.
Wender Alves: Exato. Há 20 anos, pouquíssima gente falava sobre sustentabilidade, economia circular ou pegada de carbono. Mas nós já enxergávamos esse como o caminho para o futuro. Oferecer apenas serviços de limpeza industrial não era suficiente. Nosso objetivo sempre foi transformar 100% do que chamavam de lixo em produto — com qualidade técnica, que reduzisse a pegada de carbono e promovesse a circularidade. Foi com essa visão que nasceu o Agrosilicio. Claro, enfrentamos muitos desafios no processo, o que é natural em qualquer desenvolvimento. Mas tivemos a sorte de encontrar muitas pessoas e instituições dispostas a apoiar essa ideia — o que foi essencial para o sucesso que temos alcançado.
Mundo Agro: O Agrosilicio foi desenvolvido por vocês. Houve uma parceria com a Embrapa, certo?
Wender Alves: Sim. O produto começou a ser desenvolvido na nossa planta nos Estados Unidos e rapidamente foi trazido para o Brasil. Entendemos que era necessário tropicalizar o Agrosilicio, adaptando-o às necessidades específicas do agricultor brasileiro. E foi aí que tivemos a sorte de encontrar a Embrapa de portas abertas. Este ano estamos completando nove anos de parceria ininterrupta. Eles entenderam a importância de continuar o desenvolvimento e a caracterização técnica do produto — o que foi essencial para nossa evolução.
Mundo Agro: Vocês também têm uma parceria com o Governo de Minas Gerais e com a Emater para a doação do fertilizante?
Wender Alves: Sim. Iniciamos, junto ao governo, um programa de doação voltado à agricultura familiar, que abastece o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Em 2023, doamos 10 mil toneladas do nosso fertilizante com esse objetivo. Mas mais do que entregar o produto, queríamos levar conhecimento ao pequeno agricultor. Mostrar como usar o Agrosilicio e também oferecer apoio técnico para o desenvolvimento da lavoura.
Mundo Agro: Quanto vocês produziram no ano passado e qual é a expectativa para este ano?
Wender Alves: Em 2023, comercializamos quase 300 mil toneladas, o que nos levou praticamente ao limite da capacidade instalada da fábrica até então. Por isso, temos um plano ambicioso de expansão no Brasil. Acreditamos que o futuro da indústria está em reinventar aplicações para aquilo que hoje é visto como lixo. Nosso propósito é construir pontes entre diferentes setores — como fizemos entre a indústria e o agronegócio. Quando entendemos o problema de um setor como oportunidade para o outro, todo mundo ganha.
Mundo Agro: Em 2024, a empresa anunciou um investimento de R$ 220 milhões em Minas Gerais. Como está esse processo?
Wender Alves: A primeira fase desse investimento foi concluída em 2023. A partir de maio, que é o pico da demanda de fertilizantes para correção do solo, já estaremos com 100% da nova capacidade instalada, totalizando 400 mil toneladas por ano. Mas acreditamos que isso ainda não será suficiente. Provavelmente, já neste ou no próximo ano, bateremos novamente essa capacidade — por isso é tão importante concluir o investimento total. Já aplicamos cerca de R$ 130 a R$ 140 milhões. A segunda fase envolve a construção de uma nova fábrica, que está em fase final de negociação com nosso parceiro — que também será fornecedor da matéria-prima para o Agrosilicio.
Mundo Agro: O tarifaço do presidente dos EUA, Donald Trump, afeta o setor?
Wender Alves: Sem dúvida. A medida gera a necessidade de um reequilíbrio global e afeta diretamente o mercado siderúrgico brasileiro — que é nosso principal cliente. Quando a siderurgia vai bem, nós também vamos. Quando ela sofre, nós sofremos juntos. Acredito que a melhor resposta a isso é o diálogo, e temos buscado manter uma comunicação ativa. O Brasil e os Estados Unidos têm muito a ganhar mantendo uma relação comercial próxima, especialmente no setor de exportação de aço.
Mundo Agro: Como foi o ano de 2024 e quais as perspectivas para 2025?
Wender Alves: 2024 foi um ano de muita satisfação. Para mim, um bom ano é aquele em que conseguimos terminar melhor do que começamos — e isso foi fruto do empenho da nossa equipe. Ver o brilho nos olhos do time faz toda a diferença. Superamos muitos desafios com trabalho e dedicação, e entramos em 2025 com muita esperança e determinação para fazer ainda mais. Expectativa sem trabalho não leva a nada, e aqui o que não falta é empenho.
Mundo Agro: Em outras entrevistas, duas frases suas chamaram minha atenção. A primeira: “Está na hora da gente aumentar o número da roupa.”
Wender Alves: Foi isso que fizemos no ano passado. Acredito no futuro e nos nossos projetos. Não dá pra ficar com medo. Se temos nas mãos um fertilizante de alta qualidade, com baixa pegada de carbono e benefícios comprovados pela Embrapa, temos que expandir. Não dá pra encolher. É hora de vestir um número maior, acreditar na transformação.
Mundo Agro: E a segunda frase: “Nós temos uma pérola na mão.”
Wender Alves: Sim. Continuar tratando como lixo o que pode ser transformado é uma escolha. Quando mergulhamos fundo, usamos a tecnologia e esticamos as fronteiras da inovação, descobrimos que há jeito para quase tudo. Minha formação como engenheiro não me permite acreditar em problema sem solução — só em problemas cuja solução ainda não enxergamos. O Agrosilicio é uma dessas soluções. Uma pérola pouco explorada, mas que representa exatamente o que acreditamos: a reinvenção dos materiais e o poder de transformar o problema de um setor em valor para outro. E ainda estamos buscando novas pérolas — especialmente para o agronegócio brasileiro.
Mundo Agro: Estou encantada com todo o trabalho realizado por vocês.
Wender Alves: Obrigado, Fabiana. Falar com você e com os leitores do seu blog é uma alegria. Mostrar que temos, no Brasil, a capacidade de transformar materiais e de fortalecer ainda mais o agronegócio mais sustentável do mundo é um orgulho. Nosso desafio agora é colocar ainda mais valor nesse agro — reduzindo a pegada de carbono e reinventando o futuro com inteligência e propósito.
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