Assédio ao ofertar consignado gera quase 1 mi de ligações bloqueadas
Em nove meses, 935.056 pessoas solicitaram ao serviço Não Perturbe para não receber mais telefonemas de instituições que oferecem o crédito
Renda Extra|Do R7
De janeiro a setembro deste ano, quase um milhão de pessoas (935.056) solicitaram, junto ao “Não me Perturbe”, o bloqueio telefônico para evitar o assédio de instituições financeiras e correspondentes bancários que oferecem crédito consignado. Nesses nove meses, ainda, a autorregulação do crédito consignado já aplicou 122 punições contra correspondentes bancários, por conta de reclamações de consumidores a respeito da oferta irregular do produto de crédito.
O levantamento realizado pela Febraban (Federação Brasileira de Bancos) revela que, ao todo, 77 correspondentes foram advertidos e 45 tiveram atividades suspensas. Em casos de reincidência, as atividades foram suspensas por prazos de 5 a 30 dias.
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Nos casos graves de reincidência, a autorregulação prevê ainda que o correspondente possa ser suspenso de forma definitiva na oferta de crédito consignado em nome dos bancos.
Criado pela Febraban em parceria com a ABBC (Associação Brasileira de Bancos), a autorregulação tem como objetivo dar mais transparência à oferta de crédito consignado e combater o assédio comercial e as más práticas relacionadas ao produto, “uma importante modalidade de crédito e ferramenta de inclusão financeira, com custos mais reduzidos e com maior acesso à população”, afirma a Febraban.
Isaac Sidney, presidente da Febraban, reitera que tanto a federação quanto as instituições financeiras não compactuam com práticas irregulares de agentes que buscam lesar o consumidor, e garante que o combate a esse tipo de prática está sendo feito. “Todos aqueles que foram identificados com ações irregulares na oferta de crédito consignado tiveram pronta punição aplicada de acordo com as regras da autorregulação”, diz Sidney.
“O assédio comercial, especialmente a aposentados e pensionistas, para oferta de crédito consignado é uma prática inadmissível que está sendo fortemente combatida pelos bancos. Criamos os compromissos de autorregulação para promover a concorrência saudável, incentivar as boas práticas de mercado e aumentar a transparência, em benefício do consumidor e de toda a sociedade”, destaca o presidente da Febraban.
Crédito consignado
Apesar da oferta irregular a consumidores, o crédito consignado é uma boa alternativa dentre os produtos de créditos ofertados no Brasil.
Para Arthur Igreja, especialista em finanças e tendências e professor convidado da FGV (Fundação Getúlio Vargas), o assédio excessivo aos consumidores é uma atitude que afasta o brasileiro do consignado.
"A ligação telefônica é uma abordagem extremamente antiga e invasiva. Estamos num mundo onde as empresas precisam cativar cada vez mais os consumidores, tratá-los de forma absolutamente respeitosa e eficiente, e essa abordagem telefônica é inadmissível", avalia Igreja.
É a falta de percepção de que o mundo mudou e as mudanças são enormes
De acordo com o Banco Central, o consignado é “uma modalidade de empréstimo, conhecida popularmente como empréstimo com desconto em folha, em que a prestação é descontada diretamente do salário, da aposentadoria ou da pensão pela fonte pagadora (entidade consignante)”.
Segundo o BC, há duas modalidades de empréstimo consignado, a primeira é o convencional. “Com prazo e prestação determinado, o cliente recebe o valor do empréstimo da instituição financeira e as prestações são posteriormente descontadas de seu salário, benefício ou pensão”, explica. Mas, há também o cartão de crédito consignado, que, na prática, “funciona como um cartão de crédito comum”.
Em setembro deste ano, a modalidade registrou taxa de 18,5% ao ano, em média. O sétimo recuo em 2020.
Considerando essa taxa, uma dívida de R$ 1.000, adquirida agora, por exemplo, vai custar custará R$ 1.185 em um ano, caso as circunstâncias sejam as mesmas.
Produtos de crédito
Os dois produtos mais conhecidos pela população são o cheque especial e o cartão de crédito. No entanto, os dois são também os produtos com as maiores taxas anuais de juros, que podem fazer sua dívida dobrar e até quadriplicar em um ano.
Segundo dados divulgados pelo BC (Banco Central), a taxa de juros do cheque especial voltou a subir em setembro e foi a 114,2% ao ano.
No mesmo exemplo usado anteriormente, uma dívida de R$ 1.000, adquirida agora, por exemplo, vai custar R$ 2.142 daqui um ano, caso as condições permaneçam iguais. Ou seja, na prática, o valor dobra um ano depois.
No caso do cartão de crédito é ainda mais preocupante. A modalidade cobra os juros mais altos do país e em setembro não foi diferente, apesar de uma leve queda ter sido registrada. A taxa de juros do cartão está em 309,9% ao ano, na média praticada pelos bancos brasileiros.
Usando do mesmo exemplo usado acima, a dívida de R$ 1.000, contraída em setembro de 2020, ficará quatro vezes mais cara em setembro do ano que vem, caso as condições se mantenham a mesmas. Na prática, o valor devido salta para R$ 4.099.
Apesar da possibilidade de ver a dívida ficar até quatro vezes maior, Arthur Igreja lista dois motivos centrais do porque o brasileiro continua comprando produtos de crédito como o cartão e o cheque especial.
"Essa preferência tem duas explicações. A primeira é o baixíssimo nível de educação financeira e total desconhecimento do assunto. E a segunda é que muitas vezes não é preferência, mas, sim, desespero. A pessoa já está pendurada em uma linha de crédito, vai atrás de outra para arrolar dívida e assim sucessivamente", explica o especialista.